Sequestro em Brasília: antipetismo levado ao extremo

Vai piorar bastante até ficar ruim de verdade

Leandro Godinho
Peço perdão
Published in
4 min readAug 1, 2015

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A histeria e a demência que resolvemos assumir como debate político caminha a passos largos para desaguar em gente morta

Quinta-feira que passou, dia 30, explodiram uma bomba na sede do Instituto Lula, em São Paulo.

Pelo menos dessa vez ninguém se feriu.

O atentado a bomba traz em si uma óbvia conotação política, por mais que a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, responsável pela apuração do caso, tenha declarado à Folha que a sua “suspeita inicial é que não se trata de um crime político, mas da ação de baderneiros”. Lendo com atenção a própria matéria, apesar dela estar na editoria Poder e de tratar a respeito da natureza política do atentado, vejo que a sigla do Partido dos Trabalhadores, PT, não aparece no texto; a palavra petista aparece um par de vezes, sutil. Hm.

Mais cedo, informa a matéria, “mais uma vez um pequeno grupo se concentrou em frente ao instituto com faixas de protesto. A polícia, que já estava no local para fazer a perícia, identificou todos os presentes. O grupo teve uma discussão com militantes petistas e foi embora logo depois”. Hmm.

Este foi o segundo ataque a bomba contra um alvo petista dentro da cidade de São Paulo somente esse ano. Em março, um diretório do partido (na Bela Vista) foi alvo de atentado semelhante, que também não deixou vítimas. Igualmente em março, na cidade de Jundiaí, no rescaldo de uma das manifestações contra o governo Dilma, o diretório do PT no município foi alvo de um coquetel molotov. Diferente do que aconteceu com os manifestantes de junho de 2013 ou com Rafael Braga, quem joga bomba em sede de partido político deliberadamente não está respondendo a processo, muito menos encarcerado.

Nem só de bombas caseiras vive o antipetismo, que não se limita a São Paulo — onde Dilma perdeu para Aécio no 2º turno de 2014 por quase 7 milhões de votos. Em meio à inflamada (e infame) campanha eleitoral passada, um militante petista foi assassinado em Curitiba (não por acaso, onde o PSDB elegeu um governador no 1º turno, Beto Richa).

Já que mencionei o antipetismo, abro um devido aparte para um comentário postado no Facebook (na ocasião do assassinato em Curitiba, em 2014) por Pedro Moraes, um gênio da raça, sobretudo: “ O antipetismo está muito distante, faz tempo, de um mero discurso político. Se configura como discurso de ódio, intelectualmente desonesto e irracional. E os efeitos mais nefastos, além do bloqueio a qualquer debate público sério, são a violência fascista que vimos no desfecho das manifestações de junho (não, não falo de black blocs, que não agrediam ninguém, mas de nacionalistas cretinos que expulsaram toda e qualquer esquerda das ruas — até anarquistas — sob agressões) e tragédias como a que ocorreu agora, com um jovem cabo eleitoral assassinado em Curitiba”.

E o discurso e a moral antipetistas, todos sabemos, ganham capas do grande pasquim travestido de semanário de notícias que atende pelo nome de Veja; ganhou as ondas do rádio paulista na Jovem Pan que agora reverbera aquela Raquel de sobrenome impronunciável; vicejam no imaginário nacional com o terceiro turno que PSDB e oposicionistas forçam com auxílio dos barões da imprensa, usando o protagonismo investigativo que polícia e ministério público federais jamais tiveram no governo tucano como escada. Na era do ruído em que vivemos, onde todo o pensamento pode ser memetizado, o antipetismo virou hype — é chique ser tosco.

Mora na filosofia, esse é um dos caras mais lidos no Brasil.

Voltemos a 2014: no final de setembro, a cerca de uma semana do 1º turno das eleições, um rapaz chamado Jac Souza dos Santos, se hospedou no hotel Saint Peter, em Brasília, onde, munido de um revólver e de um colete que supostamente continha explosivos, sequestrou um funcionário do hotel e ameaçou explodir o local.

Suas exigências: a saída da presidenta Dilma do governo, a extradição de Cesare Battisti e a aplicação efetiva da Lei da Ficha Limpa. Coincidência ou não, o Saint Peter seria o hotel onde José Dirceu iria trabalhar após sua condenação no Mensalão (Dirceu desistiu do emprego após a polêmica que se instaurou diante da notícia que seu salário mensal para tanto seria de R$ 200 mil). “Desesperado com a política”, Jac acabou se rendendo. A imprensa tratou o caso como se Jac fosse alguém com problemas, não mais que isso. Antipetismo, discursos virulentos? Nenhuma menção.

Dessa mistura de antipetismo com o discurso histriônico de olavos, raquéis e reinaldos, nasceu o Movimento Brasil Livre, que se vale da retórica de Facebook (sic) para angariar simpatizantes. Seu ícone, Kim Kataguiri, brada em público que o “PT tem que levar um tiro na cabeça”. Kim foi o garotão que se animou a caminhar de SP a Brasília pelo impeachment de Dilma, contando que chegaria triunfal em meio a uma multidão no Planalto — mas a multidão nunca houve. Restou a ele fazer uma social com congressistas ilustres (Feliciano, Bolsonaro filho, Cunha).

Nem tudo está perdido para o jovem: a mesma editora que lançou o best-seller de Olavo já prepara o livro que Kim assinará (se ele mesmo escreveu, aí já é outro papo). O certo é que já podemos antever uma piora no debate a curto prazo. Torçamos para que a retórica se atenha à idiotia geral costumeira e não se revele um pequeno manual de guerrilha urbana antipetista. Torçamos.

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