Me desculpe por te chamar de linda
Uma reflexão após Dua Lipa.
Sejamos sinceros aqui. Quando vocês olham uma mulher que vocês admiram, qual o primeiro elogio que lhe vem a mente? Exato. Na diversidade de palavras que destacam as proeminências daquele ser, seus atributos e qualidades, a primeira coisa da qual distacamos é sua beleza.
“Como você está bonita hoje!”
“Claro que você vai conseguir, você é linda”
“Você é linda, inteligente e especial!”
Todo mundo ja usou esse combo ao parabenizar uma mulher. Inclusive eu. Aprendemos a valorizar o corpo feminino como se este foste uma das qualidades de ser mulher. Sendo o caso de as vezes nem acharmos a tão bela, mas usarmos o “linda” como elogio.
Quantos homens você chamou de lindo após ele conquistar algo? Talvez se você for uma mãe toda orgulhosa de seu rebento o adjetivo surja automaticamente em sua língua. Quais artistas homens você primeiro percebeu a beleza, antes de notar sua atuação? Você ja deu parabéns a um amigo homem dizendo que ele era lindo, antes de falar o resto?
Este questionamento me bombardeou após dois momentos. O primeiro, um texto incrível da escritora Rupi Kaur, em seu livro “Outros Jeitos De Usar A Boca”. Apenas leia:
“Quero pedir desculpa a todas as mulheres que descrevi como bonitas antes de dizer inteligentes ou corajosas. Fico triste por ter falado como se algo tão simples como aquilo que nasceu com você, fosse seu maior orgulho, quando seu espírito já despedaçou montanhas. De agora em diante vou dizer coisas como, “você é forte” ou, “você é incrível!”, não porque eu não te ache bonita, mas porque você é muito mais do que isso.”
Se isto não foi suficiente para eu avaliar minhas ações eu cheguei a outro ápice, quando a incrível (notem a mudança no elogio) Dua Lipa lançou seu clipe “IDGAF”. Eu conheci a cantora quando ela lançou “Blow Your Mind”. Eu descrevia ela as pessoas como “a modelo que largou a carreira para ser cantora, olha que raiva, ela além de bonita canta bem”. Sim, eu me arrependo de tal constatação.
Depois disso Dua chegou com suas novas regras. “New Rules” com certeza foi um ar fresco na música pop, trazendo um hino de empoderamento e ensinando as meninas a se amarem mais. E mais uma vez, já fã da cantora eu descrevia ela como linda, antes de listar outras qualidades.
A coisa toda mudou com o clipe de “IDGAF”. Após terminar o clipe eu parei e pensei que reduzir Dua Lipa a mulher linda não valorizava o que ela vem fazendo a música. Ela vem pavimentando uma carreira sólida, com ritmos deliciosos e letras marcantes. Seus clipes transbordam criatividade e qualidade técnica. E eu só conseguia ver sua beleza.
Eu peço desculpas, não apenas a Dua, mas a todas as mulheres, famosas ou cotidianas, que eu chamei de linda antes mesmo que dizer outro elogio. E convido homens a fazer o mesmo. Ser belo não é um problema, mas evidenciar isto acima de tudo diminui tudo que a pessoa alcançou. Aparência é algo com que você nasce, mas caráter, talento, habilidades são construídas. Valorize alguém pelo que ele é e faz, e não apenas pelo que você vê quando bate o olho.
Se imagine por um momento ter o esforço de elaborar algo, de conquistar um mérito, e a primeira coisa que você ouve é o quanto você é lindo. Se você não venceu um concurso de beleza, sua aparência nada ajudou nas suas conquistas, e perceber apenas isto é como se a outra pessoa não ligasse realmente para aquilo que você conseguiu. Pois bem, meu caro, é assim que as pessoas se sentem.
A partir de hoje usarei o termo “linda” para coisas inanimadas, ou se usar para pessoas, será depois de evidenciar o melhor dela.
A vida é um conjunto de parábolas. Cada curva é uma surpresa.
