Crise Penitenciária

Guilherme Szczerbacki Besserman Vianna
Pautavel
Published in
3 min readApr 28, 2019
by Yan Amorim

A cadeia é um instrumento utilizado há diversos séculos para punir criminosos. Sua eficácia é bastante heterogênea, em função de variáveis relacionadas ao tempo e ao espaço em que a punição está inserida. No entanto, uma prisão tem três objetivos principais: isolar um indivíduo perigoso da sociedade; punir quem fez besteira; e mostrar pra quem tá com vontade de fazer besteira que será punido caso concretize a ação pensada.

Além de observar se a política carcerária brasileira funciona, é importante verificar se ela é justa e se respeita os direitos dos seres humanos. No entanto, iremos pular essas duas etapas, tendo em vista que é uma discussão ampla, embora dados comprovem a injusta preferência por negros e pobres na hora de botar alguém na cadeia.

Outra discussão essencial que não se fará nesse texto é o que deve ser considerado ou não crime. Vamos considerar que a Lei brasileira é perfeita (o que é bastante irreal). Ainda assim, precisaremos diferenciar crimes menos graves (como roubar o pão de uma padaria) de crimes mais graves (como homicídios).

O ponto principal, mesmo desconsiderando essas variáveis, é: o sistema carcerário brasileiro possui um problema de oferta e demanda. Pensei em rechear esse parágrafo de números, mas a análise subjetiva já basta: tem gente pra cacete presa, tem crime pra cacete sem solução e as cadeias tão superlotadas pra cacete.

Como as cadeias são lotadas, as condições para quem vive nelas são péssimas. Há, em média, 1m² por pessoa (contra 2,5m² de uma pessoa de braços abertos). Com essa realidade, o ladrão de pão se torna suscetível à influência de facções criminosas. A situação fica ainda pior porque o julgamento sobre o roubo à padaria leva anos, o que deixa um sentimento real de injustiça na cabeça daquele indivíduo. Assim, há anos, as facções criminosas entenderam essa lacuna e transformaram as prisões em verdadeiras escolas do crime.

Resumindo: na forma em que funciona nosso sistema carcerário, "bandidinhos" se transformam em "bandidões". Ao sair da cadeia, o ladrão de pão basicamente não tem outra opção. Em função de seu passado, não consegue um emprego legal, e as facções já estarão de olho nele, exigindo que atue de acordo com os interesses do crime organizado. Ele só pode escolher entre morrer de fome, se suicidar ou se tornar um bandidão.

Como construir mais cadeias com o escasso dinheiro público não é uma boa ideia, fica evidente que não adianta prender mais. O Brasil está na contramão do mundo, crescendo 7% ao ano sua população carcerária, contra redução de 8% ao ano dos EUA e 9% ao ano da China, sem contar os países europeus que fecham cadeias por falta de presos todos os anos.

Atualmente, os indivíduos mais perigosos não estão isolados da sociedade; a punição com cadeia para quem faz besteira leva a mais vontade de fazer besteira; e quem tá com vontade de fazer besteira é motivado para continuar no caminho. Ou seja, as cadeias não cumprem com seus objetivos básicos no Brasil, mesmo desconsiderando defeitos nas etapas que antecedem uma prisão (por exemplo, seletividade para negros e pobres e Leis defasadas).

A solução passa por diferentes eixos: dentro das cadeias, é necessário separar integrantes do crime organizado de ladrões de pão, prejudicando o modelo da escola do crime. Em termos de julgamentos, é necessário celeridade nos processos e a busca por penas alternativas (como fianças ou obrigações sociais) quando possível. Nesse sentido, precisa-se reduzir o número de presos provisórios (cerca de 40% atualmente). Fora das cadeias, é necessário inteligência para punir quem comete crimes graves (apenas 6% dos casos de homicídio no Brasil são solucionados atualmente) e educação no longo prazo para reduzir o total de criminosos.

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Guilherme Szczerbacki Besserman Vianna
Pautavel

Textos curtos para (tentar) elevar o nível da discussão em uma conversa de bar.