Ermida de Santo Amaro em Lagos

Maria Inácio Duarte
8 min readMay 2, 2018

--

Ermida de Santo Amaro e actualmente, em Lagos, Portugal, 2011

Sobre a Ermida de Santo Amaro em Lagos

1325 — Segundo Mário Cardo, esta ermida já existia nesta data.

1448 — Esta ermida já aparece mencionada numa relação de templos de Lagos.

1617 — Esta ermida está localizada na Carta Geográfica de Alexandre Massay.

A ermida de Santo Amaro não só assenta sobre rocha dura, mas é uma construção enterrada em parte numa encosta, dois factos muito importantes para diminuir os efeitos sísmicos. Essa rocha é um calcário fossilífero rijo que até serve para mós; mas também se encontra próximo grés amarelo. A diferença de resistência dos edifícios aos abalos (tremores de terra) não se pode explicar pela natureza do solo porque quase todos eles estavam edificados sobre rocha dura. Após o terramoto de 1755, em Lagos, Portugal, só ficaram algumas casas térreas em pé na Porta dos Quartos, rua dos Homens do Mar e rua do Jogo da Bola.

De estudos efectuados concluiu-se que o terramoto foi mais intenso em Lagos do que em Lisboa. Também o número de mortes em comparação com Lisboa foi de 6100, isto é, o dobro das de Lisboa.

A ermida de Santo Amaro está situada na mesma colina que a igreja de São Sebastião e que a igreja Nossa Senhora da Glória, apesar da ermida estar um pouco mais acima.

Em torno desta ermida albergaram-se as pessoas que conseguiram escapar aquando da ocorrência do terramoto de 1755. Foi a única construção que ficou sem lesão, passando ali a celebrarem-se os ofí­cios religiosos e a ser a paróquia de São Sebastião até à reconstrução desta igreja.

A população de Lagos que não morreu, deslocou-se então para a área de Santo Amaro e ali construiu provisoriamente barracas de madeira e de colmo. A maior parte dos moradores de Lagos sobreviventes passaram a viver neste campo de Santo Amaro nessas barracas, passando ali todo o inverno. Ficaram quase todos pobríssimos porque os seus bens móveis, uns foram enterrados nas ruínas, quebrados, desfeitos e perdidos; outros o mar os levou e outros os ladrões e os imóveis ficaram arrasados ou quase como foram as casas do capitão Simão Manuel de Villa Lobos e outros na praça Luís de Camões.

Após alguns anos, apenas a quarta parte da cidade foi reedifi­cada, mas com menor esplendor e isto foi feito apenas para se livrarem dos incómodos das barracas e do rigor do tempo de inverno que padeciam nos campos e só o pagador geral da gente de guerra José Joaquim Ribeiro Riba as pôs em melhor estado do que antes o que verdadeira­mente é um palácio para a cidade.

Lagos, que já se chamou Laccobriga, foi pré-romana e pré-cartaginesa, sempre como uma cidade marítima em quatro colinas. A sua origem foi, não um castro, situado ou no Monte Moleão ou no sítio do Paúl, mas um povoamento disperso por todos estes arredores numa área de muitos quilómetros e o povoamento foi iniciado por Brigo em 1899 aC. Lagos foi destruída ou arrasada por terramotos e maremotos e, depois, por volta de 359 aC foi mudada para onde actualmente está localizada por Bohodes, capitão cartaginês.

