Decolonialidade no Design Brasileiro

Israel Fellipe
Oré!
Published in
6 min readAug 31, 2021

Um ensaio por Georgia Sanderson Mauricio e Israel Fellipe de Rezende Souza

UTFPR

Curitiba, 2021

When talking about decoloniality, it’s essential, before anything else, to comprehend what is the colonized thought that runs throughout all its aspects, those being the practice of design, design teaching and design thinking. What is, in fact, the main subject of this area that’s so full of foreignisms?

Those which present themselves as much in explicit ways (openly using ideas that may work somewhere beyond seas but are far from innapropriate in brazilian context) as they do in hidden ways, seldom trying to translate some terms to portuguese and even quoting brazilian authors on papers that are realy about something that’s “new” here but have been done in europe for forever.

Para compreender a fundo é necessário afastar-se do cenário atual para uma contemplação do todo, retornar às roots do que seria considerado um dia o flashpoint para o que chamamos hoje de design nacional.

Antes de dar sequência, no entanto, é interessante definir o que é tratado por decolonialidade neste paper. Decolonialidade: processo de emancipação cultural e epistêmica de determinado grupo que passou por emancipação política e se vê esvaziado do senso de pátria, ou ao menos de um senso de pátria próprio e independente do antigo grupo colonizador. É uma busca por reatribuição de sentido que passa por caminhos do resgate de elementos pré-colônia mas também busca extrair do estágio em que se encontra maneiras de agregar os elementos (culturais, ferramentais, artísticos, linguísticos, etc) adquiridos do colonizador aos seus próprios meios, imprimindo sua identidade nestes não apenas em um nível estilístico mas sim em profundidade, ressignificando talvez até a “alma” [definição de alma de John Locke] de tais elementos.

É neste momento que podemos trazer a prática do design à mesa. Design. Apesar da origem latina do termo, foi adotada pela Língua Portuguesa não do próprio latim, como BAETA NEVES inicia sua tese dizendo “O termo ‘design’ no Brasil foi diretamente apropriado da língua inglesa”. Como então apropriar-se de algo tão intrinsecamente estrangeiro? Existem boatos de que tenha havido uma tentativa durante o período em que o Brasil esteve sob o regime de uma ditadura militar. Diz-se que os objetivos ufanistas que visavam a propaganda apoteótica da república iniciaram um processo de mass-translation de termos estrangeiros, daí a origem do nome “Desenho Industrial” porém, como podemos observar décadas após, o termo não vingou. Muito pelo contrário, tornou mais complexa a compreensão do que é de fato tratado na área. “Desenho Industrial” por mais auto-explicativo que possa soar, não contempla todas as frentes de atuação do Design.

Mas não somente em seu nome o Design carrega marcas de submissão cultural. Afinal, isto talvez significasse apenas que o Brasil se curvou ao imperialismo estadunidense, termos em inglês isolados na Língua Portuguesa reflexos do globalismo, do mundo diminuindo e se tornando um só, que mal pode haver em um par de jeans ou um copo de milkshake? Mesmo não sendo desejável, talvez seja compreensível. Infelizmente para a luta emancipatória do Design brasileiro as questões se aprofundam beyond that.

Voltando nossa atenção à prática do Design, de qualquer forma que ela se apresente, desde a produção acadêmica premiada de produtos inovadores carregados de sofisticação ergonômica até os comumente condenados “sobrinhos” com seus softwares baixados de forma ilegal produzindo flyers. Todos se baseiam em algum tipo de metodologia, e pela proporção em que estas se apresentam aos designers, a probabilidade é grande de que se trate de algo parcial ou completamente importado. Aos acadêmicos, noções avançadas de harmonia visual providenciadas pela Gestalt, o famoso princípio de “forma e função”, User Experience, User Centered Design, Design Thinking, Minimalism… E aos sobrinhos tutoriais da internet que sintetizam os anteriores “ao fazer um logo, mantenha linhas simples, use apenas uma tipografia, não combine vermelho e azul-celeste porque a cor vai gritar com seus olhos”.

