Guerrilha Processual Penal: uma explicação

Rubens R R Casara
Passagens
Published in
4 min readMar 23, 2017
Banksy

Um espectro ronda os tribunais e instituições jurídicas do Brasil — o espectro da Guerrilha Processual Penal. Desde que anunciado o curso de guerrilha processual na Passagens — Escola de Filosofia, os defensores de posições autoritárias, os que odeiam os direitos fundamentais e os que tem medo da liberdade, os que se refugiam no “vazio do pensamento” e os que compactuam das ideologias totalitárias, os juízes inquisidores e os acusadores de orientação fascista, mostram-se preocupados.

Duas conclusões de impõem.

A Guerrilha Processual Penal já é percebida como um obstáculo às perversões inquisitoriais e às tentações autoritárias.

A mera reação, por vezes agressiva, ao curso já o justifica. Há muito o que mudar no Sistema de Justiça Criminal e não se pode abrir mão de qualquer estratégia que sirva à concretização de direitos fundamentais e obstáculo à opressão.

A história do processo penal no Brasil até os nossos dias sempre foi a história do exercício do poder penal, do poder de impor sofrimento a quem se afirma ter violado uma norma penal, sem controles rígidos e democráticos. Com frequência, o fato concreto que se quer punir acaba deixado de lado e o poder penal passa a ser utilizado como forma de controle social ou mesmo de eliminação daqueles que são considerados indesejados pelos detentores do poder político e do poder econômico (e, não raro, os detentores do poder político e do poder econômico se confundem) na sociedade brasileira.

As práticas condicionadas pela ideologia do “Direito Penal do Inimigo” demonstram que foi declarada uma guerra contra parcela da população. Transformam-se meros suspeitos e acusados em inimigos, em pessoas a quem não se deve reconhecer direitos. Muitos desses inimigos são inocentes que não terão possibilidade de fugir da persecução penal. O inimigo, como percebeu Raul Zaffaroni, é tratado como um “não-cidadão”, o que facilita a naturalização com que direitos e garantias fundamentais (e, portanto, direitos e garantias de todos, acusados ou não, inocentes ou não) são afastados.

Trata-se de uma guerra desigual, na qual o opressor conta com a estrutura do Estado e da grande maioria dos meios de comunicação de massa que vendem a violência como o remédio para os mais variados problemas da sociedade. Diante dessa guerra assimétrica, declarada por agentes do Estado afastados do ideal democrático de contenção do poder, a resistência democrática conta com a estratégia de guerrilha para assegurar direitos e garantias fundamentais.

A Guerrilha Processual Penal tem como objetivo submeter o adversário, que pode até ser muito mais poderoso, a condições adversas que causem extrema dificuldade às suas ações contrárias à Constituição da República. Desta forma, os guerrilheiros processuais podem fazer frente a poderios superiores das Agências Estatais encarregadas da persecução penal. A inferioridade dos guerrilheiros em questões estruturais, por exemplo, é compensada pela estratégica, pelo estudo da dogmática crítica, pelo conhecimento da jurisprudência mais progressista nacional e internacional, pelo reconhecimento das contradições e fragilidades das Agências Estatais e pelo impacto da ação psicológica.

Enquanto ações típicas de uma guerra, como o afastamento de direitos e garantias fundamentais, forem adotadas por agentes do Estado, a guerrilha processual apresentar-se-á como resistência democrática à opressão. Enquanto a jurisdição penal for utilizada como instrumento de violência ilegítima contra parcela da população brasileira, o guerrilheiro processual responderá tanto com o conhecimento necessário a desvelar o absurdo que se manifesta no Sistema de Justiça Criminal quanto com a técnica capaz de afastar a “certeza delirante” dos acusadores e inquisidores.

Hoje, parece não haver mais dúvida de que o Sistema de Justiça Criminal é também um espaço de luta política. Luta que não pode deixar de ser travada. Deve-se, para tanto, combater toda forma de ilegalidade estatal. Exemplos não faltam de que as “regras do jogo democrático” são afastadas no processo penal sempre que atores jurídicos autoritários querem fazer prevalecer suas vontades e perversões inquisitoriais. Todos os dias, direitos e garantias fundamentais são sonegados ao serem percebidos como obstáculos à eficiência repressiva do Estado ou ao desenvolvimento do Mercado. A garantia liberal inscrita no princípio da legalidade estrita foi abandonada: adotou-se, de norte a sul do Brasil, uma espécie de “vale-tudo” em nome da punição. Diante desse quadro, a guerrilha processual penal apresenta-se como uma estratégia de preservação dos direitos dos mais fracos, como uma reação ao agigantamento do Estado Penal. O guerrilheiro processual penal é, portanto, aquele que não quer viver de joelhos diante de manifestações autoritárias dos agentes estatais, uma vez que é radicalmente comprometido com a dimensão material da democracia, com o projeto de concretização dos direitos e garantias fundamentais para todos e todas.

Conheça o curso de Guerrilha Processual Penal.

Inscrições em: http://www.escolapassagens.com.br/0031.html

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