A minha, a sua, a nossa Lapa: O Lar de Todas as Tribos

Nathalia Villaça
Rio Paisagem Sonora
5 min readJun 28, 2019

--

A Lapa é, inegavelmente, o berço da boemia carioca. A “dama da noite”, nas palavras de Alcione. Mas não para por aí! Antes famosa por ser reduto de malandros, vadios e figuras notórias como Madame Satã, uma das características mais marcantes da Lapa de hoje é a harmonia com a qual convivem as mais distintas tribos urbanas. Um verdadeiro mosaico de tendências culturais, o bairro mistura história, gastronomia, arte e entretenimento em um só lugar.

Por suas principais vias, como a Rua do Riachuelo (antiga Rua Matacavalos, frequentemente citada nas obras de Machado de Assis) e a Mem de Sá, espalham-se atrações para os apreciadores do samba, do chorinho, da MPB e para quem curte funk, forró, pop, rock, hip hop ou música eletrônica. Sempre rola um batuque em frente aos Arcos da Lapa ou uma batalha de rap lá na Rua do Rezende.

Muro em frente aos Arcos da Lapa retratam os personagens da boemia carioca

Além de referência absoluta para os amantes da vida noturna, a Lapa também é reconhecida como um dos mais ricos patrimônios históricos da cidade. Embora muito do antigo cenário tenha sido transformado, a exemplo da substituição do Largo dos Pracinhas pelo Circo Voador, o bairro ainda apresenta o mesmo clima arquitetônico antigo. O contraste entre o novo e o velho também fica evidente na Rua dos Arcos, ocupada por edificações centenárias dividindo espaço com a Fundição Progresso, convertida em casa de shows.

Um pouco de história:

E o Aqueduto da Carioca, já ouviu falar? Antes de sonharem em servir de cenário para toda essa agitação, os Arcos da Lapa foram construídos no século XVIII para funcionar como aqueduto, visando resolver o problema da falta de água na cidade. Desde 1986, operam como via para o bonde que liga o Centro ao bairro de Santa Teresa. A grandiosa construção em estilo romano é considerada a obra arquitetônica mais importante do Rio Antigo e um dos principais cartões-postais do Rio de hoje.

Na primeira metade do século XX, a Lapa já era conhecida — e marginalizada — por servir de palco para a malandragem carioca. Antes de ser valorizado por sua efervescência e multiculturalismo, o bairro era reduto de um estilo de vida pouco convencional e seus frequentadores eram tachados de “vagabundos”. Por lá viam-se cabarés, jogatinas, prostitutas, travestis, malandros e gigolôs.

É impossível falar dessa época sem citar sua figura mais emblemática: Madame Satã! O transformista João Francisco dos Santos foi um dos personagens mais representativos da vida noturna da Lapa marginal. Homossexual, delicado, talentoso e, ao mesmo tempo, um malandro violento e bom de briga. Uma vida tão intensa virou filme (assista “Madame Satã”, protagonizado por Lázaro Ramos) e merecia uma matéria só para ela.

Madame Satã

Já nos anos 50, a Lapa era a Montmartre Carioca: boêmia e erudita; famosa por sua vida cultural noturna, com célebres restaurantes e cabarés frequentados por artistas, intelectuais, políticos e representantes diplomáticos. Um resquício dessa fase é a Sala Cecília Meireles, antigo Cine Colonial, que recebe ainda hoje concertos de música de câmara.

Residiram na Lapa nomes como Machado de Assis, Carmen Miranda, Manuel Bandeira, Jorge Amado, Lima Barreto, Heitor Villa Lobos, Jorge Selarón, entre outros.

É válido mencionar que a Lapa era um dos sub-bairros do Centro, mas foi emancipada, em 2012, por razões culturais. Desde então o bairro vem sendo progressivamente resgatado pelos órgãos municipais: O Passeio Público, primeiro parque popular das Américas, foi reaberto em 2017 após passar por reformas. O Grande Hotel Bragança, edifício centenário que teve hóspedes ilustres como Noel Rosa, foi totalmente recuperado depois de décadas de abandono; transformado no 55/RIO Hotel e, posteriormente, no Hotel Selina, o edifício mescla o que há de mais moderno com um resgate ao passado.

