Verdadeiro ou falso? Filtramos as afirmações de Sara Winter no debate da Folha

eDemocratize
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5 min readJul 11, 2016
Reprodução/Youtube

Maria do Rosario defendeu estuprador? Feministas inventam estupro? Feministas recebem bilhões do estrangeiro? O Democratize pesquisou sobre cada afirmação da ex-feminista Sara Winter durante debate na Folha de S. Paulo, com a pré-candidata para vereadora Sâmia Bomfim (PSOL).

Ex-ativista feminista, Sara Winter hoje faz parte de um renomado grupo de “personalidades” que resolveram mudar de lado radicalmente na política.

Ao lado de figuras como Alexandre Frota, ela faz parte da chamada “nova direita”, em ascenção por conta dos protestos contra o governo da presidente afastada Dilma Rousseff (PT), desde o ano passado.

Por conta da sua mudança repentina, Winter foi convidada para debater feminismo pelo jornal Folha de S. Paulo, no quadro “FlaFlu”. Ao seu lado, a pré-candidata para vereadora na cidade de São Paulo, Sâmia Bomfim (PSOL). Ativista feminista pelo coletivo Juntas, Bomfim encarou argumentos polêmicos e bem questionáveis por parte de Winter.

Mas será que as afirmações da ex-feminista são verdadeiras?

O Democratize resolveu pesquisar alguns pontos polêmicos levantados pela Sara Winter durante o debate.

O que mais podemos observar é justamente a utilização de tais argumentos como verdade absoluta nas redes sociais, através de blogs e sites questionáveis. Ou seja, se você for debater com qualquer grupo de extrema-direita, é bom estar preparado para ouvir as mesmas coisas.

Mas, afinal, o que é verdade e o que é mentira nisso tudo?

Maria do Rosario defendeu estuprador

Segundo Sara Winter, a deputada federal Maria do Rosario (PT) teria defendido Champinha, conhecido por ter assassinado e abusado sexualmente da jovem Liana Friedenbach, no ano de 2003. Segundo Winter, é impossível uma mulher ser feminista e defender uma figura política que tenha se posicionado a favor de um estuprador menor de idade, por causa dos “direitos humanos”.

Na época em que cometeu o crime, Champinha era menor de idade. Trata-se de um dos casos que deu maior visibilidade para a campanha pela redução da maioridade penal.

O problema é que o pai de Liana, Ari Friedenbach, que é vereador, já afirmou repudiar o uso do caso de sua filha para defender a redução — iniciativa que ele considera inadequada. “Acredito que a melhor opção não é a redução da maioridade, mas a responsabilização do menor que cometer crimes hediondos: latrocínio, homicídio, sequestro e estupro”, disse. Segundo Ari, reduzir a maioridade penal “só desloca a criminalidade para outra faixa etária, cada vez mais cedo”.

Além disso, a afirmação de Winter é hoax. Boato, mentira.

Foto: Nilson Bastian/Câmara dos Deputados

A deputada federal Maria do Rosario nunca sequer mencionou o caso envolvendo Champinha publicamente. Professora na época quando aconteceu o crime, ela havia acabado de se eleger deputada federal pelo seu primeiro mandato, com cerca de 143 mil votos, no Rio Grande do Sul.

Sem declarações e muito menos posicionamentos na época, a afirmação de que Maria do Rosario teria “defendido Champinha” é falsa, e baseada em informações desconectadas. Ou seja: utilizam o fato dela ser contra a redução da maioridade penal para argumentar que ela defende Champinha. Mas se formos considerar tal argumentação, o próprio pai de Liana, vítima do rapaz, se enquadra nas acusações.

Um vídeo circula na Web mostrando uma visita feita por “advogados dos direitos humanos”ao Champinha. No vídeo, tentam associar a voz de uma mulher ao de Maria do Rosario — sendo que ela diz seu nome logo no começo, Débora.

Na realidade, tratava-se de uma visita do Conselho Regional de Psicologia, que denunciou em 2011 a situação dos jovens detentos na Fundação Casa, “cujo encarceramento não tem data para terminar”. Segundo o conselho, a Unidade Experimental de Saúde é uma prisão perpétua que, além de manter os jovens encarcerados ilegalmente, não dispõe de médico plantonista e projeto terapêutico.

Afirmação falsa.

Feministas inventam casos de estupro

Segundo Winter, é culpa das feministas a “invenção de casos de estupro” para “promover sua ideologia”.

Porém, em 2015, uma mulher foi estuprada a cada 11 minutos. Os dados, confirmados e checados, são do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Cerca de 47.646 casos de abuso sexual foram registrados em todo o país. Mas ao contrário do que foi afirmado por Winter, o número pode ser ainda maior. Isso porque muitas mulheres, ameaçadas, preferem não registrar a ocorrência do abuso. É o que diz a diretora-executiva do fórum, Samira Bueno: “É o crime que apresenta a maior taxa de subnotificação no mundo”. Para o Fórum, sem os registros oficiais, é possível acreditar que ocorrem entre 136 mil e 476 mil casos de estupro no Brasil no ano passado.

Geralmente, defensores de extrema-direita costumam se basear em números fictícios ou até mesmo informações desconectadas — como foi o caso do Champinha. Por exemplo: em 2012, na cidade de Bauru (interior de São Paulo), foram registradas 100 ocorrências de estupros por ano na cidade. Deste número, cerca de 10 envolvem crimes com autoria desconhecida. E dentro desses 10 casos, 50% são revelados como falsos após o início das investigações.

Ou seja, apenas 5% dos casos são considerados falsos pela própria polícia, em média.

Porém os dados são “aumentados” e “bombardeados” com informações desconectadas, sendo espalhadas na mídia de outra forma.

Afirmação falsa.

Foto: Washington Times

A Fundação McCartney financia as feministas

Não. O Paul McCartney não resolveu financiar a “propaganda pelo aborto” ao redor do mundo.

Isso porque não existe nenhuma fundação com esse nome.

Segundo Winter, é a Fundação McCartney que financia organizações feministas no Brasil, como o grupo Católicas pelo Direito de Decidir. Porém, essa fundação não existe. Segundo afirmou a ex-feminista, os dados constavam em um site público da própria fundação.

Outros sites de extrema-direita na Internet ainda afirmam, generalizando, que os grupos feministas não são apenas bancados pela fictícia Fundação McCartney, como também pela Fundação Ford e por George Soros.

Resolvemos então pesquisar algumas fundações estrangeiras citadas nos sites.

A Fundação MacArthur, por exemplo, não opera no Brasil. Na América Latina, a organização financia atividades apenas no México.

Outros grupos como Open Society, do empresário George Soros, ou a Fundação Ford, atuam no Brasil. Porém, nos registros de cada organização, não é possível identificar qualquer forma de financiamento para grupos feministas que atuam em solo nacional.

Afirmação falsa.

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