Quem cala consente

Por Francisca Luciana Sousa da Silva

FALE não se cale
Palavra Ocupada
2 min readNov 30, 2016

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Imagem: Café Müller, Tanztheater Wuppertal. Coreografia: Pina Bausch

Quem cala consente. Quem fala, muitas vezes, se ressente. Porque falar dói. Calar também. A questão é saber até onde ou quando a prudência não vira omissão; o silêncio, egoísmo ou covardia; o dar de ombros, irresponsabilidade. Porque, ao fim e ao cabo, todos pagam a conta, mais cedo ou mais tarde…

Eu poderia estar me ocupando de muitas coisas neste momento, e eventualmente estou — um olho na tela do computador, outro na do celular, que não para de enviar msg — ou simplesmente curtindo a desocupação de um longo período desempregada, não por vontade própria, que fique claro, mas resolvi me ocupar das ocupações. Sim, esse divisor de águas que trouxe à luz velhos problemas e ainda suscita controversas respostas.

Inúmeros debates em torno da questão são postos à baile, ainda que não OCUPEM o lugar de destaque que merecem, salvo quando algo mais grave acontece para “merecer” a atenção da chamada grande mídia… Ora, mas o que vem a ser essa tal Grande Mídia num universo plurimidiático? Sempre entendi que a palavra “mídia” era meio, ou melhor, meios, que o plural estava em seu cerne, mas que pluralidade determinadas mídias representam ou exercem para não dar voz a tantas vozes ocupadas em fazer a diferença neste momento? Se o fim justifica os meios, também há meios que decretam o fim: de conquistas, de direitos, de projetos, de sonhos.

Dizer que as ocupações são esvaziadas de sentido porque são “apenas físicas, não argumentativas”, é não reconhecer o potencial discursivo do próprio corpo. “Fazer da queda um passo de dança”, como bem registrou Sabino, sugere a potência criativa desse corpo mesmo diante da perda, da fragilidade, do cansaço e até do fracasso. Porque o corpo, também já o disseram, fala. Impossível não lembrar Pina Bausch ou Nijinsky, cujas poéticas corporais eram revoluções no palco e para além dele! E o que faz a dança senão ‘ocupar o espaço’, ou talvez ressignificá-lo? O mesmo vale para as ocupações. Não se trata de atos isolados, de desocupados que não querem estudar e atrapalham os que querem. Como conseguir estudar em meio a tanta incerteza? Como planejar o futuro diante de um quadro tão sombrio?

A juventude que faz as ocupações diz NÃO. Coletivamente, eles escrevem, desenham, pintam, bordam, cozinham, limpam, vigiam, compartilham, sonham, projetam um outro mundo possível, não o melhor que nos querem fazer acreditar: a escola, a universidade, a sociedade almejada. Por que reverberar melindres em vez de ecoar esse NÃO necessário e urgente? Por que se ater a prazos quando não há mais tempo a perder? Não é que Cazuza, mais uma vez, tinha razão: “Eu vejo o futuro repetir o passado, eu vejo um museu de grandes novidades, o tempo não pára…”.

Gota a gota a chuva cai. Ocupando podemos muito, muito mais.

#OcupaTudo

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