Colagem: Pedro Henrique Cabo.

A responsabilidade de pessoas públicas nas redes sociais, segundo esse vereador de Campo Grande

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6 min readJun 6, 2020

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William Siri é um jovem político e usa suas redes para informar e influenciar a população da zona oeste

Escreveram Gabriele Freitas e Isabelle de Oliveira

O engajamento nas redes sociais se tornou uma importante ferramenta no cenário político, sendo frequente o uso de diversas plataformas para criar campanhas, convocar manifestações, realizar discursos ou apenas passar determinadas informações. Diversas funções foram aprimoradas, de modo que se tornou comum perfis com engajamentos políticos. Jovens influenciadores usam esse palco para conscientização, discussões e bate-papo com autoridades no assunto.

O jovem William Siri foi candidato a vereador pelo PSOL em 2016 e conquistou 6.286 votos. Seu trabalho na zona oeste do Rio de Janeiro é mostrado em suas redes sociais e no seu coletivo Tudonumacoisasó. Convidamos William para uma conversa sobre política, influência, zona oeste e responsabilidade virtual.

Pergunta: O que despertou seu interesse pela área política?

William Siri: Em 2012, com 18 para 19 anos, eu comecei a estudar economia na Universidade Cândido Mendes e me deparei com uma nova realidade de ir do centro à cidade, que eu não conhecia, só ouvia meus pais e amigos falando que iam para trabalhar. Todo dia acordava às 05h20 para pegar o trem de 05h50 e chegar na aula às 07h20. Foi assim durante um ano e pouco até que consegui um estágio de 4 horas no SEBRAE e passei a dividir um quarto com um amigo — no valor de R$300 — na Lapa. Então, eu acompanhei toda a “manifestação dos 20 centavos” até junho de 2013 quando ocorreu a grande concentração na Presidente Vargas, com mais de um milhão de pessoas. Eu conhecia muita gente da zona oeste, e conheço ainda, igual ou até melhor para falar sobre política, pela vivência de periferia, experiência de vida, até mesmo o discurso. E aquilo ali foi me dando uma coisa que era “que bom que participei disso, mas eu quero construir minha vida!”. Eu não digo política como institucional, que eu faço hoje como pré-candidato, mas vida política profunda. Só que eu decidi fazer isso em Campo Grande, Bangu, Santa Cruz, onde eu estava. Eu entendia que o epicentro político estava entre Tijuca-Centro-Zona Sul, mas queria que essa discussão política viesse um pouco para Madureira, Deodoro, para chegar mais perto da coisa e a minha galera também chegar mais próximo. Aí que rolou o Tudo Numa Coisa só e dentro de vários projetos veio a campanha.

Pergunta: Seus perfis nas redes sociais somam quase 16.500 seguidores. Como foi construir suas redes sociais para dialogar sobre política?

William Siri: Construir a minha imagem é muito difícil porque nós vivemos num momento que a política identitária é mais forte. Eu sou homem cis, hétero, branco. Tudo o que está na pauta do campo progressista não está nada encarnado em mim. Não está na minha pele. Meu pai é negro e minha mãe é branca, mas eu mesmo não tenho muita coisa. A única coisa legítima é de onde eu vim, meu pertencimento, mas não está muito no campo identitário. Aí temos a questão da nossa região, em que, por exemplo, 77% dos eleitores votaram no Bolsonaro. É uma galera mais conservadora, é preciso saber como dialogar. Por isso essa construção foi lenta.

Então, para ter esse crescimento exponencial, eu acho que poderia ser mais fácil partir pela região que nós estamos e pelo grupo que nós temos. Hoje somos mais de 16 mil pessoas, poderia ser muito mais por nosso perfil ter a compreensão do nosso território. É uma parada muito híbrida que pauta o progressivo sempre, porém tendo relações com as pessoas que estão em volta da gente. As pessoas que olham 2016, poderiam falar “Ah, mais um!”, mas hoje a gente vê que tem uma projeção, cada dia mais crescente, das pessoas realmente acreditarem e reconhecerem que mesmo homem, hétero, cis e tudo mais, tem uma construção cada vez mais coletiva que representa o território.

William Siri faz campanha no calçadão de Campo Grande. Foto: Felipe Ouverney.

Pergunta: Você tem trabalhado muito com as lives no Instagram, onde fala sobre vários assuntos como cultura, esportes e a região da zona oeste. Isso já estava previsto ou foi uma alternativa à pandemia do novo coronavírus?

