Quem será o próximo herói de nossa Pátria Amada?

Amanda Sampaio
Paradoxos
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6 min readNov 12, 2017

Por Larissa Alves e Amanda Sampaio

Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas

O Brasil tem passado por um momento delicado para sua maturidade política e econômica. No ano de 2015 e 2016, os brasileiros enfrentaram uma de suas maiores crises financeiras e políticas, culminando no impeachment de Dilma Rousseff, no começo de seu segundo mandato. Essa situação levantou diversas discussões e fez com que as pessoas começassem a dar mais atenção para a política, talvez não de uma forma completamente racional, mas tivemos o que se poderia chamar de aproximação passional de um partido. Esse fato se deu porque muitas pessoas passaram a ter um ódio mortal do PT (Partido dos Trabalhadores), ao depositar toda a responsabilidade da crise do país apenas em um partido, enquanto outros se aproximaram do “partido rival” por acreditarem que de alguma forma ele poderia reverter toda a situação causada pelo PT.

Esta situação causou uma disputa muito parecida com o que vemos dentro dos estádios de futebol, onde os torcedores são movidos pela emoção e não pela racionalidade. O mesmo aconteceu na política, em que há muito tempo já se tinha essa rivalidade entre dois dos principais partidos brasileiros, PT e PSDB, mas, com toda a efervescência do final de 2016, juntamente com o apoio da mídia, o Brasil se encontrou altamente polarizado. O que muitos não sabiam, ou muitas vezes não pararam para pensar, é que esses dois partidos têm uma ideologia muito próxima, pois nenhum deles representa fielmente a esquerda e nem a direita como base de sua ideologia e, no passado, eles quase formaram um único partido.

O Partido dos Trabalhadores, que era esperado que representasse uma ideologia mais “de esquerda”, voltado para a solução de problemas de distribuição de renda, governou o Brasil por 13 anos. A Era PT começou com Luís Inácio Lula da Silva, que se tornou um dos presidentes mais populares do Brasil. Sob seu governo, o Brasil testemunhou um de seus maiores crescimentos econômicos.

Lula também implementou um programa assistencialista conhecido como Bolsa Família, que paga mensalmente valores em reais para famílias pobres que atendem critérios pré-estabelecidos. O PT atribui a esse programa a responsabilidade por tirar milhões de brasileiros da pobreza. O que muito não se sabe é que na verdade muitas dessas políticas foram iniciadas no governo anterior de Fernando Henrique Cardoso (FHC), que foi o líder do PSDB, o tal rival do PT.

Uma coisa muito instigante é que os brasileiros buscam, freneticamente, representantes que sejam herois, figuras emblemáticas, carismáticas, aquele salvador da pátria que realmente se importa com o indivíduo e luta por cada um de nós. Isso dificulta muito que escolhamos racionalmente nossos representantes, porque impede que as pessoas analisem direito o plano de governo de cada figura que tenta a Presidência, pois essa característica é deixada de lado caso os eleitores não simpatizem com o candidato.

Esse “problema” se iniciou lá atrás com Getúlio Vargas, que foi uma era marcada pelo populismo, nacionalismo, e pela industrialização estimulada pelo governo, que acabou levando a um período de ditadura. A era Vargas começou em 1930, depois de um golpe de estado que acabou com a oligarquia dos produtores de café do estado de São Paulo e Minas Gerais

De acordo com Friedrich August Von Hayek, um dos grandes defensores da Escola Austríaca de economia, um planejamento central se transformaria em uma instituição moral que imporia sua visão aos cidadãos. Isso aconteceu na era Vargas. Ele queria criar uma identidade nacional, investindo massivamente em propagandas nacionalistas e em políticas populistas. Então, ele impôs sua ditadura em 1937, que durou até 1945.

Vargas ficou conhecido como o pai dos pobres por ter feito grandes mudanças para melhorar as condições de trabalho da época, e até hoje muitas pessoas o defendem e sentem falta dele, mesmo ele tendo sido altamente manipulador e estrategista salafrário, até mesmo quando se suicidou, e também mesmo com todas as atrocidades que ele fez no período da ditadura do Estado Novo. O fato é: ele era uma figura carismática, um líder nato, o povo o adorava, muita gente ainda o adora e parece estar cegas por colocarem-no em um patamar de herói. Qualquer semelhança com o que acontece nos dias atuais com Lula é mera semelhança, não é mesmo? Mesmo tendo sido acusado, condenado, com milhares de provas que o incriminam e o associam aos dois grandes casos de corrupção do Brasil, Lula ainda é o herói de muita gente.

