Ser mulher jornalista aumenta o risco de violência e ataques de ódio

Pauta Gênero
pauta-genero
Published in
3 min readMar 16, 2021

A chegada de Jair Bolsonaro ao poder, em 2018, representou um agravamento das ameaças contra a liberdade de imprensa e contribuiu para a disseminação de agressões a jornalistas, tendo as mulheres como principais vítimas desse tipo de violência. Não à toa, em seus dois primeiros anos de mandato (2019 e 2020), o número de ataques a jornalistas cresceu assustadoramente, e o principal responsável por essas agressões foi o próprio presidente da República.

Fonte das imagens: Foto à esquerda — Massey University; Foto à direita — Reprodução;

No contexto do fenômeno da desinformação, diversas entidades que atuam em defesa da atividade jornalística chamam a atenção para a degradação do ambiente democrático no país. As mulheres são as principais vítimas das perseguições, sobretudo no meio digital: são mais de 56% das vítimas de agressão no país, segundo levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI) realizado em 2020. Mas os ataques não se restringem ao universo online, estão presentes também nas ruas e no ambiente das redações e não faltam dados para atestar esta constatação, como recentes relatórios divulgados pela Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ) e pela ONG Artigo 19.

Em um dos mais recentes levantamentos, intitulado “O jornalismo frente ao sexismo”, divulgado pela ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) por ocasião da passagem do Dia Internacional dos Direitos das Mulheres, em 8 de março, há a advertência de risco de violência de gênero ou sexual como ameaça inerente à profissão. A pesquisa foi realizada pelo grupo em 112 países e chama a atenção para a gravidade da situação no Brasil, onde a atuação do presidente e de seus filhos contra a jornalista Patricia Campos Mello, seguida de uma violenta campanha de cyberbullying (agressão moral praticada através da internet), forçou a repórter a andar com um guarda-costas. O próprio caso da jornalista da Folha de S. Paulo, abordado no documento, aponta que ser mãe pode aumentar o ódio a jornalistas na internet.

Patricia é autora de reportagem que denunciou o disparo de mensagens de celular ilegais na campanha presidencial de 2018 para beneficiar Bolsonaro. Ela sofreu uma enxurrada de ameaças e ataques machistas e misóginos em suas redes sociais pelos apoiadores do presidente, reforçados por declarações públicas deste, de seus filhos e de aliados próximos, que visavam descreditar o profissionalismo e a competência da jornalista.

Outro caso recente de repercussão nacional envolveu a jornalista Schirlei Alves, que tornou nacionalmente conhecidas as humilhações durante o julgamento do processo movido pela influenciadora digital Mariana Ferrer. Depois da reportagem publicada pelo The Intercept, a jornalista precisou desativar suas redes sociais frente a uma série de xingamentos misóginos, além de ofensas pessoais que buscavam desqualificar seu trabalho e sua carreira.

É muito grave que nossa sociedade aceite e assista inerte as agressões praticadas por autoridades públicas, inclusive pela cúpula do governo federal, violando, assim, obrigações assumidas internacionalmente pelo Estado brasileiro. Esses ataques, só favorecem a criação de um clima ainda mais hostil para as mulheres jornalistas exercerem livremente sua atividade profissional, prejudicando a liberdade de imprensa no Brasil atual e dificultando a possibilidade de as mulheres terem garantidos os seus direitos. É dever do Estado brasileiro atuar para que mulheres comunicadoras possam desempenhar suas profissões em segurança, contribuindo com os direitos da população à informação e a acessar debates urgentes provocados pelas pautas jornalísticas.

Texto de:

Giordano Tomaselli, estudante de Jornalismo pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Magali Moser, jornalista e doutoranda em Jornalismo pela Universidade Federal da Santa Catarina (UFSC). É bolsista FAPESC e mestra em Jornalismo (UFSC/2016).

--

--

Pauta Gênero
pauta-genero

Observatório de Comunicação e Desigualdades de Gênero da Universidade Federal de Mato Grosso.