Marcas permanentes: as cicatrizes nos corpos femininos violados

Mulheres vítimas de abuso sexual lutam contra as políticas inescrupulosas do Estado feminicida

Victoria Gearini
Paradoxos
3 min readOct 13, 2020

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Por Gabriel Ferreira, Mariana Alves e Victória Gearini

“Alguém precisa contar da outra parte, doutor, as mulheres abusadas nas trincheiras e nos viadutos não estão nos livros de história, os ditadores sim todos em itens numa longa biografia”. Esta passagem de “O Peso do Pássaro Morto”, romance de Aline Bei, explica nitidamente as agruras vividas pelas vítimas de abuso sexual. Passado, presente e futuro, ciclos que se repetem. Na contemporaneidade, mesmo com os registros midiáticos, a impunidade segue efervescente.

Modelo promissora, Mari Ferrer teve seus sonhos dilacerados. Abusada sexualmente, a jovem viu sua vida mudar por completo, no dia 16 de dezembro de 2018. Dois anos depois, ela segue sendo violada, desta vez, pelo Estado feminicida.

Crédito: Divulgação / Pixabay

Vítima da cultura do estupro, a jovem de 23 anos teve seu corpo invadido e sua alma dilacerada. O vazio tomou conta de cada parte de seu corpo, até desenvolver síndrome do pânico. Dia após dia, noites incansáveis e medo constante, esta é a realidade de uma vítima de estupro.

Cadê o Estado para proteger os corpos femininos? Cadê a Justiça? Ambos poderes negligenciaram Mari Ferrer. Mais uma vez a jovem foi vítima, desta vez, de uma política inescrupulosa e misógina.

Homens cis, brancos e héteros seguem isentos das violações dos corpos femininos. André de Camargo Aranha estuprou Mari Ferrer. Já o Estado, esse se omitiu e legitimou a violência. E não foi só “denunciar”. A Justiça perpetua um sistema opressor, vinculado à cultura do estupro, conhecido como machismo institucional.

A institucionalização do machismo é uma das práticas mais antigas de perpetuar o feminicídio. As leis brasileiras são retrógradas e beneficiam os homens pertencentes a uma classe privilegiada. As vítimas de estupro e violência doméstica não encontram amparo da Justiça, uma vez queVazio as leis não as protegem. Um caso de visibilidade, como o de Mari Ferrer foi deslegitimado, o que se esperar dos outros não noticiados?

Do outro lado do país, uma menina de 10 anos tinha sua infância roubada. Silêncio e escuridão chegam até para almas mais puras e inocentes. Desde os seis anos, a jovem não identificada, era abusada pelo seu próprio tio, em São Mateus no Espírito Santo.

Grávida aos 10 anos, a garota implorou para tirar de seu corpo o fruto de seu estupro. Mais uma vez a sociedade falhou. Mais uma vez um corpo feminino foi violado e a vítima culpabilizada. Religião. Estado. Justiça. Todos atrelados a um sistema opressor e misógino, que se acovardam diariamente.

De um lado Mari Ferrer, de outro uma menina de 10 anos. Ambas vítimas de um sistema feminicida. Reféns do Estado e do fundamentalismo religioso. Não importa a idade, classe, raça ou religião. As marcas do estupro, o vazio do momento, permaneceram em suas vidas. Enquanto isso, o Estado segue falhando com as vítimas. Por outro lado, a revolução feminina emerge contra este sistema.

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