o homem engessado
quando lágrimas coagulam no leito dos olhos
a visão se torna restrita a dor turva
deturpada dura como o titânio
quebra o osso e então afixa
fazendo dele mais rígido mais
forte do que era antes
o homem engessado emocionalmente limitado
afetivamente frustrado despreparado e imaturo
um jovem adulto ou adulto criança
forçado cedo a andar antes de crescer correr
pelo aperto do passo não por ter qualquer direção
educado a não morrer evitar ousar estar vivo
devoto desde sempre somente e imperativamente
da religião da distração de domingo
e dedicado a nunca em hipótese alguma ser
de nenhuma maneira uma vítima
o homem engessado
sabe usar as pernas não os braços
tem as mãos ásperas carinho que estala na pele
desde a mãe não sabe habitar dentro de outro alguém
esquiva do enlace das mãos como um competidor voraz
no combate corpo a corpo
se vão anos tentando reverter sua condição
de homem não mulher de bastardo sem pai
de verter a água salgada
antes que se converta
em vinho pulsante
de derramar o ácido biliar
a pepsina a tristura tudo
pra fora da boca poupando
assim o próprio fígado
de coçar a coça que dá
ser sujeito ou ser fiel
o mel o fel a fé o anzol
a forca o asfalto o cardiazol
e ainda assim não ser santo a sé de um só dia
não ter seu nome ovacionado nas ruas
nem ter pra si o choro das mulheres
o homem engessado morre
a cada salário consorte a cada caso
em que violado se viola e está de pé
sempre de pé de queixo erguido
antes mesmo das cinco pronto
pra ser carne sono e silêncio
corpo solto nas ferragens
definhando seu futuro