O ir e vir do nosso mundo

A urgência de novas formas de locomoção

Rodrigo Barros
Paiol
3 min readNov 20, 2016

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A extração do petróleo não é barata e muito menos fácil de ser realizada, a depender do terreno explorado e perfurado. É necessária muita análise do solo, precauções de segurança, brocas poderosas ou quem sabe até ter que cavar o fundo do mar e mais fundo ainda se for igualmente justificável para os investidores. Em termos simples, extraímos do subsolo a energia solar armazenada há milhões de anos nesses combustíveis fósseis.

Todo esse esforço colossal para se obter o alimento dos motores. Motores esses que devem possuir força o suficiente para mover rapidamente, em média, uma tonelada e meia de metal. Tantos recursos naturais, energia, tempo e capital gastos para fazer com que normalmente apenas um indivíduo, pesando talvez uns 75 kg, possa usufruir da locomoção diária por um preço igualmente alto. Soaria cômico se não fosse igualmente trágico.

Talvez o transporte pelo meio do automóvel fosse completamente viável num mundo pouco populoso, onde seus pontos negativos mais pareceriam uma gota d’água num deserto. Mas quando se tem mais de sete bilhões de seres humanos no planeta, precisamos começar a pensar em termos de forma diferente; a gota d’água logo se torna uma verdadeira tempestade. Render um senso de comunidade para uma sociedade que vem se firmando na aparente independência dos sujeitos em relação aos outros é uma tarefa difícil. Demanda enfiar a mão num vespeiro e mexer com ícones importantes da nossa noção de modernidade.

O carro não deixa de ser um desses ícones, pois não é apenas um meio de transporte, é também um símbolo de status e ascensão. A cultura do automóvel (assim como o seu lobby) é tão poderosa que conseguiu tornar outros meios de transporte invisíveis. O Brasil é um grande exemplo disso, já que mesmo com dimensões continentais, optamos por abolir a mobilidade de meios mais eficientes, baratos, práticos e menos danosos ao meio ambiente, dando prioridade a pistas de asfalto; pistas estas que demandam um enorme custo para sua manutenção. Nossa logística de transporte de mercadorias é uma das mais afetadas por esse sistema, já que é por meio de caminhões que realizamos grande parte desse trabalho.

Trens não são uma realidade e metrôs, quando existem, são completamente aquém do que deveriam ser. Em grandes metrópoles, onde as vias expressas são um verdadeiro campo de batalha, quem tem o maior carro vence. Os de menor porte são empurrados para as faixas da direita, enquanto os grandes avançam, cortando luz sem parar e exigindo passagem, ameaçando testar a resistência do aço naquele que vem mais devagar.

O transporte público não funciona e muitos se sentem na necessidade de adentrar no espaço das avenidas com seus próprios meios, e quando não podem comprar automóveis optam pelas motos, veículos considerados de nível mais baixo na hierarquia do trânsito. Só perdem para os ciclistas, que ousam invadir a geografia das quatro rodas e nos lembram que a carne é mais fraca que o metal.

Também não somos as criaturas mais indicadas para dirigir essas máquinas. Estima-se que morram mais pessoas no trânsito do que em áreas de conflito armado, o que nos faz pensar que fuzis matam menos do que para-choques. A ironia é que muitas destas guerras foram, são e serão motivadas pelo controle de recursos naturais, como o petróleo.

Dedicamos mais espaço para os pneus do que para as pessoas, e encaramos isso como um sinal de ordem e progresso mesmo que nos custem milhares de vidas diariamente. Nosso sistema individual de transporte não está poupando tempo, trabalho ou dor de cabeça. Gastamos mais tempo, dinheiro e saúde do que se fossemos por outros meios, até mesmo a pé. Os volantes estão nos poupando de pensar maneiras realmente eficazes de ir e vir.

O transporte de massa já é presente em algumas nações, e deve ser prioridade para qualquer mundo que ouse pensar num amanhã mais humano.

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