Entre coxinhas e choripanes: como é trabalhar em um time de Design brasileiro e argentino

O dia a dia de uma equipe cujo principal idioma é o portunhol

Milena Kotaki
5 min readNov 30, 2021
O time de WMS em novembro de 2021

Em outubro de 2020 eu comecei a minha jornada no Mercado Livre e fui a designer nº 40 da equipe de UX designers do Brasil. Hoje já somos 137 em uma equipe que não para de crescer por conta da expansão gigantesca do Mercado Livre em território brasileiro.

Para quem não sabe, o Mercado Livre é uma empresa argentina, que expandiu sua atuação para mais de 18 países. Temos um time de UX com mais de 600 designers, que estão distribuídos em países como Argentina, Brasil, México, Chile, Uruguai e Colômbia.

Falando especificamente da minha equipe, fazemos parte de Mercado Envios, e trabalhamos com um produto digital que é o sistema utilizado pelos usuários da operação dos centros de distribuição Full do Mercado Livre. Temos uma equipe super recente, que começou em Buenos Aires e se estendeu para São Paulo em agosto de 2020, e da qual a maioria dos integrantes tem em torno de seis meses de casa.

Uma das coisas que mais me perguntam sobre como é o meu dia a dia no Meli é como eu lido com a questão do espanhol. E pra mim, essa é uma pergunta que não tem uma resposta sucinta, pois a diferença de idiomas traz um novo nível de complexidade para a nossa comunicação, que é difícil classificar apenas como algo que é bom ou ruim.

Dando um pouco mais de contexto, não é necessário ter um nível específico de espanhol para entrar no Meli. Falamos em português e espanhol nas reuniões, e as documentações, apresentações e fluxos podem ser feitos no idioma que a pessoa se sentir confortável. Tem gente que começa a fazer aulas de espanhol porque tem interesse em se aprofundar, e tem gente que não faz e entrega um trabalho com a mesma qualidade dos que estudam espanhol.

Do meu ponto de vista, essa dinâmica só é possível pelas similaridades que os dois idiomas apresentam: você consegue entender um texto em espanhol mesmo só sabendo português. Você também consegue enviar um texto em português perfeito com o auxílio de tradutores online (reverso.net, me patrocina!). Por isso, os maiores desafios surgem na comunicação oral: é comum termos dúvidas, pedirmos pra pessoa repetir o que disse e compartilharmos minutas das reuniões para garantir que todo mundo teve o mesmo entendimento do que foi discutido.

Por mais que de vez em quando a gente se enrole um pouco no quesito comunicação, não dá pra ignorar o fato de que não tem maneira melhor de você aprender um novo idioma e também sobre cultura diferente do que com a oportunidade de conversar com pessoas de outro país todos os dias.

A equipe da qual eu faço parte, que está em São Paulo, tem uma troca constante com as pessoas de Buenos Aires, que é onde está a maioria dos designers e pessoas de tecnologia do nosso produto. Aprendemos várias gírias específicas dos porteños, e ensinamos para eles as nossas. Aprendemos que o pessoal da Argentina tem um sotaque diferente dos demais países hispanohablantes, e eles aprenderam a falar palavras em inglês igual a gente aqui no Brasil: “Titaníqui”, “Méquibúqui”, “Samsúngui”. Aprendemos os memes do Julio (um cantor espanhol com o qual surgem diversos memes quando chega o mês de julho), e eles aprenderam conosco o significado de “sextou”.

É muito enriquecedor, como brasileira, poder ter essa troca. Digo isso porque o Brasil é o único país que não fala espanhol na América Latina, e isso nos separa e desconecta de muitas referências culturais dos países hispanos.

Porém, também existem diversos elementos culturais que nos unem. Somos a cara da globalização: assistimos às mesmas séries e animes no Netflix, escutamos as mesmas bandas internacionais e, estranhamente, os integrantes dos dois países assistiam Xuxa quando eram baixinhos. Claro que esse contexto não nos impede de compartilhar referências locais. Ou vocês acham que a gente ia perder a oportunidade de compartilhar o que é funk carioca? Inclusive, temos uma playlist da equipe que é excelente para compartilhar essas referências.

Aparentemente Teletubbies é uma referência internacional e reconhecida por brasileiros e argentinos

Além disso, como designers, passamos pelos mesmos contextos e dificuldades no dia a dia, e o Design acaba se tornando um idioma em comum entre nós. Particularmente, na minha equipe, logo descobrimos que, seja em português ou em espanhol, trabalhar com logística é extremamente complexo.

É importante lembrar que, apesar de estarmos em países diferentes, durante a pandemia estamos todos trabalhando de nossas casas. Isso acaba equalizando o nosso dia a dia: temos os mesmos problemas de atender o interfone no meio das chamadas, querer comprar um aquecedor (ou uma estufa) nos meses de frio, e amamos incluir nossos pets nas videochamadas.

Coffee break com participação especial de Jojo, Leona, Toni, Kermit e Marnie

E, claro, como latinoamericanos, também estamos sujeitos a similaridades políticas e socioeconômicas. Por exemplo, constantemente sofremos com a inflação, e me surpreendi quando descobri que na Argentina também existe o fenômeno do panelaço (ou cacerolazo). Juntos, vivemos a ansiedade pela chegada da vacina contra a COVID-19, enquanto diversos países europeus já vacinavam populações. Grande parte da equipe entrou na pandemia e, com a campanha de vacinação avançada, pudemos viver a felicidade de conhecermos as pessoas dos times e também o escritório de nossas cidades.

Encontros presenciais dos 3 times que compõem a equipe de WMS (a primeira foto é em Buenos Aires e as outras duas são na Melicidade, em São Paulo)

Quando entrei no Mercado Livre, parecia impossível alcançar o nível de entendimento de projeto e de idioma que eu tenho hoje. A liderança constantemente reforçava que uma hora ia ficar mais fácil, uma hora ia melhorar. E melhorou! Hoje tenho um ouvido mais bem-treinado para entender o espanhol e, dos dois lados, estamos sempre nos apoiando com consultas e traduções quando é necessário. No final das contas, acredito que temos muito mais em comum do que parece à primeira vista.

Hoje existem diversas empresas que trabalham com times internacionais, mas eu realmente acredito que há algo um pouco mais enriquecedor em trabalhar em um time exclusivamente latino-americano. Sou muito grata por todos os aprendizados que o meu time me proporciona e, quem sabe em 2022, estaremos juntos em um possível encontro da equipe de Buenos Aires e de São Paulo!

Time WMS junto na praia \o/

--

--