Em 1650, grassa em Lagos a peste; Lagos é encerrada e fica isolada do restante território. Em 1755, Lagos fica novamente completamente destruída durante o terramoto e maremoto. Após o terramoto, durante o qual este Governador — Dom Rodrigo António de Noronha e Menezes — perdeu o seu filho mais novo, Francisco, no maremoto, a sua esposa com os seus outros dois filhos foram viver para Lisboa, para a casa da família. Dom Rodrigo António de Noronha e Menezes passa a viver sozinho em Lagos, no quartel, governando o Algarve até 1762, reconstruindo a defesa da costa algarvia e lutando contra a adversidade da falta de meios, pois principalmente o barlavento algarvio e Lisboa tinham ficado completamente destruídos e, por conseguinte, a Coroa sem fundos monetários para fazer face a tanta necessidade. Em 1762, abandonou este cargo de Governador do Algarve por se sentir incapaz psicologicamente de continuar pela tanta necessidade e sem meios financeiros para concretizar as obras necessárias e também por resistência da esposa em juntar a família em Lagos e regressou a Lisboa porque havia muitas decisões a tomar, entregando este cargo de Governador do Algarve ao rei. Continuou no exército com o mesmo posto de capitão-general. Os militares sob o seu comando foram para Tavira; era o seu quartel-general no Alto de Santana. Lagos e Tavira eram as únicas cidades da Coroa. Faro era cidade da Rainha. É então nomeado o 41.º Governador (interino) do Algarve, Dom Fernando Lourenço de Sant’Ana, também Bispo do Algarve com residência na sede de Bispado, em Faro e o rei, Dom José, extingue este cargo de Governador do Algarve. Mais tarde , o rei Dom José I criou o cargo de Governador de Armas do Algarve, cargo que já existia nas outras províncias de Portugal.

Este terramoto arrasou completamente a cidade de Lagos que perdeu o título de capital do Algarve e o Palácio dos Governadores não voltou a ser reconstruído. Assim Lagos deixa de ser a capital do Algarve e a sua decadência é total. Há notícias de que este terramoto mudou as correntes marítimas em frente da costa, arrefecendo as águas e diminuindo a riqueza pesqueira existente. Abriu também várias bocas no rio que ficam cheias de água com a maré vazia e não se lhe acha o fundo.

A igreja de Santa Maria ficou raza com o chão; a igreja de São Sebastião ficou em pé, mas com bastante ruína; a igreja da Misericórdia ficou em pé, mas arruinada e foi a primeira que se consertou, pois foi para lá a colegiada de Santa Maria; a igreja de São Braz e a igreja de Porto Salvo também foram destruídas; a igreja de Santo António dos soldados infantes ficou muito arruinada; a ermida do Espírito Santo ficou raza com o chão e também a ermida de Nossa Senhora da Graça e também a ermida de São Roque e também a ermida de São Pedro e também a ermida de São Lázaro e também a ermida de São João Baptista e também a ermida de Santa Bárbara dos soldados artilheiros e também o hospital Militar e também o convento de São João de Deus e também o convento dos religiosos da Santíssima Trindade e também o convento das religiosas do Carmo e também o convento de São Francisco dos padres capuchos (franciscanos). O forte do Pinhão ficou muito demolido; a fortaleza da Ponta da Bandeira ficou arruinada; as casas da Câmara ficaram razas; a Casa da Vedoria Geral e da Guarda principal ficaram arruinadas e também a Cadeia da Cidade. Os edifícios maiores da cidade ficaram por terra assim como as muralhas todas.

Aconteceu assim:

No dia um de Novembro pelas nove horas e três quartos deu-se o terramoto, precedido de um forte trovão surdo e medonho e imediatamente se sentiu abrir todo o firmamento e a este tremor se seguiu pouca queda de edifícios, porém no tremor que se seguiu, todos os edifícios cairam por terra até os mais fortes e as pessoas que morreram debaixo das ruínas e das ondas julga-se serem mais de duzentas e cinquenta. Era a altura em que as pessoas estavam a sair da Igreja de Santa Maria da Graça, pois era a missa de Todos-os-Santos que tinha começado às nove horas da manhã e era feriado. O mar elevou-se que parecia tocar as nuvens e todos os que viram fugiram para o campo. O mar subiu mais de trinta palmos, arrasou e incapacitou as hortas e foi levar os barcos a partes incríveis mais de meia légua pela terra adentro. A terra abriu várias vezes durante o tremor. O mar levou todos os móveis de muito valor, toda a prata, ouro, dinheiro, pipas de vinho, trigos, milhos e legumes, bibliotecas particulares, escrituras das fazendas e das casas e por não terem onde se recolher fizeram barraca em Santo Amaro onde passaram a morar.