Grande Hotel Bragança, atual Hotel Selina

Principais atrações:

Snoop Dogg e Pharrell Williams: clipe de ‘Beautiful’ gravado na Escadaria Selarón

Para quem é fã de passeios culturais, a Feira do Rio Antigo é uma boa pedida. Todo primeiro sábado do mês, a Rua do Lavradio recebe uma feira de antiguidades com produtos diversos como roupas, móveis e objetos de decoração. Sempre há exposições fotográficas e apresentações de dança pela região. Um verdadeiro sucesso, cada edição recebe cerca de 15 mil visitantes. Outra opção é a Escadaria Selarón: cenário de clipes do U2 e Snoop Dogg, os degraus foram adornados com lindas peças de cerâmica do artista plástico chileno Jorge Selarón. O visual é encantador e ótimo para tirar fotos.

Para os aficionados por shows, nada melhor do que o Circo Voador. Inaugurado em 1982 no Arpoador, o espaço foi transferido para a Lapa no mesmo ano. Bandas como Legião Urbana, Paralamas do Sucesso e Barão Vermelho deram seus primeiros passos por lá. O local também trouxe para o gosto popular artistas de gerações passadas, como Cauby Peixoto, Luiz Gonzaga e a Orquestra Tabajara com seus 15 anos de Domingueira Voadora.
O Circo também recebe shows internacionais: Franz Ferdinand, Bring Me The Horizon e Lee Perry são alguns dos nomes que já tocaram na lona da Lapa.

Circo Voador

Na Fundição Progresso, além de shows de artistas nacionais e internacionais de sucesso, são promovidos cursos nas áreas de música, teatro, circo, desenho e pintura. Outro local multifacetado é o Rio Scenarium: eleito um dos 10 melhores bares do planeta pelo jornal inglês The Guardian, o casarão do século XIX é a combinação perfeita entre casa de shows, bar e pavilhão de cultura. Destaque também para o Lapa 40 Graus, ideal para quem curte sertanejo universitário, um bom samba ou apresentações de bandas pop/rock.

Para os mais moderninhos, atenção para o Teatro Odisséia. Apesar do nome ‘teatro’, o Odisséia é uma boate onde ocorrem festas temáticas voltadas para um público mais jovem e alternativo; o indie rock, o “emo”, o pop retrô e o funk são figurinhas carimbadas por lá. Igualmente interessante, o Lapa Irish Pub é um típico pub irlandês, ideal para quem curte um bom rock e adora uma cerveja importada. Uma alternativa curiosa é o Leviano Bar: o espaço também é palco para apresentações circenses. Você pode beber e petiscar ao mesmo tempo em que aprecia espetáculos de tecido acrobático.

Por fim, para os fãs de um estilo mais tradicional, o Bar Carioca da Gema é a pedida certa: samba de raiz, chorinho, muito Cartola e Dona Ivone Lara. No Bar Semente, opção mais intimista, é certo tocarem clássicos do samba e da MPB. Há também o Asa Branca, perfeito para quem ama forró e música popular. Quer só curtir aquela cervejinha em um lugar mais simples? Sinuca da Lapa ou Bar da Cachaça. Detalhe: este último fica aberto até as 5h da manhã, perfeito para o “pós night”.

Páginas:

Relatos de Assaltos e Violências na Lapa, Bairro Fátima, Centro, adjacentes https://www.facebook.com/groups/crimesnalapa/?ref=br_rs

Centro eu amo eu cuido
https://www.facebook.com/centroeuamoeucuido/

Eventos na Lapa — RJ https://www.facebook.com/groups/1495056444052823/?ref=br_rs

Moradores do Bairro de Fátima, Lapa e Centro — RJ https://www.facebook.com/groups/1736565129951800/

--

--