Entre o alagamento e a pandemia
Em Surubim, bairros mais atingidos pela forte chuva estão entre os que aparecem com maior número de casos da doença
Maria Souza
Com os holofotes voltados sobre as duas crises que o Brasil enfrenta, a política e a sanitária, há um acontecimento que, mesmo não reverberando no âmbito nacional, vem causando preocupação em diversas cidades nordestinas: a temporada de chuva. Desde antes da pandemia chegar ao Brasil, uma série de municípios no interior de Pernambuco sofreu com alagamentos e diversos desalojamentos de famílias. Em fevereiro, Dormentes, Floresta e Ouricuri, no Sertão, viram-se sob a água. No período junino, em pleno crescimento da Covid-19 no interior do Estado, foi a vez de Surubim sofrer com inundações e problemas de infra-estrutura. Com recorde histórico, a cidade registrou (dias 19 e 20 de junho) o maior acúmulo de chuvas dos últimos cinquenta e quatro anos, de acordo com o monitoramento pluviométrico da Agência Pernambucana de Águas e climas (APAC).
Bela Vista (Salgado), Lagoa da Vaca, Novo Centro, Alto São Sebastião e Vila Cecília de Nóbrega foram os bairros mais afetados. O primeiro bairro teve 22 casos de Covid-19: 16 casos leves, 1 caso grave e 5 recuperados. Já Lagoa da Vaca teve 9 casos leves, 2 casos graves e 6 recuperados. Em São Sebastião, foram 61 casos leves, 5 casos graves e 48 recuperados.
O auxiliar técnico de rede Caio Castro, 24 anos, morador do bairro do Salgado, conta que, no momento da chuva forte, estava em casa com sua esposa Wislane Gomes, 20, e Heitor, seu filho de 2 anos e nove meses. Sua casa sempre sofre o efeito da chuva e rapidamente estava alagada. Obrigado pelas circunstâncias, Caio relata que precisou “quebrar” a quarentena e colocar uma série de pessoas em risco. “No dia da chuva, tive que ir dormir na casa dos meus pais, não havia outro jeito”. Alguns moradores relataram que, devido à deficiência das galerias pluviais em algumas ruas do bairro Bela Vista, popularmente conhecido como Salgado, e a falta de manutenção no sistema de água e esgoto, as obras de saneamento inacabadas causam grandes transtornos à população em épocas de chuvas.
Móveis estragados pela água, moradores ilhados em suas casas, instalações comprometidas: a chuva causou prejuízos — felizmente apenas materiais — que ainda estão sendo contabilizados pelos moradores dos bairros mais afetados pela chuva em Surubim. “Perdi mesa, guarda-roupa. Pegaram muita água, estão danificados. Só não perdi mais porque coloquei meus móveis em cima de tijolos”, disse. A vendedora Adriana Karla, 44, moradora do Bairro Novo Centro, relata que, no dia da chuva, precisou voltar mais cedo para casa e se deparou com a residência inundada. “A chuva danificou alguns móveis. Não consegui voltar para o trabalho depois, pois a rua estava completamente alagada.”
As chuvas trouxeram um novo dilema para as famílias locais: ficar em casa, seguindo as recomendações dos órgãos de saúde para permanecer em quarentena, ou sair de casa, sob o iminente risco de inundações e deslizamentos? A última opção foi a que prevaleceu. “Esta chuva acabou a quarentena”, afirma o auxiliar técnico Caio Castro.
A reportagem do Observatório da Vida Agreste (laboratório do curso de Comunicação Social da UFPE) procurou a Compesa para falar sobre a obra mencionada pelo técnico no bairro do Salgado. De acordo com a empresa, trata-se de uma rede de esgoto potencial (domicílios que não apresentam rede de esgoto disponível para ligação) cuja manutenção é competência da prefeitura da cidade. A última foi contactada e informou que já está monitorando a situação e prestando auxílio aos moradores atingidos na área.
De acordo com a secretária de Assistência Social e Direitos Humanos, Penélope Regina, as famílias desalojadas foram acolhidas em abrigos provisórios cedidos pela prefeitura. Durante dois dias, a prefeitura distribuiu refeições no locais atingidos e instalou pontos de apoio nas escolas Lourenço Ramos (Bela Vista) e Silvino José de Oliveira (Lagoa da Vaca) com objetivo de acolher as demandas dessas comunidades. “O acompanhamento técnico das famílias atingidas está em curso por parte das equipes dos CRAS, e tem se efetivado por meio de orientações e concessão de benefícios eventuais, além de auxílio aluguel para as famílias que precisaram deixar as casas nas zona de risco identificadas pela Defesa Civil.”