Aplicativos de mobilidade podem melhorar serviços públicos

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Para onde vamos?
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6 min readJan 27, 2019

Veja como parcerias entre empresas e poder público já estão aprimorando serviços prestados à população

Passageiros na plataforma da estação Brás, em São Paulo (Foto: Shutterstock)

Em variadas ocasiões publicamos aqui no @paraondevamos artigos sobre os impactos positivos dos aplicativos de intermediação de transporte nos centros urbanos, inclusive sobre os benefícios socioeconômicos mensurados por um detalhado estudo da Fipe.

Dessa vez, vamos tratar de como empresas de transporte sob demanda podem melhorar a mobilidade urbana e a vida das pessoas por meio de parcerias com o setor público, e como isso está acontecendo em diferentes regiões dos Estados Unidos.

Parcerias no Brasil

A tendência de substituição da frota de carros dos servidores públicos pelo serviço de intermediação de transporte, observada já há pouco mais de dois anos em cidades brasileiras, gerou eficiência econômica ao poder público. O sistema ajuda a fiscalizar o serviço e possibilita que os governos eliminem gastos como manutenção dos veículos e abastecimento dos veículos.

Em São Bernardo do Campo, cidade da Região Metropolitana, por exemplo, a Prefeitura estima uma economia de R$ 5 milhões anuais após a contratação da 99, por licitação, para oferecer transporte sob demanda aos funcionários públicos.

Outro tipo de parceria benéfica à cidade que a 99 protagonizou foi o projeto realizado com o MetrôRio, em que se desenvolveu um cartão especial para os moradores do Rio de Janeiro usarem com cinco viagens de metrô mais um desconto de R$ 4 para cinco corridas com a 99.

A ação estimulou a complementaridade entre os diferentes modais e tornou a vida dos usuários mais prática, já que os usuários precisavam de apenas um cartão tanto para pagar a viagem da 99 como do Metrô.

Iniciativas nos EUA

Programas desse tipo, que criam uma relação ganha-ganha-ganha, com benefícios à administração pública, à empresa e aos cidadãos, têm sido estabelecidos nos Estados Unidos com cada vez mais frequência.

Dezenas de agências de transporte — como mostra o mapa abaixo, elaborado pelo site New Geography — já realizaram parcerias com aplicativos de mobilidade para reduzir custos, suprir algum serviço deficiente ou aprimorar determinada política pública.

Em Charlotte, na Carolina do Norte e em Summit, no estado de Nova Jersey, houve aumento de passageiros em novas linhas municipais de trem assim como diminuição da demanda por estacionamentos, depois que as agências de transportes dessas cidades ofereceram subsídios a corridas por aplicativos para determinadas estações.

Já em Boston, em Massachusetts, a agência de transportes municipal oferece descontos para pessoas portadoras de necessidades especiais usarem transporte sob demanda ao invés de utilizar apenas as vans do serviço público de atendimento para fazer os deslocamentos que precisam.

Este foi um dos primeiros programas nos Estados Unidos a integrar aplicativos de mobilidade a um serviço público. E a avaliação é que o projeto é positivo tanto para os usuários como para a administração pública, como conta Diogo Lousa, gerente de inovação na Agência de Transportes de Massachusetts.

“As viagens com nossas vans de atendimento têm que ser agendadas com 24 horas de antecedência. Então, o grande benefício é passar a oferecer aos portadores de necessidades especiais um serviço que é sob demanda. Isso dá mais agilidade aos clientes. Ao mesmo tempo, a agência de transportes tem redução de custos, devido à diferença de gastos entre uma viagem na van de atendimento e uma viagem no transporte por aplicativo. Vale lembrar que a melhora no serviço pode gerar um aumento na demanda por viagens — fato este que deve ser equilibrado com a redução de custos para o sucesso financeiro do programa”, diz.

Nas pequenas cidades californianas de San Clemente e Dublin, as agências de transporte também decidiram subsidiar corridas por aplicativos. No primeiro caso, o desconto é concedido aos passageiros de bairros onde linhas de ônibus foram desativadas; e, no caso de Dublin, todas as corridas por aplicativo, desde que comecem e terminem no território municipal, têm 50% de subsídio da agência de transporte. Trata-se de projeto pilotos para testar os aplicativos como substituição às linhas de ônibus, que, nestas pequenas cidades, carregam poucos passageiros.

Evidentemente, ao realizar essas parcerias, o poder público deve estar extremamente cuidadoso com a proteção dos dados dos usuários. A Lei Geral de Proteção de Dados, sancionada em agosto e prevista para entrar em vigor no ano que vem, define como dado pessoal qualquer informação que identifique diretamente ou torne identificável uma pessoa natural e estabelece de modo claro as responsabilidades e penalidades no âmbito civil dos entes envolvidos no tratamento de dados.

Para Lousa, da Agência de Transportes de Boston, o volume de dados compartilhados entre as duas partes deve ser o menor possível.

“O compartilhamento de dados é uma parte necessária ao sucesso das parcerias, porém, na nossa visão, não se deve compartilhar dados só por compartilhar dados. Se não se sabe qual vai ser o uso final de determinado dado, não tem razão de exigir o compartilhamento. Até porque quando você está armazenando informações digitais de um parceiro, você se torna responsável por proteger aqueles dados também. Têm que absorver apenas aquelas informações que vão ser úteis, que farão parte de uma análise ”, afirma.

Integração de Pagamento

O entendimento quanto a compartilhamento de dados é essencial para as parcerias entre governos e empresas darem um passo adiante em direção à integração dos serviços, que, ao que tudo indica, incluirá incorporação de meios de pagamento. A sinergia nos modos de pagar tarifas vai levar ainda mais facilidade aos usuários e impulsionar a combinação de diferentes modais de transporte, como já acontece nos locais onde há um esboço desse tipo de integração.

Na França, o cartão ‘Navigo’ permite, desde 2017, que o usuário pague tarifas de variados modais — de metrô a bikes compartilhadas -, porém, todos públicos. Falta no rol de serviços involucrados no mesmo bilhete justamente a integração com empresas privadas, para incluir serviços como ride-sharing e de microbilidade.

O mesmo acontece com o sistema de Munique, na Alemanha. A cidade oferece, no aplicativo da agência de transportes (MVG), tanto o planejamento de itinerário e a previsão de horários como o pagamento digital de todos os modais públicos (ônibus, metrô, trem urbano, ônibus intermunicipal e trens regional). No entanto, não integra companhias privadas de mobilidade no serviço.

O novo sistema automatizado de pagamento de tarifas que está sendo desenvolvido pela Agência de Transportes de Boston, em tese, vai permitir a integração, inclusive, com atores do setor privado. O “Automated Fare Collection 2.0”, previsto para ficar pronto no ano que vem, possibilitará pagamentos por celular, sem necessidade de cartão de crédito e permitir a integração com outros tipos de modal da cidade.

“Com essa integração, você oferece maior flexibilidade para o cliente, que é o nosso objetivo final. Você quer prestar um serviço de qualidade e confiável e que a pessoa tome as decisões de acordo com suas prioridades. Se esse tipo de integração ocorrer, a gente consegue deixar o passageiro escolher, entre os diversos modos, qual é a melhor opção para sua viagem”, afirma Lousa sobre o AFC 2.0.

O futuro aponta, de fato, para uma consolidação da multimodalidade nas cidades, num cenário em que as plataformas digitais (seja do setor privado ou público) reunirão diversos modais e os usuários conseguirão comparar tempo, distância e custo das diferentes alternativas de transporte e escolher a mais adequada para ele — inclusive com a opção de combinar mais de um modal para se deslocar.

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