Posicionamento político: tá mais fácil fazer as poses do kama sutra

uma conversa para quem tem medo do cenário político brasileiro e mundial

Melissa Setubal
oqueaprendihoje
6 min readAug 17, 2018

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Pode me chamar de isentona, de em cima do muro, ou de qualquer estereótipo relativo a um lanchinho na padoca da esquina. Não me importa em como as pessoas me classificam. Talvez até ajude, se for o caso, porque eu sinceramente não to sabendo me posicionar politicamente.

Isso me incomoda demais, devo confessar. Eu vejo as pessoas defendendo seus direitos e privilégios, reclamando de problemas e de pessoas, expressando opiniões das mais tímidas às mais passionais ou extremistas, e fico pensando que, talvez, eu devesse ser uma delas.

Mas não, eu sou mais uma da galera que fica à margem, muitas vezes silenciosa, amedrontada, paralisada. E isso, bem como posturas intolerantes e posicionamentos sem nenhum ou com pouco embasamento nos fatos ou foco no bem de TODOS OS SERES, não está ajudando a humanidade a seguir em frente.

Meu posicionamento político muitas vezes é do "para o mundo, que eu quero descer", ou que ideia de jerico foi essa minha de decidir encarnar neste plano, porque se reencarnação existe e eu voltar pra cá de novo como ser humano, eu vou pedir demissão pra quem administra esse Universo. Eu me sinto um ET no meio dessa loucura toda. E conheço um monte de outros ETs por aí, vagando sem muito rumo político, achando que foram largados aqui pela nave-mãe, sem esperança de serem resgatados. ET, phone, home.

Mas, já que ainda não descobri de que planeta vim, para que eu possa elaborar meu plano de fuga, bora refletir sobre esse meu (praticamente inexistente) posicionamento político.

Comecei olhando para minhas posturas: silenciosa, amedrontada, paralisada.

Por que estou em silêncio? Talvez seja porque não sinta que minha voz importa, que minha fala faça alguma diferença? Ou porque para cada coisa que eu expressar virão um monte de ataques, e um monte de gente vai deixar de me seguir e de ser minha amiga? Ou porque não acho que tem gente que pensa de forma similar a minha ou com quem eu possa fazer uma calma troca de ideias? Ou até porque eu me julgo sobre as minhas próprias posturas? Ou porque não me sinta em integridade o suficiente para meu comportamento e minha fala sejam coerentes e alinhadas?

Daí começo a olhar para quem sim fala. Por que essa pessoa fala? Será que há razões totalmente distintas/contrárias? Ou há pontos similares? Será apenas uma questão de personalidade distinta (eu sou introvertida, e quem fala é extrovertida)? Ou será uma questão de essa pessoa se sentir mais no direito ou no privilégio de falar, ou seja, haverá menos consequências para ela ou ela se sente mais no poder (seja pessoal ou social)?

Por que estou amedrontada? Talvez seja porque medo é uma resposta natural a um ser humano que se sente ameaçado, de alguma forma? Será que tenho limitações pessoais em como minha mente opera? Será que essas limitações são também fruto de como fui ensinada desde criança a me posicionar (incluindo me eximir de me posicionar)? Quais são realmente os riscos sérios que corro ao me posicionar, que vão além das minhas limitações mentais?

Daí olho pra quem sim fala e faz. Será que ela não sente medo? Ou não precisa sentir medo? Ou fala/faz com medo mesmo? Que consequências essas pessoas sofrem? Ou que estão dispostas a arcar? Quem não tem medo de falar/fazer deveria ter um pouco mais de instinto de autopreservação? Ou ainda reavaliar a forma de expressar suas opiniões/ideias/ideais para não correr tantos riscos/ou gerar consequências impactantes?

Por que estou paralisada? Talvez seja porque eu não sinta que tenho algo com que contribuir? Ou porque o que sim tenho a contribuir não vai resolver o problema ou sequer fazer cosquinha nele? Ou ainda porque estou numa situação de alguma forma confortável/assoberbante/neutra que não encontro motivo para me posicionar politicamente e agir? Será que estou em algum looping de autocentramento?

