BBB21 e a (in)visibilidade da bissexualidade
O Big Brother Brasil (BBB) 2021, que encerrou nesta semana, possui um inegável engajamento por parte da sociedade brasileira. E, entre tantas pautas levantadas por este “dispositivo pedagógico[1]” — BBB21 — o primeiro beijo gay do programa, entre Gil do Vigor e Lucas Penteado, esteve em evidência dentro e fora da casa durante os 100 dias de programa. A bifobia por parte de participantes e do público traduzem o regime de (in)visibilidade pelo qual a bissexualidade está submetida. O GenSex COVID-19 — Observatório Virtual de Gênero e Sexualidade na pandemia levantou notícias sobre saúde, violência, gênero e sexualidade entre janeiro e setembro de 2020. Na coleta, nenhum conteúdo versava especificamente sobre bissexualidade, diferentemente das questões gays, lésbicas e trans.
É importante considerar que conteúdos midiáticos envolvem produção de saberes e modos de educar que direcionam o público a formas de ser e estar na cultura. O beijo entre Lucas e Gilberto em uma festa promoveu questionamentos sobre as motivações para o beijo, principalmente porque naquele momento o participante Lucas estava na berlinda por uma confusão em uma festa anterior quando havia demonstrado interesse por uma participante do gênero feminino. Enquanto isso, o público engajado no Twitter se dividia no tópico do BBB entre acusações indicando o beijo em Gil como estratégia de jogo. Como uma das autoras deste texto brincou: o ‘B’ não é de bagunça não!
No BBB, uma participante inclusive lésbica, duvidou das intenções do beijo, já que, para ela, Lucas estaria “agenciando para si uma pauta coletiva”, beijando Gil. Cabe ratificar que a bissexualidade é raramente aventada como sexualidade possível, sendo atravessada por hierarquias sexuais que codificam quais sexualidades são boas e quais são más, como nos ensinou a feminista Gayle Rubin[2].
Essas hierarquias também operam para invisibilizar práticas sexuais entre pessoas adultas com grandes diferenças etárias, práticas e relações não monogâmicas ou mesmo relações sexuais sem objetivo de procriação. A racionalidade moderna instituiu o modus operandi cartesiano de pensar e refletir, onde qualquer expressão de vida que fissure a lógica binária gera um desconforto profundo, isso se reflete inclusive no próprio movimento LGBTI+, que historicamente hegemonizou experiências monosexuais.
O regime de (in)visibilidade, provocado pelo BBB 21, criou para bissexualidade e para o campo do ativismo bissexual brasileiro, um novo “cenário de interpelação” e, ao mesmo tempo, uma “retórica de empoderamento” fortalecida especialmente pelas redes sociais. A presença de palavras como bifobia e bissexualidade nos Trend Topics do Twitter ilustram esses dois movimentos também captados no estudo de Alexandre Fleming C. Valle[3] sobre gerações de lideranças trans brasileiras.
Seja através dos comentários bifóbicos ou mesmo bi-inclusivos a visibilidade coloca em pauta pública o tema historicamente invisibilizando, gerando então novos cenários de interpelação — produzindo de maneira mais explícita bifobia — e, também co-produzindo uma nova retórica de empoderamento reverberadas por ativistas, artistas, pesquisadoras e midiativistas. A educação se faz cotidianamente por pedagogias que não se resumem ao espaço formal, cabe àquelas e àqueles engajados em transformar o mundo em um lugar mais justo compreender que os dispositivos pedagógicos existentes devem ser ocupados com discursos que produzam sentidos plurais de vida e modos de existir.
Texto de:
Bruna Gabriela Gomes — bolsista VIC vinculada ao NUEPOM/UFMT
Bruna Andrade Irineu — Coordenadora do NUEPOM/UFMT e do GenSex COVID-19
Referências:
[1]FISCHER, Rosa Maria B. (2002). O dispositivo pedagógico da mídia: modos de educar na (e pela) TV. Educação e Pesquisa, 28(1), 151–162.
[2]RUBIN, Gayle. Políticas do sexo. São Paulo: Ubu Editora, 2017.
[3]FLEMMING CAMARA VALE, A. Regimes de visibilidade e retóricas de empoderamento. Bagoas — Estudos gays: gêneros e sexualidades, v. 12, n. 18, 10 set. 2018.