Os devaneios de David Lynch
Com um mix de complexidade, criatividade e fantasia presentes em suas obras, o diretor aguça o inconsciente de seus espectadores
Por Gustavo Kolonko, Izabel Rodrigues e Luana Figueiredo
Ainda que suas obras sejam apresentadas até os dias de hoje, os projetos fantasiosos de David Lynch não são os mais populares do momento. Diretor de filmes como Eraserhead, O Homem Elefante, Duna e Cidade dos Sonhos, não é preciso dizer que seus trabalhos são clássicos intocáveis da sétima arte e que, mesmo com a falta de criatividade que assola Hollywood atualmente, poucos são os diretores que se aventurariam a produzir uma nova versão de seus títulos.
Fora seus longas-metragens, um marco do diretor que foge dos padrões é Twin Peaks, série lançada em 1990, ambientada em uma pequena cidade no estado americano de Washington, onde seus moradores têm uma dúvida: quem matou Laura Palmer? Com essa premissa, o agente Dale Cooper, interpretado por Kyle MacLachlan, é enviado à cidade para solucionar o caso, e durante os 28 episódios exibidos na década de 90 o personagem se viu cada vez mais imerso na vida dos residentes misteriosos.
Entre gigantes, caolhos, serial-killers e a incomparável Mulher do Tronco, a trama vai muito além de seus personagens, com locais adicionando um ar ainda mais enigmático para o seriado. Apesar do café Double R e o bordel One Eyed Jack aparecerem com frequência, é após entrar no Black Lodge e chegar na Sala Vermelha que Cooper é levado para outra dimensão, um lugar onde o tempo corre ao contrário.
Acompanhado de um anão que fala e se move de trás para frente, e que mais tarde se transforma em uma árvore, é na Sala Vermelha que David Lynch explora o mundo dos sonhos. Ele também traz traços do inconsciente presente em seus trabalhos passados, e que seria sua marca registrada com o lançamento de Cidade dos Sonhos, dez anos depois.
Com canções de jazz, cortinas de veludo e longas cenas que parecem não ter sentido algum, os dois projetos remetem a cidades enigmáticas onde seus personagens parecem não conseguir sair da realidade em que vivem. É o caso de Betty Elms (Naomi Watts em Cidade dos Sonhos), que se vê perdida em meio aos acontecimentos que a cercam em Los Angeles, e Dale Cooper, que mesmo solucionando o assassinatado de Laura Palmer continua preso na atmosfera de Twin Peaks. Mesmo que as duas obras terminem de maneiras diferentes, elas partilham a paixão do diretor pelo imaginário e subconsciente humano.
Ainda que fora de cena há alguns anos, com seu último lançamento sendo o curta What Did Jack Do?, disponível na Netflix, Lynch é mestre na hora de contar histórias únicas e que não são parecidas com nada, e que, na nossa opinião, são a melhor maneira de responder o que é um sonho.
