Como vota, deputado?

Gustavo Carvalho
3 min readNov 22, 2017

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Em 25 de outubro de 2017, a Câmara dos Deputados votou a solicitação de instauração do Processo nº 2, pelo Supremo Tribunal Federal, contra o Presidente Michel Temer e os Ministros de Estado Eliseu Padilha e Moreira Franco. Foram 251 votos à favor do arquivamento e 233 contrários. Depois da fase de discussão, cada deputado foi chamado nominalmente para proferir o voto no microfone. Eles tinham de dizer “sim”, concordando com o parecer de inadmissibilidade da denúncia da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ); “não”, discordando do parecer da CCJ ou “abstenção”. O voto “sim” era pelo arquivamento e o voto “não” pela continuidade da denúncia. A oposição não conseguiu os 342 votos necessários e a denúncia foi arquivada.

Os deputados dispunham de pouquíssimo tempo no microfone, cerca de 15 segundos, suficientes apenas para dizer sim ou não e mais uma dezena de palavras. A baixa popularidade de Temer evidenciou as estratégias dos dois grupos durante o voto. Os aliados do presidente, salvo raras excessões, preferiram votos curtos, mencionando principalmente “estabilidade econômica”, “retomada do crescimento”, “PT” e “orientação do partido”. Os parlamentares à favor da denúncia aproveitaram a curtíssima exposição na televisão para falar principalmente de “povo”, “corrupção”, “quadrilha”, “reforma da previdência” e “direitos dos trabalhadores”. A palavra “povo” foi a mais usada nos votos pela denúncia e apenas a 18ª mais usada nos votos contra, indicando que os deputados sabiam da impopularidade dos votos que salvariam Temer.

A análise dos pares de palavras mais comuns reforçam a estratégia utilizada por ambos grupos:

Quanto à exposição, como esperado, os deputados de partidos com maioria de votos “não”, contra Temer, deram votos mais longos, por vezes tendo o áudio do microfone cortado após os 15 segundos. Deputados do “sim” foram mais sucintos, fugindo da impopularidade do voto à favor de Temer. Destaque para o PSC, que apesar do apoio majoritário (60% dos deputados do partido votaram “sim”) ao presidente, procuraram justificar seus votos. Essas tentativas geraram alguns discursos absurdos, como o de Marco Feliciano, que votou “sim” (PSC-SP):

Sr. Presidente, eu perguntei aos meus seguidores quem eles gostariam que investigasse o Presidente Temer: o Supremo Tribunal ou o Juiz Sergio Moro. Eles disseram Moro. Mas, para o Juiz Sergio Moro julgá-lo, só em 1º de janeiro de 2019. Por isso, eu voto com o Relator. — Marco Feliciano (PSC-SP)

Curiosamente, esse foi o único discurso que citou o juiz Sérgio Moro. A Operação Lavajato não foi mencionada por nenhum parlamentar. Outros deputados, entretanto, mencionaram tudo que foi possível no tempo protocolar:

Há provas robustas de corrupção. Por isso, voto não ao relatório. E, para salvar o Brasil, pelo direito à Previdência, ao Bolsa Família, ao Minha Casa, Minha Vida, ao Água para Todos, ao PRONAF, ao PAA, à merenda escolar, ao direito dos povos indígenas: fora, Temer! — Afonso Florence (PT-BA)

Os deputados do centrão também usaram a tática do “toco y me voy”, passando a bola para o próximo rapidamente. A média acumulada de palavras usadas a cada cinco votos dá ideia da duração dos votos, com os deputados contra Temer proferindo discursos consistentemente mais longos, mesmo quando o resultado já estava definido após 157 votos “sim”.

Enquanto um grupo fez campanha antecipada, o outro claramente fugiu dela.

PS: segue a rotina do R para criar as figuras desta postagem.

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