Imagem: tumblr

Marcinho

Leandro Godinho
outras cousas
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8 min readJul 5, 2016

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(Desaforos)

Por aqueles dias, você não estava falando comigo. Muda e chateada. Havia porém, exceções, quando, sem aviso, você dizia em tom de voz alto o bastante para que eu percebesse memórias da sua vida sexual pregressa, sempre nomeando o homem da situação, homem que nunca era eu. Teve o Rodrigo que fez você gozar por sete vezes na mesma tarde. O Alberto você chupava com gosto de tão bonito que era o pau duro dele. O outro Rodrigo te fodia tão bem que você deixava ele te bater na cara e te esporrar as costas. Eu ouvia aqueles repentes e apenas calava, sabendo que a razão era sua e que a penitência era justa.

Foi quando apareceu o Marcinho. O Marcinho havia sido seu noivo dois anos antes de mim e vocês terminaram porque ele era um filho da puta. O Marcinho que havia passado doenças pra você. O Marcinho que obrigou você a dizer isso pra ele, que ele havia transmitido clamídia pra você porque ele quis te comer sem usar camisinha depois disso e ficou indignado quando você não deixou. Esse Marcinho, você disse uma vez, pra ele você tinha dado até o cu e gozado, e outra, que quando resolveu dar a bunda pra ele, pediu pra ele meter a seco de tão gostoso era Marcinho dentro de você, e ainda, que mesmo depois de descobrir que Marcinho era um filho da puta, acordava de madrugada com vontade de chupar o pau dele e às vezes chupava mesmo, o pau mole endurecia e Marcinho acordava. Mas eu sabia que você estava com raiva, não a raiva de jogar as coisas e ir embora, a raiva de quem ainda gosta.

No meio dessa raiva você apareceu diante de mim, que assistia um treino de fórmula um na tevê mas nem assistia direito, eu apenas estava ali com o aparelho ligado na minha frente e sentado no sofá da sala. Você estava nua e de havaianas, cabelos presos num coque e usando uma calcinha cinza, meio velha, mas que eu gostava. Após tirar a calcinha, postou-se ereta novamente com a sua buceta perto o bastante para eu respirar o perfume dela e não ter mais nada ao alcance da vista. Antes que eu reagisse a você, à sua nudez, a seu cheiro bom, você se pôs de joelhos e suas mãos me desvestiram o moleton e sua língua lambeu as minhas bolas e seus lábios succionaram as minhas bolas e com método e conhecimento, mas sobretudo com gosto, você me chupou ali durante os seguintes sete minutos que para mim pareceram dias memoráveis onde o tempo havia cessado de ter mesura. Eu abria os olhos e via seus lábios se demorando na glande, como se fosse uma flor delicada, para em seguida descerem caralho abaixo que desaparecia na sua boca e você acariciava as bolas, apertava o falo. Você não sorria, mas fixava os olhos em meu rosto quando abertos. Deixou eu gozar na sua boca e engoliu, chegou a lamber um resto que havia sobrado na ponta.

De joelhos, tornou a olhar para mim e então declarou que a porra do Marcinho era diferente, vinha mais porra no gozo dele e era mais grossa e mais docinha.

Aí se levantou e saiu da sala. Deixou a calcinha no chão.

Imagem: Maggie Gyllenhaal em ‘Secretária’

(Gênese)

Na gênese daquilo tudo havia uma gracinha que eu tinha feito sem pensar muito como fazemos na maioria das vezes que providenciamos esse tipo de piada cretina, sem avaliar o momento, o contexto, o outro. Você tinha flagrado um recado transante demais no meu celular por acaso e emendei uma gracinha envolvendo a nova tecnologia que surgiu para separar casais. Claro que você não gostou e aí veio o silêncio, logo a seguir me embananei para dizer que era só uma mensagem e que não havia nada além de uma mulher com pouca noção me mandando mensagem. Eu consegui desacreditar a minha própria verdade dos fatos.

Eu havia partido o seu coração de novo. Eu já tinha esquecido aniversários, havia ignorado ocasiões para jogar bola, teve inclusive um mês inteiro — trinta e um dias e noites — onde não houve sexo porque eu nunca estava disposto ou presente, não obstante você me procurar o colo, me sarrar de noite na cama e por fim de dia, em qualquer oportunidade, e aí me perguntar se havia um problema. Havia um problema, eu, mas os problemas eram problemas demais e menti, você aceitou, jogo jogado. Viver a dois, a rigor, tem esse detalhe de ser má ideia.

Pude perceber nas entrelinhas daquele instalado silêncio que você julgava ser um fato consumado que eu e a estagiária do meu escritório flertávamos abertamente longe de seus olhos até então. Ela que havia enviado aquela mensagem para o meu celular num domingo de noite e era dezesseis anos mais jovem que nós. Você enxergava o descaro dela me comendo com os olhos ao me perguntar sobre a agenda da semana, registrando selfies de suas intimidades na madrugada e as salvando em recantos da internet onde somente eu teria a senha. Adiantaria explicar que a menina não tinha essa culpa e muito menos essa tara toda por mim? A verdade já havia sido expulsa daquele contexto.