Entretanto, a Era Vargas não foi a última vez que uma ditadura se instauraria no Brasil. Propaganda nacionalista, intervenções estatais na economia e a subsequente perda de liberdade individual marcou o período de governo militar de 1964 a 1985.

A figura do salvador da pátria também entrou em cena nesse período e acabou por fazer com que muitas pessoas, até hoje, defendam o regime militar, por acreditarem que estavam sendo salvas de uma iminente revolução socialista, quando os militares se apresentaram como uma resposta à ameaça de uma revolução socialista no Brasil, como aconteceu em Cuba alguns anos antes, e também devido ao crescimento rápido da economia na época, período conhecido como “milagre econômico”.

A discussão política no Brasil geralmente fica em torno de uma discussão sobre partidos, onde as pessoas tentam decidir qual é o melhor (ou o menos pior). Na verdade, durante a história do Brasil, o líder político em si é mais importante que o partido. A discussão política geralmente acontece de forma técnica e nos valores pessoais dos líderes. Pouco espaço existe para uma discussão filosófica em relação ao papel do Estado, que é um problema central.

O que acontece no Brasil hoje é uma cegueira geral. As pessoas não conseguem ver além daquilo que lhes são impostas. A questão é que na política não existe conflitos ideológicos de esquerda e direita, até porque atualmente é praticamente impossível categorizar um partido fielmente atrelado a uma única ideologia, mas o que acontece é uma guerra de ego, quem tem mais poder e quem pode mais do que o outro. Há tempos que ser presidente significa fazer com que o país atenda aos seus próprios interesses além de mero status e muito dinheiro no bolso.

Assim como Rodrigo da Silva expõe em seu artigo sobre as sobre as 10 coisas que você não sabia sobre a relação entre PT e PSDB, Eduardo Suplicy declara que Lula e FHC não conseguiriam permanecer no mesmo partido, pois um não se submeteria à liderança do outro, mesmo que concordassem em várias partes e discordassem em tantas outras, o que estava em questão era quem seria o “chefão”, e disso nenhum dos dois queria abrir mão.

Quando, em 1993, houve o plebiscito sobre se o Brasil teria um regime parlamentarista ou presidencialista, por meio de uma determinação constitucional de 1988, logo após a abertura política, no fim da ditadura militar, as pessoas acabaram por votar não ao parlamentarismo. Mas era óbvio que aqueles que queriam se candidatar à Presidência não concordariam com um regime parlamentar em que a figura do presidente fica mais “apagada” com menos autonomia para agir e menos autoridade frente às decisões do país.

O fato é que o que sempre esteve em questão foi a vontade de deter o poder, jogo de ego, pois naquele período de redemocratização todos queriam ser presidente; então, não se teve uma tentativa de fazer com que o povo entendesse a fundo sobre os dois regimes e pudesse escolher com propriedade. Um exemplo disso foi o que aconteceu com o próprio João Goulart, que para tomar posse da Presidência, lhe foi imposto pelo Congresso que ele viesse governar em um regime parlamentar, pois, com medo de uma ameaça comunista que talvez nem fosse provável naquele momento, a oposição diminuiu o poder do presidente.

Olhando a política brasileira de uma forma analítica, é possível notar que os governos que interferiram massivamente na economia acabaram implementando algum tipo de ditadura. Mas na situação atual, apesar de não termos uma ditadura, existe uma massiva subversão do Estado de direito que tem abalado o país com diversos casos de corrupção, com praticamente todos os partidos políticos envolvidos, onde fica claro que as intervenções na economia acabaram atendendo aos interesses de poucos, diferente daquilo que a ideologia intervencionista prega.

Com toda essa história, é tempo dos cidadãos brasileiros não apenas se questionarem a respeito da qualidade dos partidos e dos políticos em questão, mas sim da própria ideia do grande poder do Estado, visto que infelizmente o verdadeiro motivo que move os governantes do Brasil é a detenção de poder para satisfazer seus próprios interesses e, na maioria dos casos, manipulando as pessoas a acreditarem na figura do herói salvador da pátria, enquanto este sai com os bolsos cheios de dinheiro ao mesmo tempo em que o país enfrenta as fortes consequências de uma crise econômica. Uma visão mais analítica dos fatos será muito útil para o debate político de 2018.

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