a-temporal

Por Joana Andrade

FALE não se cale
Palavra Ocupada

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São seis da manhã. Toca a alvorada. Bocejos, lamentos, sono. Quanto cansaço! Comemos o pão e bebemos o café. Sobe. Desce. Faça a ronda. Bota água no feijão. Risque o quadro de giz. Escreva o texto. Já guardou sua toalha? Busque os pratos e os talheres — como resistem os talheres! O almoço está pronto! Come e lava a louça. A cantoria da cozinha calou. Faça a ronda. Confirmaram com o artista? O violão toca no jardim. Molharam as plantas? O café acabou. Faça mais. Faça mais. Faça mais. Faça um pouco mais. Faça mais. Coloca aquela do Caetano. Já discutimos isso ontem, fulano. Vá descansar. Respire. Conte até dez. Estou aqui. Estamos aqui. Trouxeram doação. Vamos lavar o banheiro. Vai mesmo embora? Ainda é cedo. É sempre cedo. Que dia é hoje mesmo? Já passa das três da tarde. Questão de ordem! Outra assembleia? Há risadas no vão. Por que tanto medo? Há medo do outro lado. Fumam maconha atrás do muro. Bebem embaixo da mesa. Dançam nos corredores. Quanta alegria! Biscoito maizena e bolo embalam a tarde e enrolam a fome. Tem mais café também. Pica a cebola. Quem é vegetariano? Esse tanto dá. Coloca pro pessoal da ronda. Leia uma poesia. Há uma crise na esquerda. Vai aguentar ficar aqui? Quanto frio! Toca um despertador. Um zíper é fechado. Fique atento. A luz queimou. Bom dia! Hoje tem oficina. Que ressaca! Vá para casa. Pode ir. A gente dá conta. Sobe. Desce. Vem! Brinca com a gente! Lutamos. Resistimos. Continuamos. São seis da manhã.

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