O pássaro e o bêbado

L. Nicolai
Pensamentos Poéticos
2 min readAug 6, 2019

O velho que me prendeu nesta gaiola
é tão bêbado que sempre esquece
de fechar a portinhola
quando cuida
de mim,

Se bem que “cuidar”
não seria a palavra
certa

Ele joga em meu pote
uma água suja e amarga,
e derruba as cinzas
de um fogo fétido
que com certeza
nos matará.

O velho deve sentir
muita raiva do mundo…
Mas não é por isso
que ele tem que me
levar junto
neste caminho
de autodestruição.

Se não me engano,
ele é assim porque
uma mulher entrou
pela sua porta
como um bichano
faminto,
e devorou seu pão,
suas migalhas,
sua dignidade,
e sua vontade de viver.

E o burro sem perceber
continua caidinho
por essa beleza felina
capaz de transformar
sujeira em cocaína,
tudo em nada,
e pra piorar:

Entrou uma gata aqui na noite passada.

Hoje o velho cantou
quando o dia
amanheceu,

Seu canto foi tão doce e afinado
quanto o meu seria
se tivesse vontade de cantar.

Acho que entendo
o porquê de eu
não escapar
nas oportunidades
que surgem,
e nas que surgirão:

Eu gosto do canto do velho.

Quando escuto
sua triste canção,
parece que meu
pequeno coração
se une com o dele.

Talvez ele cante para mim…
Talvez ele cante
porque eu estou lá!
(Ou cantou pela gata
danada com quem foi
se deitar)

A portinhola continua aberta,
mas acho que vou ficar
pra ter a sorte de ouvir
o velho cantar

Mais uma vez.

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