Como a Bolívia mostrou minha ignorância

Enrico Pereira
Revista Passaporte
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3 min readFeb 16, 2018

Começo este texto admitindo que não tinha a maior fascinação pela América Latina. O resto dele é para contar como a Bolívia me conquistou.

Meu problema com nossos vizinhos hispânicos era que eu considerava, ou melhor, imaginava que nossas culturas, histórias e realidades fossem muito próximas para que pudesse respirar o ar da novidade por aqui. Encantadores deviam ser os castelos europeus, as luzes de Las Vegas (nome espanhol, aliás) e os templos budistas nepaleses.

Minha curta viagem, que aconteceu durante uma semana do último janeiro, alterou a visão de mundo que eu tinha para sempre. Não gosto de usar hipérboles e essa não é uma delas.

Quando cheguei em Santa Cruz de la Sierra, com minha cabeça de um jovem com preconceitos de velho, não me deixei impressionar pela arquitetura, as casas pareciam moradias de famílias praianas brasileiras. As calçadas, ainda mais estreitas e cheias de mato que as campineiras.

Estupidez minha. Santa Cruz de la Sierra é a cidade mais populosa e rica do país, com 1,7 milhões de habitantes, é planejada, diferente das metrópoles brasileiras, que crescem mais bagunçadas que folia de carnaval. Seu plano é feito em anéis, assim existem zonas distintas para cada especifidade, o terceiro anel concentra escolas e hospitais, por exemplo, além disso o crescimento é proporcional para todos os lados.

Imaginava que seria mais um destino perigoso, as Américas do Sul e Central receberam um eficiente aporte financeiro dos EUA para criar as maiores redes de narcotráfico do planeta, a mão de obra era farta, devido a organização social desigual importada da Europa e nosso solo sempre foi fértil, graças a deus.

Engano, outra vez. Por onde andei, de Santa Cruz a Chochis, a segurança é tida como garantida. O carro anda com janelas abertas para tornar as noites mais frescas, o celular constantemente à mão para tirar fotos e os caixas eletrônicos ficam nas ruas, quase sem reforço de segurança.

Isso se reflete novamente na arquitetura, casebres dividem paredes com mansões, aqui os ricos e pobres não possuem tamanha divisão, guetos e castas. O povo é mais unido e organizado.

Não encontrei a resignação dos brasileiros nestas ruas. Todos se unem para reclamar seus direitos. Foi assim que Santa Cruz cresceu, protestando por uma parte justa nos lucros do petróleo que produzia para o país. Aliás, a cidade é cheia de cartazes e pichações políticas e nos quatro dias em que estive lá presenciei dois protestos.

Apesar de o PIB estar crescendo, a Bolívia passa por intensa polarização política; Aqui um protesto contra a relocação dos mercados na em Santa Cruz de la Sierra.

Ainda falando em arquitetura e união do povo, mesmo sendo uma metrópole Santa Cruz de la Sierra tem estabelecimentos comerciais e moradias que lembram os de cidade pequenas brasileiras, e isso é lindo. Que fique claro, a cidade tem vários prédios de arquitetura contemporânea, diferente e bonita, mas as semelhanças com cidades menores são encantadoras. As ruas são movimentadas, muito, e os pontos de encontro principais são parques e praças. Sinceramente invejável.

Me enganei de tantas outras formas, mas esta mensagem ficaria maior que os roteiros de uma novela da Globo se eu contasse tudo de uma só vez. Por enquanto fica a mensagem de como o país é lindo e tem muito para nos ensinar.

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Enrico Pereira
Revista Passaporte

Jovem jornalista que é apaixonado por literatura, cultura e por aprender tudo que gera um bom debate.