Relato de Pedagoga

Estabelecendo relações para o Ensino

Pamela Greco
Pais e Filhos

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Estamos em 2010, em uma sala de 2º Ano do Ensino Fundamental e havia 30 alunos em vários níveis de aprendizado.

A professora da turma se aproxima de mim e pede:

- Pamela, você poderia ajudar o P. hoje? Ele fará atividades diferentes do restante da turma.

- Claro! — Respondi. Puxei minha cadeira e sentei-me ao lado dele.

Após uma breve apresentação da tarefa, começamos as atividades. Mas o trabalho simplesmente não desenrolava com ele. Os exercícios exigiam que soubesse ler o enunciado e ele não sabia. Ele movia-se pela cadeira frenéticamente, ia apontar lápis a cada segundo, jogava papéis nos amigos de trás e não se concentrava na atividade. Eu pedia:

- P., vamos tentar ler juntos? Devagarzinho?

- Vamos! — Respondia

- Então vamos! Que letra é essa? — Era um “C”.

- C!

- Isso! E como fica o som do “C” e “A” juntos?

- “CO”! — Respondia

E em todas as atividades, a dificuldade era grande. Inclusive nas atividades de matemática, nas quais ele deveria fazer somas. A professora olhava pra mim e dizia:

- É assim mesmo! Toda aula!

Era compreensível que ela dissesse isso. Eu estava ao lado dele, tentando auxiliá-lo e ele não parava. Fiquei imaginando para ela, que tinha 29 alunos além do P.

Foi aí que um aluno, chamado E., me presenteou com um desenho de carro que ele mesmo havia feito. Entregou-me e saiu rápido com vergonha. De repente o P. disse:

- Pô meu! Um conversível!

Fiquei espantada que ele soubesse o que era um conversível e não soubesse o som das letras “C” e “A” juntas. Depois de um tempo pensando naquilo, tive a idéia de usar aquele desenho de carro pra continuar a trabalhar matemática e português. Comecei dizendo:

- P., quantos pneus tem este carro?

Ele olhou o desenho por um instante e disse:

- Dá pra ver dois, mas ele tem quatro!

- E quantos pneus mais portas esse carro tem?

E com a maior naturalidade ele respondeu:

- Seis.

- E como é o “desenho” do número “6”?

E ele desenhou o seis. Depois disso, o trabalho se desenvolveu e pude associar o que tínhamos trabalhado com o carro com as atividades propostas pela professora. Foi aí que compreendi os conceitos de quão abstratos são a construção da linguagem e dos signos, como no livro que eu havia lido, chamado “Fala Maria Favela”. Além disso, aprendi na prática que é preciso utilizar coisas concretas, podendo ser a cultura na qual os alunos estão inseridos e as experiências que eles têm, para que os conceitos tão abstratos se façam compreensíveis.

Perceber que um aluno que tem dificuldade pode apenas ter problemas para estabelecer relações entre os conteúdos apresentados e visualizar sua aplicação é muito importante para o sucesso do ensino. Quantas vezes não foi preciso estabelecermos uma relação pra entender toda a situação/problema?

Este é um dos textos do blog Pais que Educam, destinado a todos os papais e mamães que querem aprimorar sua participação no desenvolvimento de seus filhos. Para acompanhar todas as dicas e tirar suas dúvidas, acesse o site e nos acompanhe no Twitter e Facebook

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Pamela Greco
Pais e Filhos

Educadora, Pedagoga formada pela Unicamp e mestranda em Psicologia do Desenvolvimento e Educação no Canada.