Admito que por algumas vezes o perfume dela, ou o jeito como alguns fios do cabelo dela escapavam do coque improvisado no escritório, ou ainda a presença não declarada dos seios desenhados sob o sutiã em algumas blusas me levavam a sair dos cálculos tributários para cenários onde ela abaixava as calças ou levantava a saia ao invés de seguir andando até uma das janelas onde iria fechar um pouco as persianas. Podia acontecer também de sua imagem sonhada se mesclar a namoradas da juventude e as suas carnes dos dezenove, vinte, vinte e um anos, os primeiros corpos femininos que me foram permitidos e que me ensinaram que o gosto de uma mulher nua de verdade nem se comparava àquelas mostras que eu consumia em fitas de vídeo e papel de revista. Não raro, as fantasias se desligavam do escritório e de mim e passeavam pela alcova da moça, que sorria de modos que eu nem imaginava como imaginar nua e de joelhos segurando firme uma piroca anônima. Ela gozava aos palavrões nessa imaginação nutrida pela programação da madrugada dos canais por assinatura e chegava a pedir para que o vulto bem-dotado comesse seu cu, ela repetia isso, come o meu cu, porra, ela repetia, sabe. E aí claro que toquei punhetas dentro dessa onda, mas, francamente, nós homens tocamos punheta para qualquer mulher que passe diante da gente, basta que haja pau duro e oportunidade.

(Você me censurando em silêncio pela punheta dentro de uma casa em que eu dividia com uma mulher muito disposta a dar pra mim de verdade, e vestir as fantasias que eu pedisse, mas eu gastava a minha porra com aquela menina durante o banho ou então de madrugada, durante seu sono mais profundo, com a aflição dos usuários de crack e o caráter derrotado dia após dia pelo desejo.)

Você devia ter vergonha, vaticinou para mim antes de mergulhar naquele silêncio que serviu para você repisar o amargo de nós. Após dois dias de silêncio, as suas lembranças deram as caras através da sua voz. O pau do Osvaldo era tamanho que você precisou ficar em casa de atestado por dois dias numa vez que deu pra ele sem KY.

Imagem: Google

(Vingança)

Eu precisei ter essa conversa com a estagiária diante do que estava acontecendo entre nós dois desde o envio daquela mensagem. Disse a ela que você havia interpretado a meu desfavor o que eu sabia não ter passado duma molecagem entre duas pessoas se permitiam, que você tinha ciúmes e que por conta da situação toda, o silêncio, os desaforos, pedi que ela não me enviasse mais piadinhas e quetais pelo celular. Ela corou. Pediu desculpas. Expliquei que não era pra tanto porque entre eu e você nunca tinha sido fácil e que antes da mensagem já havia algo nublado conosco, uma mala onda, mas que era algo que acontecia com todo casal que vive junto, tempo e erosão. Não entrei em detalhes e essa conversa, se tanto, durou três minutos.

Ela nesse dia estava com o cabelo preso de maneira que não fazia no cotidiano, o rabo de cavalo bem justo, quase sem fios soltos na parte da frente, a boca sem batom e um vestido amarelo. Nesse dia quase não nos falamos a não ser quando a rotina pedia. Foi no caminho de casa, dentro do ônibus, que tive uma ereção ao imaginá-la nua, a bunda empinada diante da minha pélvis e aquela mão que não era a minha puxando os seus cabelos arrumados naquele rabo de cavalo. Desandei a suar pelas axilas em volume bem mais acentuado ao passo em que procurava com o olhar pelas pessoas me censurando no coletivo mas a estagiária me pedia tapas na bunda.

Eu entrei em casa e te procurei com esse animal desperto dentro da caixa torácica. O odor da estagiária sonhada invadiu a realidade e me trouxe o desejo de ter você inteira como se eu pudesse arrancar a beijos o rancor e transmutá-lo todo em tesão. O animal não resistiria ao perfume que em você não havia. Vasculhei os cômodos à sua procura olhando as frestas para encontrar suas pegadas, suas digitais. A manta do sofá da sala repuxada pela sua ausência apesar da tv ligada. O teu celular vibrando órfão em cima da cama arrumada.

Avancei na direção da cozinha e atravessei o ar morno de sua passagem, a cada passo eu retirava de seu corpo uma peça de roupa e a cada peça de roupa eu beijava a sua pele e então a blusa voou porta afora, a fivela do sutiã mal ofereceu resistência e os botões da calça só faltaram sorrir quando soltos. Antes de tirar você de dentro daquela calcinha que mal lembro a cor enfiei a minha mão direita dentro dela e toquei sua carne, e naquele contato antevi na saliva o gosto quente do sexo onde havia mel, havia cachaça, havia suor, havia mijo, havia dor e havia luz. Eu quis te puxar pelos cabelos e olhar as suas costas despidas e reparar as marcas do sutiã na sua omoplata e dali ouvir sua voz quando eu adentrasse rijo o rabo para mim empinado. Eu quis fazer no seu corpo um filme pornô ruim do qual a gente gostasse.

E aí, quando eu gozasse, amor, a lembrança de ter terminado com o Marcinho depois que ele te passou clamídia não seria a única que restaria de vocês dois, porque você ia lembrar que o filho da puta também passou a doença pra sua prima mais nova ao mesmo tempo.

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