Viver fora não é para você

Gabi Kopko
Revista Passaporte
Published in
3 min readMay 30, 2018
Há dias naturalmente nublados e outros que são internamente assim.

Uma amiga que vive na Suécia me alertou que primeiro há uma satisfação enorme e quase que inocente de que tudo dará certo quando se muda de país. Tantas coisas curiosas e diferentes para conhecer. Há aquele grande pouquinho de dinheiro que sobra pra fazer umas regalias. A esperança nos aborda e permite certo afastamento de toda experiência ruim dos outros com um “cada pessoa é diferente” e até um “não precisa ser exatamente assim comigo”.

Depois de alguns meses, o problema é que passamos por um momento sombrio que questionamos se fizemos a coisa certa. Seja por causa da frieza climática ou humana, hábitos culturais distintos, dificuldades enormes de conseguir uma nova oportunidade de emprego com um salário justo… boa parte dos imigrantes que conheci já passaram por essa etapa.

Alguns nunca saíram. Respeito demais quem fez o caminho inverso. Ao invés de engolir a seco a dureza, reconheceram que há limite para tudo e nem sempre insistir é a melhor opção. Pode ser frustrante trazendo menos saúde do que alegria. Amargo e não como o chocolate.

Independente do desfecho, bora lá, não há só trajetórias de “vitória” em qualquer investimento humano. Ainda que seja na tentativa de ter uma vida melhor. Minha amiga me disse que depois tudo começa a melhorar. Vai devagarinho, mas melhora. Eu ainda não cheguei nessa parte. Cada dia que passa continuo lutando internamente com o “não é pra você”.

Continuemos, ainda que com o tempo nublado, como no dia que visitamos o Palácio da Pena em Sintra (PT)

Talvez eu seja brasileira demais. Acho que sou. Incurável. Faço questão de soar com sotaque. Talvez seja pobre demais. Há os ricos. Há aquela galera que mora ali do lado da Madonna em Cascais. Eu preciso comer arroz e feijão todo dia para segurar o aluguel… Há os mais estudados e com as experiências incríveis registradas no Linkedln. Não parece também ser isso. Parece que sempre falta “skills”.

Minha mãe uma vez disse que era rígida comigo e meus irmãos por achar que a gente viraria bandido. Há aquilo que realmente não é pra você e que alguém maravilhoso vai te ensinar antes de ser tarde.

Minha melhor amiga de infância, no entanto, me disse que entre nós e outras, eu era a com pior possibilidade de ter algumas coisas na vida. Uma tia uma vez se surpreendeu por “logo eu” ter uma boneca nova e não rabiscada. Formar? Demorou 10 anos. Casar tá tão fora de moda. Ninguém mais faz isso! Cuidar de filhos? Ter filhos? Você? Largar um emprego até seguro na capital sem muitas reservas e cruzar o oceano por uma vida melhor…

nãoénãoé nãoénãoé nãoénãoé nãoénãoé nãoénãoé nãoénãoé

é pra mim sim.

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