Absorver, transformar e compartilhar

Notas sobre design, inércia e zona de conforto.

Amilton L. Paglia
Papo de Produto

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Todos os dias somos bombardeados por uma infinidade de informações, influências e referências que, com o passar do tempo, acabam definindo nosso caráter e moldando nossa maneira de ver, pensar e viver o mundo.

Essa absorção constante de informações é que define nosso repertório cultural, e esse repertório é a força motriz que impulsiona todo o nosso potencial criativo.

Acredito que aprender design consiste inicialmente no hábito de absorver conteúdo, a fim de treinar nossos olhos a enxergar além do trivial, enxergar como um designer. Esse é um processo contínuo, infinito e extremamente prazeroso. Este vídeo da Inge Druckrey mostra bem a beleza de aprender a enxergar.

À medida que vamos nos aprofundando no universo do design e alcançamos um refinamento visual maior, aprendemos a apreciar e prestar atenção em detalhes que a maioria das pessoas não vê.

Essa nova maneira de “enxergar” o mundo se aplica a tudo. Quando você assiste um filme, é impossível não prestar atenção na fotografia, enquadramento, paleta de cores, edição e em diversos fatores que, para o grande público, acabam passando despercebidos. Um excelente exemplo é a tipografia. Uma vez que você aprofunda seu conhecimento e começa a entender a relação entre forma e contraforma, peso, ritmo, legibilidade e espaçamento, você jamais vai conseguir ler um livro, jornal ou revista sem um olhar crítico a respeito da tipografia utilizada, tamanho e estrutura das colunas de texto, e como elas ditam o fluxo que o leitor deve seguir.

When everyone has the same Mac and the same internet, the difference between hackneyed graphic design and extraordinary graphic design is just one thing — the ability to see.
Seeing, despite the name, isn’t merely visual.
— Seth Godin

A absorção e refinamento visual que vamos aprimorando com o passar dos anos é que nos proporcionam a base para fazer o que mais gostamos: criar algo que seja relevante. Quando se é um designer, é impossível não sentir aquela euforia em racionalizar toda informação, referências e conteúdo que absorvemos diariamente para traduzir tudo em algo inteligível para o público — o que é o maior desafio, já que além de aprender a ver como um designer, é preciso enxergar com os olhos do seu público. E, como já sabemos muito bem, essa missão não é nem um pouco fácil, mas é o que nos motiva a superar nossos limites e acaba se tornando um vício.

“One eye sees, the other feels.”
― Paul Klee

Em tempos em que o volume de informação produzida aumenta monstruosamente a cada segundo e a qualidade de toda essa informação não cresce na mesma medida, cabe a nós filtrar as informações que julgamos essenciais para nossas vidas e transformá-las em conhecimento, a fim de aproveitar melhor nosso precioso e finito tempo com conteúdo relevante e que nos inspire a construir algo significativo.

Nessa eterna busca por absorver toda a informação e conhecimento no menor intervalo de tempo possível, muitas vezes acabamos ficando frustrados e nos colocando em um estado de inércia, passando a maior parte do nosso tempo como espectadores dessa infinidade de informações.

Mas quando você decide utilizar seu tempo para criar algo ao invés de apenas consumir passivamente tudo ao seu redor, você desafia sua inércia, sai da sua zona de conforto e investe seu tempo em algo que irá lhe trazer uma imensa satisfação. Essa euforia que se sente quando se está criando algo relevante é extremamente gratificante e puxa você ao seu limite dia após dia.

Uma coisa muito importante que nós, designers, precisamos aprender a fazer com maior frequência é compartilhar o conhecimento uns com os outros. Quando você se reúne com um grupo de pessoas que têm conhecimentos complementares ao seu e todos trazem pontos de vista com o objetivo único de evoluir intelectualmente, grande parte dessa frustração e sensação de estagnação que sentimos diante de tanto conhecimento que existe para ser desbravado desaparece, e você recupera o fôlego para ir mais longe.

Saber administrar um ritmo e equilíbrio saudáveis entre absorver conteúdo relevante, transformar em algo de valor, e compartilhar/aprender com pessoas que estão ao redor é o meu desafio mais importante hoje, e nada melhor que um desafio para instigar as pessoas a irem além.

If you can’t explain it simply, you don’t understand it well enough.
— Albert Einstein

Este texto tem dois grandes objetivos pra mim: o primeiro é tentar racionalizar todo esse caos de informações e pensamentos da minha cabeça e transformar em algo de valor, que seja útil. Por mais que eu tenha focado muito em Design, acredito que essa insatisfação e busca constante por conhecimento se aplica a qualquer área, e que mais pessoas podem se identificar.

Meu segundo objetivo é sair da minha zona de conforto e simplesmente escrever. Algo que parece muito simples para a maioria das pessoas, mas que para mim, infelizmente, não é. É uma tentativa de criar coragem para expressar tudo que estou aprendendo em palavras ao invés de pixels. Espero que esse seja o primeiro de muitos que estão por vir.

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Amilton L. Paglia
Papo de Produto

Director of Product & Design @ olist. Passionate about product strategy, user experience, design systems, and creative usages of technology. amiltonpaglia.com