Ofensas a Patrícia Campos Mello e o machismo contra mulheres jornalistas
Desde a eleição de Jair Bolsonaro os ataques a profissionais da imprensa aumentaram consideravelmente. Segundo dados da Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ), o presidente proferiu 245 ataques à repórteres no primeiro semestre de 2020. São ofensas que vão além das falas, abrindo espaço para agressões e ameaças no ambiente físico e virtual, como o ocorrido com a jornalista Patrícia Campos Mello.
Durante as eleições de 2018 ela escreveu uma reportagem em que empresários apoiadores do então candidato Bolsonaro teriam financiado disparos em massa de mensagens contra o Partido dos Trabalhadores (PT) via WhatsApp. A partir da publicação da matéria, ela passou a ser xingada nas redes sociais de “mentirosa”, “puta”, “vagabunda”, além de receber ameaças ao filho e à sua integridade física.
Em dezembro daquele ano, outra matéria sobre os disparos de mensagens foi publicada, que revelou o uso fraudulento de nomes e CPFs de idosos, facilitando os disparos em massa. Entre as evidências apresentadas estavam documentos e o relato de Hans River, ex-funcionário de uma das empresas que prestou serviço para a campanha de Bolsonaro. Em depoimento à CPMI das Fake News, Hans disse que Patrícia teria se insinuado sexualmente a ele em troca de informações.
A declaração repercutiu e chegou ao presidente que, durante uma coletiva, fez uma piada sobre “dar o furo”, jargão jornalístico usado quando se obtém uma matéria em primeira mão. Bolsonaro usou o termo associando o ‘furo’ ao corpo da jornalista. A piada coloca em evidência a ligação machista de que qualquer ganho profissional de mulheres é tido através do sexo. Além disso, os ataques online se intensificaram, frequentemente comparando-a com uma prostituta e com uma atriz pornô.
A falácia do ataque à pessoa é um método usado por aqueles que não se importam com os argumentos e focam apenas em proferir insultos contra os adversários. No caso de Patrícia, o teor dos xingamentos visam atacar seu gênero. Quando as pessoas classificam uma mulher como “puta” ou “vagabunda”, elas o fazem com o objetivo de ferir sua honra. A prostituição é vista como uma atividade fora do eixo e extremamente estigmatizada, tratada como categoria subalterna, de má conduta e não digna do espaço público.
A intenção dos autores dos ataques e daqueles que perpetuam o discurso, é, primeiramente, de silenciá-la. Na língua inglesa, o termo “shooting the messenger” (atirar no mensageiro) é usado para atacar e culpar o portador de “más notícias”, sendo que ele apenas faz a comunicação. É mais fácil atacar a jornalista do que acreditar nas notícias que ela escreveu. O objetivo dos ataques é tentar desviar a atenção das denúncias feitas.
A Folha saiu em defesa de Patrícia assim que os ataques começaram, mas ela não é a primeira e nem será a última mulher no meio jornalístico que será atacada e terá seu trabalho e sua competência questionados. Um homem, se colocado na mesma posição, muito dificilmente teria sua carreira e sua produção contestadas dessa forma.
Texto de:
Millena Teixeira Barros, estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
Karina Stein, comunicóloga e jornalista pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e mestranda em Comunicação em Poder (PPGCOM — UFMT).