Estádio Batistão, em Sergipe

Lavradores de cimento -Parte I

Revista Fora da Área
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4 min readMay 12, 2015

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Por Fabio Perina

Da rapadura ao geladinho. Da Schin à jurubeba. Do cigarro de palha ao sapatão da roça. Banheiros pra quê? Percorro o CONCRETO infinito e mais fácil encontrar um radinho de pilha do que um iPhone!

Permitam-me pôr CONCRETO em caixa alta mesmo, e todas as palavras similares também! O motivo é muito simples: nada disso passa como coadjuvantes da cena.

Cada um procura o seu cantinho, onde tem a certeza de poder apreciar e participar do jogo da forma que mais se sinta livre. Não parece haver qualquer obstáculo depois que já giraram a catraca. Todo aquele BLOCO indiferenciado permite a livre circulação e expressão dos CABOCLOS e que pertence somente a eles! Dádiva que foi dada a essa brava gente.

Até parece com o circo que chegou na cidade para a alegria da criançada. Mas agora a diversão é também para os PEÕES. Aspira ser envolvido pelo jogo, não oferecendo a menor resistência. No estádio, ele quer se confundir com o todo. De TIOZÃO em TIOZÃO, forma-se um amontoado que mal dá pra chamar de coletivo. De coletivo não vejo quase nada, além da cor da camisa e o grito de gol.

A gente se acostuma, mas não deveria. A propaganda diária formou a equipe mais eficiente de todas, que não perde nunca: a de uma tecnocracia marketeira e empreendedora, que nos convenceu que as novas arenas são muito melhores que os velhos estádios.

A gente fica cabreiro de pensar que ainda restaram estádios. Estádios de massa. Feitos de massa de povo e massa de concreto. E que algum suspiro resistente de alguma pureza ainda possa existir.

Castelão, em jogo do Sampaio Corrêa

A gente se acostuma, mas não deveria. Não parece haver qualquer suspeita de algo quebrar esse ritual tão espontâneo. Nem mesmo algum(a) ‘Richa’ entre os soldados da ordem contra esses pacatos MATUTOS. Parece que a diversão dos mesmos ocorre em uma relação direta com seu clube. Sem qualquer mediador e sem que nada o atrapalhe. Sem ninguém para orientar como girar uma catraca. Sem ninguém para explicar onde se localiza o assento escolhido previamente.

É diversão mas é das coisas mais sérias na vida desses CAPOEIRAS. Seríssima!

Eu, que sempre vou aos estádios procurando o som e a fúria, procurei as torcidas organizadas, mas parece não haver quase nada que levante o povão. A depender apenas desse critério, achei frustrante procurar por torcidas organizadas tão vibrantes como as que vejo sempre. Se me deixasse levar por um olhar exótico ficaria satisfeito com a conclusão que naquele instante eu estava culturalmente em um tempo anterior ao das torcidas organizadas! É então que, sem perceber, revalorizo a tranquilidade que um PAREDÃO daqueles me passa.

Se nesse espaço que agora escrevo há um convite para os contrapontos eu arrisco esse: esqueça os chavões de sempre, como aquele que diz que jogo no Nordeste sempre é lotado. Os estádios cheios de lá e suas maiores torcidas sempre vão ter seu reconhecimento, mas agora o papo é outro. Nas rodadas iniciais da Copa do Nordeste vários públicos deixaram a desejar. Mas o que não impede, desde que não sejamos preguiçosos, de ainda assim valorizar o que estava longe do olhar mais evidente sobre o torcedor nordestino.

Esse torcedor é, antes de tudo, um forte!

FABIO PERINA é torcedor do Palmeiras, sociólogo e estudante de educação física pela Unicamp.

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