Passeio pelo rio Paraná do Mamori, no Amazonas

Onde as árvores tocam as nuvens (Parte I)

Stefhanie Piovezan
Revista Passaporte
Published in
3 min readMar 4, 2018

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“Bom dia! Meu nome é Adenir, mas pode me chamar de Cobra. Eu vou ser seu guia nesse passeio pela Amazônia”, diz o caboclo de 42 anos de origem Sateré-Mawé.

Adenir Teixeira, ou Adeni, como sai da boca, não gosta do nome. “Parece de mulher”, justifica, e o desgosto já causou vários problemas, hoje lembrados com gargalhadas.

“Era para ser Odenir, mas registraram errado. A gente ia pedir para trocar quando o homem que faz os registros voltasse, mas lá onde eu moro ele demorava a passar. Meu RG também ficou com A, então eu fui lá e, com a caneta, risquei o A e coloquei o O. Para piorar, perdi o RG e, quando chegou a época de me alistar, levei a cópia com o risco. Levei uma bronca. A sorte é que a certidão eu não tinha riscado”.

Ele também não gosta do apelido, dado pelo tio Policarpo, já falecido, porque quando era bebê fazia sons como o do réptil. Era Cobra em casa, depois nas partidas de futebol, e por fim no turismo.

Mas gosta da floresta. Sente saudade quando fica muitos dias longe da mata.

“Meus olhos veem esse verde…”, e aí se faz silêncio.

Quando é preciso aprender

A relação com os turistas já dura 21 anos, conta ele ao desligar o motor do barco durante um passeio pelo rio Paraná do Mamori. Começou com o senhor Soares, que tinha uma agência em Manaus e conhecia a família Teixeira. Um dia, ele disse para a mãe de Adenir que precisava de um funcionário e o então rapaz se prontificou.

Adenir chegou a se afastar do turismo, mas decidiu voltar

A missão era entregar folhetos para turistas que passassem pelo porto divulgando passeios no Rio Urubu, ao Norte de Manaus, e levá-los até a agência. Tudo sem saber falar inglês, na base do “yes”e da mímica.

Por dois dias, ele tentou sem sucesso atrair os visitantes e pensava em desistir quando, até hoje não sabe como, duas australianas aceitaram o convite e fecharam o pacote.

Depois delas, Adenir convenceu seis hippies e não demorou a ser convidado para atuar como guia. Trabalhou por um tempo, mas, por vergonha de não saber se comunicar, desistiu.

Ficou dois anos trabalhando com artesanato junto com a mãe. Nesse período, criou coragem e voltou. Aprendeu inglês e espanhol sozinho e, com livros que ganhou de presente de pesquisadores que visitam a floresta, aprendeu também o nome científico de várias espécies. Hoje, quando quer falar de um bicho, é poliglota como o caraxué-de-bico-amarelo (Turdus lawrencii).

“Olha só, é uma arara. Essa os americanos chamam de scarlet macaw”, diz apontando para uma árvore. “Toda vez que estou contando minha história aparece algum bicho”, fala após alguns minutos e liga o motor da embarcação.

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