Daí olho para quem sim se posiciona, fala e age. Será que essa pessoa não está comprometendo sua segurança, outras áreas da sua vida (como família, finanças, saúde…), ou até mesmo a existência de outros seres humanos (ou não)? Será que os seres que são impactados por suas falas e ações estão genuinamente sendo beneficiados? Será que há alguma reflexão no seu fazer sobre o verdadeiro impacto de suas ações?

Eu sei, cada pessoa tem sua forma de contribuir, e tem seu tipo de impacto.

Tem gente que é de ação e de linha de frente, como várias amigas e amigos meus. Tem gente como eu, mais quietinha, que é mais do um a um, e de ajudar as pessoas a questionarem verdades que pareciam absolutas e rever seus conceitos, o que no final das contas impacta nos seus comportamentos e ações no mundo. Tem gente, como uma querida amiga, que vive em grande privilégio e faz muito pelos outros com seus recursos financeiros.

Mas eu também fico olhando muito que meu autocentramento é um impedimento pra falar e fazer mais. Falo e faço bem menos do que poderia. Eu me escondo bastante atrás do meu privilégio. Principalmente ficando mais calada, em momentos que eu poderia sim falar algo. Ou ajudando mais quem vem até mim, ao invés de ir também até quem precisa e por limitações não consegue nem saber que eu existo e tenho algo pra ajudá-las.

Eu me escondo nos meus problemas de uma forma que parece que tenho quase nada pra oferecer, quando a verdade é que tenho bastante. E é um privilégio não precisar/querer me posicionar claramente.

Pensando bem, talvez quem está se posicionando e fazendo também esteja agindo a partir de um excesso de autocentramento…

Entenda: não to falando isso como uma autocobrança ou um julgamento do valor do seu posicionamento. E sim como um convite a uma autoavaliação, com o intuito de rever algo que claramente não está funcionando, que me sinto presa numa programação mental-social, ou seja, em medos, muitos medos.

Portanto se eu, que estudo e pesquiso, que reflito e medito, que faço mil terapias, que me importo, estou atrapalhada com meus medos, e me super utilizando do meu privilégio pra não me posicionar e agir, imagina quem nem está buscando ou não tem condições de ampliar um tiquinho no seu autoconhecimento e/ou na sua visão de mundo? Está, possivelmente se cagando de medo de perder o que lhe sustenta como ser humano que é a ilusão de superioridade/poder/status, ou no outro extremo, se cagando de medo de perder o pouco que o faz sobreviver/ter o mínimo de dignidade.

Somos todos seres agindo pelo medo. Acho que esse, no final das contas, é meu posicionamento político: MEDO.

Mas, e se ao invés de simplesmente deixar o medo ditar minha expressão e meu comportamento (e ao invés de continuar achando que é mais fácil virar um pretzel para ter um orgasmo do que me posicionar politicamente), eu assumir:

cada pessoa já contribui pro mundo da forma que sabe. E isso, no finalmente das contas conta como posicionamento político, talvez mais até do que expressando opiniões encapsuladas em redes sociais, por exemplo.

E que talvez cobrando e apontando dedos pra si e pros outros intimidamos ou provocamos (re)ações extremadas, e acabamos por contribuir para perpetuar e aumentar ainda mais a confa e polarização que já estamos, seja pela ação intransigente ou a não-ação amedrontada.

Mas talvez, seja possível inspirar alguma tensão, ou seja, algum desconforto na medida de fazer alguém refletir/expressar/agir na direção de, não apenas, se posicionar politicamente, como além, se posicionar humanamente.

Esse texto, por exemplo, eu não consegui não escrever, porque tenho uma amiga que ousou se expressar, usando de todos os seus recursos e amor no coração, tanto frente a pessoas intolerantes, quanto frente a suas pessoas de confiança. Numa conversa de mensagem de texto em grupo, ela me colocou numa posição desconfortável o suficiente para não me sentir julgada, e o suficiente para eu fazer alguma coisa a respeito.

E porque eu sei que tem um monte de gente aí se questionando e tentando fazer alguma coisa a respeito, da forma mais amorosa e cuidadosa possível, vim aqui propor essa conversa, sem posicionamento de partidos políticos ou de direita-esquerda-centro-êêê macarena (que é algo que definitivamente as pessoas podem fazer, por direito, com respeito, em outras instâncias), mas cheia de vontade de me posicionar politicamente de forma clara, não guiada mais pelo medo, e sim porque somos seres natural(cultural)mente sociopolíticos.

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