Se eu me vejo debaixo d´agua,
é por causa do deserto que é uma pergunta sem respostas. Essas tantas possibilidades que me surgem quando transbordo, procurando quem é você dentro de mim. Tô submerso, à tua procura. Como é vasto o mar, o outro. Debaixo das pedras, por entre os corais, no meio dos cardumes de peixes. Onde é que você se camufla?
Pouco tempo atrás você tava aqui, contorno bem definido. Sinto falta disso. Eu abri a boca por um instante, enchi a vista de bolhas e tudo ficou insidioso. Você sumiu. Tem noção de como o fundo do mar é desesperador sozinho? Às vezes a pressão é tanta que eu preciso gritar. Abro a boca e sou rapidamente atacado pela água. Bolhas de novo. Vão e vem. E você, nada. E eu, continuo nadando.
Eu sei, preciso respirar. Lembrar quem eu sou, onde eu tô. Porque aí, eu tenho certeza, o tempo te traz, te desvenda. Mas o tempo que cura é também cruel. Já dizia meu pai: a diferença entre o veneno e o remédio é a dose. Sem a devida paciência, os ponteiros avançam como predadores. Eu tô sempre nessa linha, nesse cabo de guerra, controlando a esperança de te achar, sem me empolgar demais e sem perder a razão. Sem relaxar, sem pressa.
Mas o que me assusta é pensar que, mesmo que eu te encontre, eu não sei se a gente vai poder nadar junto de novo. E se, na verdade, você não tiver se perdido, mas só ido caminhar sozinha? Me da uma tristeza, bate um pavor. E bate a dúvida de se quero tanto assim te encontrar. Fico com raiva, desejo seu mal. Que tenha se afogado. Devorada por tubarões. Desculpa.
Quase abro a boca de novo. Vou até a superfície, tô precisando. O ar e a luz são violentos. Fico um pouco ali, amansando. Inspiro. Expiro. Desço de novo.
Uma hora a gente se acha, né.