Entre o alagamento e a pandemia

Reportagens Especiais
OVA UFPE
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4 min readJul 3, 2020

Em Surubim, bairros mais atingidos pela forte chuva estão entre os que aparecem com maior número de casos da doença

Bairro da Bela Vista: 16 casos leves, 1 grave e 5 recuperados (fotos: Luiz Carlos Mota/Divulgação)
Cidade registrou maior índice pluviométrico das últimas cinco décadas: agora, havia uma pandemia no meio

Maria Souza

Com os holofotes voltados sobre as duas crises que o Brasil enfrenta, a política e a sanitária, há um acontecimento que, mesmo não reverberando no âmbito nacional, vem causando preocupação em diversas cidades nordestinas: a temporada de chuva. Desde antes da pandemia chegar ao Brasil, uma série de municípios no interior de Pernambuco sofreu com alagamentos e diversos desalojamentos de famílias. Em fevereiro, Dormentes, Floresta e Ouricuri, no Sertão, viram-se sob a água. No período junino, em pleno crescimento da Covid-19 no interior do Estado, foi a vez de Surubim sofrer com inundações e problemas de infra-estrutura. Com recorde histórico, a cidade registrou (dias 19 e 20 de junho) o maior acúmulo de chuvas dos últimos cinquenta e quatro anos, de acordo com o monitoramento pluviométrico da Agência Pernambucana de Águas e climas (APAC).

Bela Vista (Salgado), Lagoa da Vaca, Novo Centro, Alto São Sebastião e Vila Cecília de Nóbrega foram os bairros mais afetados. O primeiro bairro teve 22 casos de Covid-19: 16 casos leves, 1 caso grave e 5 recuperados. Já Lagoa da Vaca teve 9 casos leves, 2 casos graves e 6 recuperados. Em São Sebastião, foram 61 casos leves, 5 casos graves e 48 recuperados.

Acesso para as residências foi prejudicado e alagamentos fizeram com que muitos precisassem deixar as casas

O auxiliar técnico de rede Caio Castro, 24 anos, morador do bairro do Salgado, conta que, no momento da chuva forte, estava em casa com sua esposa Wislane Gomes, 20, e Heitor, seu filho de 2 anos e nove meses. Sua casa sempre sofre o efeito da chuva e rapidamente estava alagada. Obrigado pelas circunstâncias, Caio relata que precisou “quebrar” a quarentena e colocar uma série de pessoas em risco. “No dia da chuva, tive que ir dormir na casa dos meus pais, não havia outro jeito”. Alguns moradores relataram que, devido à deficiência das galerias pluviais em algumas ruas do bairro Bela Vista, popularmente conhecido como Salgado, e a falta de manutenção no sistema de água e esgoto, as obras de saneamento inacabadas causam grandes transtornos à população em épocas de chuvas.

Móveis estragados pela água, moradores ilhados em suas casas, instalações comprometidas: a chuva causou prejuízos — felizmente apenas materiais — que ainda estão sendo contabilizados pelos moradores dos bairros mais afetados pela chuva em Surubim. “Perdi mesa, guarda-roupa. Pegaram muita água, estão danificados. Só não perdi mais porque coloquei meus móveis em cima de tijolos”, disse. A vendedora Adriana Karla, 44, moradora do Bairro Novo Centro, relata que, no dia da chuva, precisou voltar mais cedo para casa e se deparou com a residência inundada. “A chuva danificou alguns móveis. Não consegui voltar para o trabalho depois, pois a rua estava completamente alagada.”

As chuvas trouxeram um novo dilema para as famílias locais: ficar em casa, seguindo as recomendações dos órgãos de saúde para permanecer em quarentena, ou sair de casa, sob o iminente risco de inundações e deslizamentos? A última opção foi a que prevaleceu. “Esta chuva acabou a quarentena”, afirma o auxiliar técnico Caio Castro.

Prefeitura afirma que famílias em zona de riscos foram removidas e recebem agora auxílio aluguel

A reportagem do Observatório da Vida Agreste (laboratório do curso de Comunicação Social da UFPE) procurou a Compesa para falar sobre a obra mencionada pelo técnico no bairro do Salgado. De acordo com a empresa, trata-se de uma rede de esgoto potencial (domicílios que não apresentam rede de esgoto disponível para ligação) cuja manutenção é competência da prefeitura da cidade. A última foi contactada e informou que já está monitorando a situação e prestando auxílio aos moradores atingidos na área.

De acordo com a secretária de Assistência Social e Direitos Humanos, Penélope Regina, as famílias desalojadas foram acolhidas em abrigos provisórios cedidos pela prefeitura. Durante dois dias, a prefeitura distribuiu refeições no locais atingidos e instalou pontos de apoio nas escolas Lourenço Ramos (Bela Vista) e Silvino José de Oliveira (Lagoa da Vaca) com objetivo de acolher as demandas dessas comunidades. “O acompanhamento técnico das famílias atingidas está em curso por parte das equipes dos CRAS, e tem se efetivado por meio de orientações e concessão de benefícios eventuais, além de auxílio aluguel para as famílias que precisaram deixar as casas nas zona de risco identificadas pela Defesa Civil.”

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projeto de extensão do Observatório da Vida Agreste (OVA), Curso de Comunicação Social da UFPE/Centro Acadêmico do Agreste (CAA)