O ensino do design sempre foi, em sua maioria, baseado em conceitos que são diretamente ligados à língua inglesa. Desde o nome dos cursos relacionados a área, até os métodos de projeto, muito do que existe tem algum estrangeirismo incluído no nome. A forma como são chamados os jobs, com briefings, os mockups, o grid, e uma infinidade de outros termos, mostram a grande influência do exterior em nosso design.

O “pensar” design é um tópico que pode ser visto como controverso, isto pois possui extremos bem definidos. O ramo voltado à exploração do ferramental disponível que, por vezes busca o desenvolvimento metodológico e tecnológico com fins em si mesmos mas também o ramo que se mantém local, que possui como missão o desenvolvimento local, buscando devolver à comunidade de maneira mais focada em um reduto do que é visto como geral ou sistêmico. Este é, discutivelmente, o âmbito que mais possui espaço para uma cisão com os paradigmas contemporâneos do que é design e, sobretudo, do que é o bom design. O que foi considerado por “pensar” design para este ensaio foi justamente a produção acadêmica nacional dando ênfase ao que é voltado para o desenvolvimento de metodologias nacionais, o design como ferramenta de transformação social, valorização de técnicas de manufatura ancestrais, ademais.

A partir do brevemente exposto, é possível imprimir uma identidade verdadeiramente nacional sobre algo que incorre infalivelmente de estrangeirismos em seus aspectos tão básicos? É possível criar algo novo a partir de moldes antigos?

Sim. a partir da pesquisa bibliográfica que embasa este ensaio, a universidade pública tem um papel fundamental nesta busca por emancipação cultural. O ‘pensar“ design carrega em si a responsabilidade de busca pelo novo mas anteriormente a isto a responsabilidade com a comunidade. Um Design que serve verdadeiramente à comunidade, que busca o desenvolvimento autônomo do grupo que o suporta, que não se ancora nem depende exclusivamente de recursos (financeiros, intelectuais, ferramentais, etc.) de outrem é um Design que pode ser capaz de emancipar.

O exercício de tentar fazer um design nacional utilizando somente de aspectos considerados brasileiros originais é algo que se desenrola em outras questões: o que, em nossa cultura, é 100% brasileiro? Seriam as criações que ocorreram antes de 1500, quando os portugueses ainda não haviam chegado e explorado nossas terras? E se sim, como resgatá-las? Seria o trabalho feito com a absorção das novas culturas que chegaram aqui, depois que nos estabelecemos como nação “independente”? A brasilidade é definida de várias formas por pessoas diferentes, então, buscar um design nacional é algo que difere na concepção do que consideramos ser nacional.

Na realização desse texto foram colocados em reflexão vários conceitos já estabelecidos e por muitos não questionados há tempos. A função do ambiente acadêmico é a de sempre estar revendo padrões, mostrando à comunidade como o dia a dia é influenciado por estigmas onipresentes na sociedade. O estudo do design está em eterno desenvolvimento no Brasil e se for dada mais atenção às raízes dos padrões considerados os melhores, vai se estar sempre mais próximo de um design mais brasileiro e com referências nacionais, e mais distantes do design universal enraizado mundialmente.

Bibliografia

MCD (Modernidade, Colonialidade e Decolonialidade) compostos por estudiosos como Aníbal Quijano (2005), Catherine Walsh, Edgard Lander (2005), Enrique Dussel (2000), Nelson Maldonado-Torres (2017) e Walter Mignolo

https://masp.org.br/uploads/temp/temp-QE1LhobgtE4MbKZhc8Jv.pdf

http://pdf.blucher.com.br.s3-sa-east-1.amazonaws.com/designproceedings/9cidi/6.0007.pdf?utm_medium=website&utm_source=archdaily.com.br

https://medium.com/@coletivodecolonial?p=570829a03e85

Referências

BAETA NEVES, Ana Claudia Rocha Quartin. Novos encantamentos: design de

hipermídia enquanto design de engajamento / Ana Claudia Rocha Quartin Baeta Neves ;orientador: Rejane Sptiz. — Rio de Janeiro : PUC,

Departamento de Artes e Design, 2006. Dissertação (mestrado) — Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Artes e Design.

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