da janela do ônibus

Café das sete
Revista Passaporte
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3 min readDec 17, 2020

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A estrada sempre é um lugar de conexão pra mim. Um lugar neutro. Estrada é estrada. Por um momento em Alagoas olho a janela do ônibus estou em Minas. Aí me dou conta do cheiro de mar e percebo que tô longe de casa.

Por muito tempo eu tentei entender o que é casa pra mim. Canceriana, casa em mim mesma ou nas mil lembranças e memórias que cultivo? Nas caixas de carta ou nos diários que tentam desesperadamente guardar tudo e todos comigo?

Nesse trecho que me liga de São Miguel dos milagres até Maceió eu percebi que casa pra mim são as histórias. Quando eu as escuto e quando eu conto as minhas. Casa pra mim é Vanessa que tenta viver no amor a liberdade e coragem que vive no mar. É Bruna que viaja sozinha doida pra encontrar.

Camila, que pousa distante pra conseguir digerir melhor o que tá perto. É Stefano que cede ao desejo do outro porque está no caminho de descobrir que nada mais importa que seu próprio desejo. É William que mergulha no mar, no celular e nos investimentos e esquece de mergulhar no outro.

Andreza, que não sabe o caminho, mas quer chegar. Filipe que junta mundos ao redor de uma mesa pra não precisar lidar com seu próprio mundo. É Fábio que sai de SP, mas SP não sai dele. Aline, que entende que coragem não é loucura e liberdade não é solidão.

Bolo, que não sai pro mundo, mas tem um mundo inteiro dentro de casa e todo um mundo de amor dentro de si. É Rejane que leva a família, pouso certo, pra viver no hostel, pouso incerto. É Rafa, que viaja pela boca. É a paranaense que quer pegar o francês. O espanhol que carrega seu violão pelo Brasil. É Juli, que trabalha no mar da frança, mas se apaixonou pelo nosso mar.

É Manoel que não cobra a barraca da praia e Albani que vende o sorriso, mas no final você sai com uma série de fotos engraçadas.

É que eu nasci em 91, trabalho desde os 14, TCC com história de mulheres e terminei um namoro de anos, gosto de ouvir histórias e contar de mim. É isso. Casa pra mim são os papos que tenho. As histórias que escuto.

Quando eu penso no que eu tenho a contar do que vivi, parece tão valioso. E nenhuma delas tem muito haver com dinheiro (mas, tem) ou sonho de vida (desses que costumam afirmar sonho).

Sonho de vida de contador de história é viver e ponto.

E a galinha que passam em frente a parede laranja é metáfora pra quando preciso correr do perigo. A casa abandonada vira reflexão, porque o concreto das paredes nasce da necessidade de individualidade, mas rui porque no fundo todo mundo precisa compartilhar, pertencer.

E eu no ônibus com saudade de casa e você onde for que esteja com saudade de viajar.

31 de Janeiro 2020

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Café das sete
Revista Passaporte

Por Helena Merlo. MUITOS erros de digitação pq eu escrevo na fritação do sentimento! CATARSE. "A arte é uma confissão de que a vida não basta" F.Pessoa