William Siri: Não, foi 100% uma alternativa. Nós tínhamos fechado um tipo de planejamento que mudou totalmente porque todo o nosso olhar, que vinha do físico para o virtual, foi reconstruído para uma linguagem ‘rede social — rede social’. Eu mostrava para a galera o que eu estava fazendo na rua, diferente de agora. De uma certa forma, nossas redes sociais deram um salto. Agora estou tendo muito mais uma identidade visual, o que antes eu não tinha. Iria acontecer, mas não de forma tão rápida como foi a partir da pandemia. Nós começaríamos a construir mais no final do ano, para na época de campanha estar mais consolidada, mas acabamos adiantando.

Pergunta: Existe uma cobrança na internet para influenciadores se posicionarem sobre assuntos que ganham visibilidade. Você procura falar sobre esses temas naturalmente ou sente mais necessidade de falar sobre certas pautas devido à pressão do seu público?

William Siri: Eu acho que tem que ter um cuidado. Essas coisas que são pautas hoje fazem parte da minha construção, então, para mim, não é um problema. Ainda assim, tem assuntos que eu não faço a menor ideia e fico “E aí, vamos nos pronunciar ou não?”. Acontece que as redes sociais são uma espécie de coliseu, você se coloca ali e está exposto a tudo. Muitas vezes é construída uma narrativa forte que você tem que se posicionar nos primeiros 10 minutos e não. Às vezes pode demorar seis horas, um dia. Se a gente for pensar racionalmente não é muita coisa, mas, com essa loucura de rede social, em meia hora já perguntam: “Não vai se posicionar não?”. Calma, respira e vê como você vai se posicionar para manter a sua coerência. Essa é a questão. Existe uma concepção de que você tem que saber de tudo 24 horas, como se você fosse Deus, o que é o maior erro e a grande ilusão que existe no mundo. Só me dá um dia para eu ler e saber das pessoas que têm propriedade para falar nisso. Eu quero ouvi-las. Já aprendi que, no ruim, deixa eu respirar, não vou pela emoção, vou demorar 30 minutinhos e posso me posicionar depois.

Pergunta: No início do isolamento social, foi visto um grande número de pessoas circulando pelos calçadões de Bangu, Campo Grande, Santa Cruz. Vendedores ambulantes tomaram conta do espaço e pessoas circulavam ignorando as medidas de proteção impostas pela Organização Mundial da Saúde. A prefeitura do Rio de Janeiro decretou o confinamento parcial na localidade e recentemente flexibilizou a reabertura do comércio. Qual postura de conscientização foi tomada especificamente para essas pessoas que dependiam do trabalho informal?

William Siri: Então, o meu coletivo fez a entrega de cestas básicas e a gente conseguiu entrar na rota de uma ação solidária também: o Rio Contra o Corona. É uma coisa muito complicada porque ninguém está acostumado, é uma coisa nova para todo mundo. A última vez que a gente passou por algo assim foi há mais de 100 anos. O próprio Estado não está preparado para isso e, vindo do próprio presidente, não existe uma colaboração para que haja uma coordenação direta.

A Caixa Econômica Federal está lotada, os próprios funcionários da Caixa dando a vida ali. Você vê que não teve uma injeção de infraestrutura nesse mesmo momento do próprio governo federal para melhorar e dar mais eficiência. Tem gente que até hoje não recebeu nem a primeira parcela do auxílio emergencial. São pessoas que precisam comer e vão para rua fazer alguma coisa. O que se vê é a curva aumentando, sem saber se estamos no pico, porque não têm testes suficientes para toda população, e já estão colocando essa flexibilização parcial do comércio.

A gente sabe que aqui na zona oeste nunca parou totalmente e vai abrir 100% agora. O intuito da nossa conversa é utilizar do mínimo das estruturas que nós temos nas redes sociais para informar as pessoas da forma mais didática possível. Mostrando que eu não sou dono da verdade, simplesmente ouço aqueles que são especialistas naquilo e mantenho o bom-senso.

Porque hoje a gente vive uma crise de narrativa gigante, onde nem o bom-senso hoje é mais plausível. As pessoas não estão buscando muito. A gente tenta sempre de alguma forma, com a nossa construção de credibilidade, tanto do coletivo como na figura política, mostrar nossa posição. Todo mundo é influenciador de alguém e precisa ter muito cuidado com isso, ter responsabilidade por saber que está influenciando alguém, então precisa ter minimamente um compromisso.

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