Caso Carol Solberg: censura, machismo e racismo no esporte

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3 min readOct 29, 2020

Após o término de uma partida de vôlei de praia, na cidade de Saquarema, Rio de Janeiro, a atleta Carol Solberg, gritou durante uma entrevista ao vivo “fora, Bolsonaro!”. A ação gerou críticas advindas de defensores do governo. Mas o susto veio com as notas de repúdio, e até mesmo denúncias promovidas pela própria procuradoria do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) e pela Confederação Brasileira de Vôlei (CBV).

Fonte das imagens: Foto superior — Reprodução/Instagram carol_solberg; Foto inferior esquerda — Reprodução/Youtube; Foto inferior direita — Reprodução/Twitter CBV;

Além de ser um claro sinal de censura à expressão política da atleta, a ação é sexista. Não precisamos ir longe para encontrarmos exemplos considerados “legítimos” de liberdades de expressão para as autoridades desportivas. Em 2018, Wallace e Maurício Souza, ambos jogadores da seleção masculina de voleibol, demonstraram apoio a Jair Bolsonaro, até então candidato à presidência. A Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), além de repostar a foto em seu perfil do Instagram, defendeu a ação através do argumento do uso da liberdade de expressão. O questionamento ocorre diante das diferentes atitudes tomadas pela CBV e STJD em situações semelhantes. Afinal, o 5º artigo da constituição brasileira só vale para atletas do gênero masculino e simpatizantes ao governo? Visto que, apenas Carolina Solberg foi denunciada com pedido de pena máxima, por expressar sua opinião. De acordo com a CBV, a justificativa para tal ato considerou o patrocínio do esporte e o receio de uma possível retaliação por parte do governo Bolsonaro. No entanto, não se justifica censura sob hipótese de sofrer danos, e muito menos quando não há igualdade de tratamento aos atletas.

Para além da repressão ao direito de expressão somada ao machismo do meio esportivo, há outro revés. A CBV, em nota de repúdio ao ato da jogadora, fez uso do termo racista “denegrir”. Segundo a nota, fatos como esse “denigrem” a imagem do esporte. O significado é fazer-se negro ou difamar, adquirindo portanto, carga pejorativa ao ser negro.

Com a repercussão nacional do caso, o Ministério Público Federal emitiu um despacho à entidade desportiva questionando a denúncia com base no preceito de liberdade de manifestação de pensamento e o princípio da isonomia. A ação tem grande importância na construção de uma sociedade mais justa e livre.

Em uma ação para que represálias como essa não se repliquem, Romário, ex-jogador de futebol e atualmente senador, apresentou um projeto de lei, cuja proposta é de que nenhum atleta sofra punições geradas por manifestação política. Isso é legítimo, considerando que atletas são figuras públicas que servem como exemplo para milhares de pessoas. Suas manifestações, dentro e fora de quadra, reverberam na sociedade. Além de ser garantido por lei, o direito à expressão é válido para todas as pessoas, até mesmo para Carol, pois, antes de atleta é cidadã. Ou mulheres devem ser alienadas e não podem expressar suas indignações quando convém?

Texto de:

Maryelle de Campos Ponce, estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Andrelina Braz, estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

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Observatório de Comunicação e Desigualdades de Gênero da Universidade Federal de Mato Grosso.