Uma taça de vinho quando tudo o que eu queria era uma cerveja — Madri, Espanha

Filipe Mendonça
Revista Passaporte
Published in
4 min readDec 17, 2019

Sempre fui um exímio desconhecedor de vinhos. Um antisommelier. Aquela pessoa que bebia vinho direto da garrafa para parecer descolada. Tudo mudou em um verão na Europa.

Cheguei em Madri numa tarde de sexta. Eu tinha o jetlag das cinco horas de diferença para o Brasil e uma mochila de vinte quilos nas costas. Não tinha certeza do que pesava mais. Para piorar, estava usando calças, calçava um par de botas pela primeira vez (as quais descobri não serem as mais confortáveis) e estava viajando há trinta horas. Fazia uns 35ºC em um dia seco e de muito sol.

Eu iria encontrar uma amiga espanhola que não via há quatro anos, Maria. Nós nos conhecemos em Toronto, e mantivemos a amizade por todo esse tempo, sempre acompanhando a vida do outro em um grupo junto com outro amigo nosso. Finalmente iríamos nos rever.

Marcamos de nos encontrarmos em um shopping perto do seu trabalho. Às sextas, é uma tradição na Espanha que as pessoas saiam do trabalho às três da tarde para um almoço tardio emendado com happy hour e aí já começam o fim de semana. Cheguei no shopping faltando uns trinta minutos para o horário marcado e aproveitei para tomar um chocolate com leite gelado. Apesar de estar babando por uma cerveja, eu acabei bebendo a primeira coisa gelada que encontrei.

Assim que terminei, Maria chegou. Depois de nos abraçarmos e passarmos um tempo esperando a ficha cair de que estávamos nos revendo depois de tanto tempo, fomos caminhando para o seu carro. Contei rapidamente como havia sido a minha viagem e ela me falou que tinha dois colegas de trabalho em um restaurante nos esperando. Soou como o plano perfeito, direito do aeroporto para uma bebedeira.

Chegando no restaurante, apesar de eu estar desejando uma cerveja, os colegas de Maria já estavam na metade da primeira garrafa de vinho e eu resolvi apenas segui-los. Eu estava na Espanha, um país tão famoso por seus vinhos que até um desconhecedor como eu sabia reconhecer que deveria ao menos provar alguma coisa. Além disso, eu já não estava mais com tanto calor, o restaurante era climatizado, e eu já havia tomado aquele chocolate com leite gelado para resfriar o corpo. Assim, pedi mais uma taça e enchi com aquele vinho branco quase gelado, na temperatura perfeita.

No primeiro gole, eu vi que aquela decisão não poderia ser mais acertada e aí me apaixonei por vinhos. Não era extremamente doce como um suco de uva em pó, como os vinhos baratos que eu tomava no início da faculdade (época de pouco dinheiro), e também não travava na garganta, como vinhos mais caros e apreciados apenas por grandes conhecedores. Ele descia perfeito, com um pouco de acidez que ia muito bem com os boquerones (peixinhos fritos) que estavam na mesa esperando para serem comidos.

Depois daí, seguimos com berinjela frita com salmorejo (uma espécie de molho de tomate cru espessado com pão), salada de tomates (era verão, a melhor época para se comer tomates) com ventresca de atum (uma parte da barriga do peixe), alguns cortes diferentes de porco (a carne suína espanhola é especial) e outros pratos que o excesso de ácool não me deixa lembrar.

E quanto aos vinhos, fizemos uma viagem entre tintos e brancos de várias regiões espanholas. Vinhos da Galícia, da Catalunha, do País Basco e por aí vai. Não muito caros, até porque, para um paladar tão iniciante quanto o meu, seria desperdício de dinheiro investir em um vinho caro e complexo.

Ainda não me considero um especialista em vinhos, mas, entre as várias coisas que viajar me trouxe, o gosto por essa bebida foi uma das melhores. Encerro esse texto em pleno verão nordestino, desejando uma cerveja. Mas, se me aparecer um vinho branco geladinho, ficarei feliz da mesma maneira.

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