O hospital militar foi mandado construir, em 1794, no terreno onde existiam os antigos Paços do Concelho, o hospital de São João de Deus e a antiga torre do relógio. Junto ao hospital militar encontra-se a igreja de Santa Maria da Graça transformada em adega. A ermida do Espírito Santo foi transformada em taberna. Os terrenos das igrejas de Porto Salvo e de São Braz passaram a armazéns de arrecadação do regimento militar. A sete de Maio de 1850, foi concedida à Casa das Misericórdias de Lagos para aumentar as enfermarias, o terreno do que era o Palácio dos Capitães-Generais do Algarve e que se situava entre o hospital e o quartel. Em 1885, foi edificado no mesmo local um hospital civil. O convento dos padres capuchos fica extramuros a Norte da cidade e a sua igreja chamava-se igreja de Nossa Senhora da Glória. Nele instalou-se a Guarda Republicana. A igreja da Misericórdia passou a paróquia de Santa Maria. O convento das freiras carmelitas passa a Casa de instrução e Educação pública.

A nove de Maio de 1821, nas Cortes, o deputado Domingos de Mello expõe a decadência em que a cidade se encontra passados sessenta e seis anos do terramoto. Tendo este deputado nascido em Lagos afirma ter o direito e a obrigação de interceder pela cidade que já foi capital e que na altura se achava pobre e demolida; sem calçadas nas ruas principais e públicas; sem polícia; sujeita a moléstias contagiosas pela sua falta de limpeza em geral e em particular pela infecção das águas públicas, pela ruína e pelo abandono em que se achava o seu aqueduto.

Posto que nenhuma das cidades marítimas de Portugal tem uma baía tão bela, espaçosa e capaz como Lagos e aonde em todos os tempos as armadas nacionais e estrangeiras ali faziam escala para se refazerem de refrescos, carnes e da preciosa água que tinha, o lastimoso estado em que estava na altura o aqueduto reduzido, que em menos de mil passos geométricos conduz do seu nascimento a água à cidade, no momento só oferecia a impossibilidade de fornecer qualquer gota de água. Ele está situado junto do rio da cidade e coberto muitas vezes pelas enchentes da maré que no inverno tem chegado a lançar pelas bicas do único chafariz que há, em lugar de água, lama, ervas e bichos que são introduzidos nas roturas pelas chuvas e marés. Assim durante o verão, esta mesma água, única de que se servem os habitantes, deve ser a causa de uma moléstia febril com indícios de epidemia. Só num dos últimos três anos morreram repentinamente perto de quatrocentas pessoas. O relógio público desapareceu durante o terramoto e até à data a cidade continua sem relógio público; o cais da cidade continua destruído e o mar arruina a cidade desse lado. Os moradores de Lagos continuam numa situação de miséria e sem possibilidades económicas. Lagos ainda não tem casas da Câmara. No entanto, os lacobrigenses estão sobrecarregados de impostos: décimas, sizas, contribuições, subsídios, real da água, dízimos, novos impostos, arruados, etc. etc.

Esta a importância crucial da ermida de Santo Amaro para toda a cidade de Lagos e que levou a uma grande fé e devoção a este santo.❐

in livro LAGOS, evolução urbana e património de Rui M. Paula,

edição da Câmara Municipal de Lagos, de Outubro de 1992.

meu trabalho “A Ermida de Santo Amaro”

trabalho “A Ermida de Santo Amaro”

--

--

Maria Inácio Duarte

Licenciada em Economia e Master em Economia na especialidade de Planeamento licenciada em Gestão de Recursos Humanos sou professora, economista escritora. Gosto