O meu coração é igual

Memória afetiva e história no Carnaval de BH

Oliver Kornblihtt
4 min readMar 25, 2014

Me lembro de um tempo não tão distante quando minha mãe dizia pra ter cuidado ao sair caminhando pelas ruas de Belo Horizonte. “Está tão vazia que dá até pra andar pelado sem ser preso, é carnaval minha filha” clamava pela casa preocupada com a adolescente querendo beber uma coisa qualquer numa esquina com alguns poucos amigos enquanto outros estavam viajando, ainda de férias.

Passado mais um tempo por um acaso vi tambores gritarem um som desconhecido aos meus ouvidos, passei anos sonando junto a eles e viajava a Recife para sentir o mesmo som em grande escala. Um viva para o Maracatu e todos os outros tambores de Minas que me apresentaram zuadas em bloco durante anos e despertaram a minha vontade de tocar na rua, caminhando em grandes grupos, sentir o corpo e o espírito se transformando dia a dia, com um sol de rachar a moleira ou mesmo em tempestades torrenciais.

“Em 2009 algo mudou na cidade.”

A vontade de ocupação do espaço público se desdobrou em diversas ações divertidas de cunho altamente político, mudou a realidade e abriu os olhos e os ouvidos de uma boa parte da cidade que ainda não tinha conseguido me apresentar nada tão espontâneo e de horizonte tão belo em todos estes anos.

Nada mais justo que tudo isto se transformar em um bonito carnaval.

2014 , um bloco por quadra: Axé, Funk, marchinhas tradicionais, concurso de marchinhas locais, concurso de fantasias, Reggae, Ska, Samba, Afoxé, Krishna, Black Music, Pagode, no miolinho da Savassi, no centro da cidade, no alto da Serra ou mesmo na ocupação Rosa Leão, “O pó relou no pé e todos os pés da cidade relaram no pó”, ( se este pó é de quem você está pensando? “A é cim” ). Festas pra quem conseguiu varar a madrugada, rodas de samba em palcos tradicionais sem perder o espírito da mesa de buteco, bandas locais, nacionais e internacionais, turistas, opções antes durante e depois do carnaval que me davam a impressão de estar novamente em Recife.

Escrito num único sopro, foi assim aos meus olhos que Belo Horizonte escreveu mais um capítulo desta história e estabeleu a tradição e o calendário do carnaval de rua da cidade que na teoria dura quatro dias mas na prática de 2014 foram quase três meses e ainda não acabou.

O carnaval mora dentro da alma de cada um que vive o espaço público da cidade, é de rua e é de luta, é de todo mundo que com ele se entrega no compromisso único de ser catarticamente amoroso e feliz com o outro e com o espaço.

“2014 , um bloco por quadra.”

Ele ressona com força durante todos os outros dias do ano deixando claro e fortalecendo o corpo e pensamento de cada um de nós que a cidade é de quem nela habita e compartilha do comum.

Obrigado Belo Horizonte! ♥

Fotos: Oliver Kornblihtt • Texto: Paloma Parentoni

Trabalho realizado em parceria com Midia NINJA

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