O Simples.
Revista Passaporte
Published in
3 min readJan 16, 2018

--

Muitos ajustes foram necessários depois da volta ao mundo para que eu pudesse voltar a falar que “viajar faz bem pra você”.

É como uma espécie de dever de casa. Após levar lição atrás de lição na estrada, fui colocando uma por uma pra fazer sentido, mas sentido DE VERDADE. No momento continuo no processo, mas agora tá legalzinho para eu começar a soltar umas conclusões aqui e ali.

Primeira coisa que tive que repensar:
- Se viajar é conhecer a si mesmo, abrir sua mente e expandir horizontes, por que a maioria de nós pega um certo ranço de quase tudo da nossa casa quando voltamos? É um tal de governo de merda, amigos e família com as mesmas cabeças, vontade de viajar 24hrs dia, “não sou mais de lugar nenhum”.

Eu leio e releio isso em grupos de viajantes. Pessoas desesperadas, sentindo que sua áurea espiritual está sendo massacrada pelos padrões… sem mesmo ver que elas estão se enfiando em outro padrão, o do viajante eterno.

Curiosamente todos os lugares em que vamos e nos maravilhamos são na real a vida de alguém, porém na nossa própria vida temos uma dificuldade imensa de achar qualquer beleza, qualquer magia. É sempre aquela lá, aquela longe de mim que me faz feliz.

Já durante a viagem me chamou a atenção o quanto eu e as pessoas que me cercavam amavam um lugar até que as coisas começavam a ir contra meio errado. E então acontecia coincidentemente o tal chamado, a hora de partir.

É então que a idéia de viajar pra sempre que me assusta. As incertezas de não saber o que vem do amanhã são com certeza desafiadoras e nos fazem transcender barreiras enormes dentro da gente, mas faz parte da inconstância abraçar o que “tem pra hoje”, e é aí que a linha do viajar x ficar fica meio borrada. Arrumar as malas e partir não é exatamente peitar de frente a vida e “se deixar levar” e fazer isso prolongadamente pode se tornar sim uma fuga confortável e conveniente.

Não posso voar todo dia pra Ásia. Amanhã posso ter alguma condição de saúde e não poder mais viajar. Amanhã também alguém pode precisar de mim e terei que escolher entre viagens e dedicar-me a uma só pessoa. A qualquer momento posso ser impedida de viajar por muito tempo e então o que será de mim? Agonia e tristeza em pessoa sofrendo com todas as "almas wanderlust" do instagram me dizendo "cada um tem a segunda-feira que quer" ou "qual sua desculpa para não viajar"? (sim, passei a ter muito cuidado com minhas palavras depois que as vi retornando pra mim através de outros viajantes fazendo o que um dia não muito distante atrás era exatamente eu).

Estou no processo de entender o meio termo. Independente de ficar ou ir, o importante é construir a base dentro de mim para o que quer que seja. Ir é preciso um dia, ficar também. O medo de um ou outro que precisa ser resolvido. As viagens nos mostram o lindo de cada um de nós, mas a permanência traz o desafio que sempre varremos para baixo do tapete. Aquilo que não podemos controlar, escolher, mudar. Aquela pessoa que não nos damos bem nem a pau no trabalho, o modo que trabalhamos, a dieta que adotamos para nossa vida, como tratamos as pessoas extremamente diferente de nós, o modo que amamos nossos próximos. Tudo experimentado exaustivamente durante as viagens e que se aplicadas de volta na sua rotina podem finalmente explicar a mágica que a mochila nas costas irá exercer nas suas próximas escolhas.

O medo do agora, é esse que tem que parar. Ele machuca, ele alegra, ele é o único que existe.

--

--