Concorrência Criativa e o crime da inclusão

Qual é o limite entre exigir o merecido reconhecimento, e a crítica desmedida?

Rodrigo Martins
Papo de Produto

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“Mãeee, já sei o que eu quero ser quando crescer: Vou ser designer……não mãe, não vou passar fome…….NÃO mãe, não é só desenhozinho….”

Talvez com você não tenha sido exatamente desse jeito, mas tenho certeza que, se você é um designer, já passou por essa situação.

Desde o começo aprendemos que ser designer não é para os fracos, até 2013 qualquer um podia se dizer designer, independente de curso superior, profissionalizante, cursinho da SOS Computadores ou revista de tutorial de Photoshop da banca da esquina. Tem até designer de sobrancelhas, imagine você.

O mercado é saturado, e apesar da regulamentação, ainda disputamos espaço com “profissionais” sem formação especifica na área.

Apesar disso, e falando especificamente de Brasil, podemos perceber que o designer ganhou mais espaço, levando em conta o crescimento da industria criativa. Agora, conseguimos ir além do mercado tradicional. O design se apresenta como diferencial estratégico, pegando carona no hype da inovação e no fenômeno das Startups!

Ta melhor, mas longe do ideal.

Se você é um designer pré-internet(não é o meu caso), você percebe o quanto esse marco tecnológico mudou a nossa vida, pra melhor e pra pior.

O acesso indiscriminado a informação, fez com que o conhecimento se disseminasse de forma exponencial. Um lado positivo disso, a facilidade de acesso a outras culturas e pensamentos, o que nos enriquece como profissionais, abrange nossas possibilidades e nos conecta com pessoas que pensam igual. Passamos a ter uma voz, como um conjunto temos mais força para criar e moldar a cultura do design como profissão.

Um lado negativo, qualquer pessoa, se dedicada o suficiente, pode aprender a parte técnica. Mesmo sem a teoria, se você aprende a usar as ferramentas, imediatamente você se abre a um mundo de possibilidades. Tem gente que se aprofunda, tem gente que se mantém superficial.

Daí saem micreiros, “sobrinhos”, quebra-galhos, a lista é longa.

Eu faço “designer”.

Nós, como comunidade, somos reativos a qualquer coisa que julgamos como ameaça. Depois de anos lutando pela valorização e devido reconhecimento, é difícil aceitar quem tomou o caminho fácil, ou pior, quem não paga o que achamos que merecemos.

Todo designer, freelancers acima de tudo, tem como tarefa diária a defesa de suas idéias e projetos, tudo embasado em conceitos e longos estudos, afinal, o design não é só a cereja do bolo, certo?

Em um mundo ideal entregamos o melhor trabalho o possível, de acordo com nosso critério, e cobramos o que achamos justo por isso. Mas isso raramente bate com as expectativas do cliente. Nosso preço justo fica muito caro, prazo muito longo e acaba que o resultado final não está no tom de azul bebê que o cliente queria. INFERNO!

O cliente quer o que quer, e pelo preço que quer. Nem sempre conseguimos convence-lo que nossa idéia é melhor, ou que o que propomos vai funcionar melhor.

E é nesse ambiente confuso que o micreiro prospera e prolifera. Ele faz rápido, exatamente o que o cliente quer(as vezes fica bom), e o melhor: por um preço acessível.

Designer ou cliente, quem tem razão?

Galera, sejamos francos, ninguém é obrigado a pagar o que a gente quer. Sendo justo ou não, sempre tem alguém que vai fazer o que você não quer.

O “Manuel da Padaria” nunca vai pagar R$ 2.000,00 por um logo. Assim como o Manuel, existem milhões de clientes que não precisam de uma super identidade visual. Na maioria das vezes basta ser bonito que ta bom. Até porque se eles soubessem como, faziam eles mesmos.

Admitir que “basta ser bonito que está bom” é uma dor para o designer, eu sei, já passei por isso e você também!

“WeDo what you won’t”

Aproveitando um GAP de mercado, surgem os sites de concorrência criativa. Plataformas online que fazem o link entre designers procurando jobs e clientes procurando por designers.

Legal né?

Uma vez cadastrado, o cliente cria seu briefing, passa suas referências, e diz o quanto pagará pelo projeto. O designer por sua vez, apresenta seu projeto em concursos, abertos ou fechados, e faz mudanças de acordo com o desejo do cliente. No final do processo, uma arte é escolhida e o designer premiado com o valor previamente estipulado.

E os xiitas vão a loucura. “Absurdo, blasfêmia!”

No começo foi um frenesi louco, multidões de designers indo as ruas(Facebook) exigindo sangue, JUSTIÇA! E eu me incluo nesse grupo, estava lá na luta(sofá), exigindo meus direitos: Como assim um site onde o cliente posta o job e ainda DIZ O QUANTO QUER PAGAR??? Virou bagunça.

“Um designer que se preze não se sujeita a isso.”

Justo, concordo. Mas tem uma galera que topa. E no final das contas quem lucra é o cliente, que recebe o que queria.

O designer e sua soberba

Em algum momento, perdemos o foco sobre o que mais importava. Nós prestamos um serviço, se o cliente acha seu valor caro, então ele não é seu cliente, é de outro.

A concorrência criativa não rouba nosso trabalho, muito menos prostitui a profissão. Você designer escolhe seu cliente tanto quanto ele te escolhe. Existem vários tipos de clientes com necessidades diferentes e específicas, e pessoas para atendê-los. Qual é o problema ai?

Em que momento o design virou algo extremamente exclusivo? Porque somente nós, a elite diplomada, podemos escolher quem é digno de nossa atenção e nossos serviços?

Sim, nós somos caros, e sim temos motivos para ser. Entendemos que o design vai muito além do visual. Nos distanciamos dos “sobrinhos” nos posicionando como inovadores, empreendedores.

Mas o que falta entender é que muita gente simplesmente não precisa disso. Se queremos democratizar o design, precisamos pensar em soluções mais simples, baratas. O design precisa ser inclusivo.

Mal comparando, o que a concorrência criativa faz é parecido com a proposta da IKEA. Claro, nem tudo tem qualidade, mas tem que começar por algum lugar certo?

O Manuel não pode ter um logo maneiro só porque não quer pagar o seu preço? Deixa alguém que cobre mais barato fazer.

Chega do estigma de designer reclamão, mal compreendido.

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Rodrigo Martins
Papo de Produto

Product Designer, Bookworm, Awesome Photographer(not), Brazilian and a great dude!