Veranico

Leandro Godinho
outras cousas
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4 min readMay 17, 2020

Por quanto tempo eu estava ali de joelhos no chão do banheiro feminino, o nariz respirando o cu de Taís enquanto a língua explorava a mucosa de seu sexo em meio aos pentelhos que se encharcavam da minha saliva e do tesão dela própria? O tempo de dizer aos amigos que íamos ali na rua fumar um cigarro? O bastante para a fila do banheiro se incomodar e começar a bater à porta? O tempo necessário para eu querer foder Taís todas as noites dali em diante?

Ela abriu as ancas com as mãos para eu lhe chupar mais fundo e o mormaço lhe subiu do ventre onde o sexo escorria para a minha goela indo contaminar seus batimentos cardíacos e logo dilatar seus mamilos. Aquela brisa começou a ser expelida de seus pulmões e ao passar pela laringe ainda tomou à força a língua e seus lábios que deixaram o mormaço escapar para a atmosfera sob a forma de um gemido longo e fundo que afinal se articulou num palavrão. Caralho, ela dizia, caralho, ela repetiu com a cabeça grudada no azulejo da parede enquanto eu reparava que a musculatura das suas panturrilhas tremia.

Fazia um calor de quase trinta graus nas ruas do Bonfim naquela noite a despeito de um mês de julho que batia recordes de atendimentos a problemas respiratórios nas emergências hospitalares da capital em razão das baixas temperaturas. André e Eduardo resolveram aproveitar o veranico para restaurar uma juventude que eu havia perdido desde que Jéssica saiu de casa durante uma madrugada chuvosa do último maio para nunca mais voltar.

Os dois apareceram na minha porta no começo da noite com a alegação de que haviam subornado a portaria do condomínio mediante três long necks. Abre logo, meu, ordenou o Eduardo, preciso dar uma mijada, abre aí. Deixei que entrassem porque já começavam a fazer barulho pelo corredor do andar e André começou a me falar dessa festa, que ia estar cheia de mina, e que estava calor e as minas iam estar todas salientes, e que eu ia entrar no banho assim que o Eduardo saísse do banheiro, eu ia colocar uma roupa, a gente ia dar um teco, depois ia dar um doiszinho pra rebater, e nós três, já no balanço, íamos pegar mais uma heineken cada um no posto de gasolina ali da esquina de casa e ele mesmo chamava um motorista pelo aplicativo. Eu já estava com uma long neck aberta em mãos antes dele terminar esse monólogo.

As paredes do lugar tinham aspecto de mofo, mas as pessoas não. As pessoas dançavam, mesmo vestindo calças que lhes apertavam as canelas. Eu observava os meus amigos contarem vantagens e se aproximarem de meninas que fingiam sorrir para que eles continuassem lhes pagando cervejas. Eu me resignava a beber, sem prestar atenção ao que se passava entre eles porque Taís estava de frente para mim alguns metros adiante.

Taís não foi um jato de luz em meio a toda aquela gente que fumava e bebia e falava alto, ela apareceu como um Sonrisal de manhã após uma noite com os Rolling Stones. I was blind; now I can see. Ela usava brincos enormes, como se fosse um travesti, e um de seus amigos mexia num deles quando me flagrou entorpecido dela, o copo em mãos no meio do caminho e a boca aberta. Ele riu, ela riu.

Me afastei do meu grupo e caminhei os dez ou doze passos que nos separavam amaldiçoando todos aqueles links com pornografia que preencheram a ausência de Jéssica e me entupiram a mente de boquetes e esporradas e peitos balançando que não me ajudariam a não ser um completo idiota ao final da travessia. Ela me esperou junto a seus amigos com um enigma no rosto em forma de sorriso e um cigarro numa das mãos.

Vinha dela um perfume doce, mas que não enjoava, misturado à fumaça, a notas de amônia, à barulheira, aos casais que se atarracavam em desespero juvenil, à cerveja morna e ao meu pavor de pôr tudo a perder quando me aproximei dela e pedi um cigarro. Ela disse que nós dois poderíamos dividir o cigarro dela e a minha cerveja. Eu perguntei qual era seu nome mas ela apenas me passou o cigarro enquanto tomava a garrafa de mim para emborcar um gole e então me responder com outra pergunta: tu vai me beijar ou não?

Ela deu um passo para o lado e então se sentou na privada com as pernas abertas e imediatamente deu uma longa mijada, enquanto eu me sentei no chão a seus pés, recostado à parede. Fechei os olhos por um instante e me concentrei no suco que fermentava nas minhas gengivas. Ela tinha terminado o xixi e já começava a se arrumar para sair de dentro daquela cabine quando me olhou e disse, me chamo Taís.

Ela deixou o banheiro antes de mim, se juntando a seus amigos na pista. Caminhei do banheiro até o bar onde comprei outra cerveja e dali segui por entre aquela molecada com meu passo trôpego, porém resoluto. Avistei um pedaço de parede ideal para me recostar e me isolar no meio da turba, os olhos perdidos e frouxos dentro de mim. Taís ressurgiu na pista de dança e me deixei flutuar em direção a seus cabelos escuros e cheios de caracóis, a cerveja descendo com o gosto dela junto do torpor etílico e o corpo que acompanhava a música na pista dançando também dentro da minha imaginação mas não naquela boate que cheirava a mijo e nem nos azulejos que nos testemunharam mais cedo, dançava sobre mim, se oferecia inteira e noturna, sorria para me beijar e dizia dentro dos meus ouvidos caralho, repetindo como se ainda não fosse crível, caralho.

Quando a cerveja terminou eu caminhei direto para a pista e de volta para Taís. Fazia tanto tempo que eu não dançava.

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