O que Fica, O que Sobra.

Samille Sousa
Outras Janelas
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3 min readFeb 17, 2019
Foto: Célio Maciel

Estava bobeando no Instagram e encontro uma postagem da minha querida amiga Deva Komala [ex-vizinha de Piracanga, mora em Brasília, leitora de aura e terapeuta maravilhosa]. Ela falava do projeto fotográfico O que Fica, O que Sobra e que teria uma edição em Salvador.

A minha primeira reação foi pensar: - Nossa, eu estou aqui em Salvador e seria muito interessante participar disso. Visto que eu tenho um trabalho intenso e constante de aceitações x julgamentos do meu corpo físico.

Decidi participar.

Foto: Célio Maciel

Um dia antes, me senti um pouco ansiosa e ao mesmo tempo muito entusiasmada pelo desafio de poder olhar para o meu corpo através do olhar do outro. No dia, acordei cedo e fui para local de encontro para fazer o ensaio. Fui recebida pelo Célio que é um cara super calmo, tranquilo e atencioso. Célio consegue facilitar algo tão profundo com bastante leveza e acolhimento, além de tudo o trabalho ser conduzido com um respeito quase que sutil no conflito que é gerado entre o tempo externo (prazo do ensaio) e o tempo interno (as dúvidas, a insegurança, entre outras coisas).

Célio me contou como surgiu o projeto, contou um pouco da sua trajetória, conversamos sobre o que era luz e sombra, entre outras coisas que permearam aquele primeiro diálogo. Logo depois, eu fiquei um tempo sozinha atrás de uma cortina e me perguntei: — Qual é a mulher que vai sair de dentro de mim para tirar essas fotos?

Eu comecei a rir, não sabia a razão pela qual aquilo estava acontecendo e decidi que a Samille que gosta de dar risada faria aquelas fotos. Em toda a experiência, eu senti leveza, o que é totalmente ao contrário do desconforto do imaginário criado muita vezes pela nudez. As duas horas passaram rapidamente, entre movimentos, percepções, risadas e o tempo para olhar como estavam saindo as fotos. O tempo aqui é importante. Eu evitava olhar muito para os resultados para não deixar que minha mente me dominasse, eu só queria estar ali presente.

A cada foto eu percebia meu corpo de um jeito diferente, a cor da pele, as cicatrizes, as estrias, as manchas, as curvas, as tatuagens, o cabelo e o formato dele. Entre essas observações, foi claro o quanto me sinto mais livre pelada do que vestida. Vestida, eu entro na prisão mental da expectativa que o outro pode ter. Isso dói as vezes. O mais importante ali era olhar para o que era real e verdadeiro. Não tinham brincos, nem roupas. Eu estava nua.

Algo mudou dentro de mim no dia do ensaio, foi uma mudança de olhar, uma semente plantada para lembrar todos os dias, ainda que o entorno diga ao contrário, esse é o meu corpo. Com tudo o que fica e o que sobra dele.

Foto: Célio Maciel

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Samille Sousa
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Brazilian I Researcher I Traveller I Facilitator I Storyteller I Founder @outrasjanelas