Rostos e Vilarejos

A sutileza dos encontros (com o outro e com nós mesmos)

Bruna Próspero Dani
uma-maleta-de-mão
3 min readSep 28, 2018

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Ontem sai do cinema com uma sensação de leveza e conforto.

O documentário que tinha acabado de assistir e responsável por provocar essas sensações em mim foi o “Visage Villages” que fazia parte da mostra “Nicecore – uma perspectiva positiva em tempos negativos.”

A descrição da mostra já revelava que eu sairia, no mínimo, um pouco mais positiva do que entrei, mas a verdade é que eu fui sem saber do que se tratava, caindo lentamente de paraquedas…

- Vamos a uma mostra que está rolando no CCSP?

- Vamos!

Foi assim que eu cai naquela sala de cinema com as cadeiras mais desconfortáveis que já sentei na vida. Mas quem liga para as cadeiras quando nos segundos iniciais do filme um violão já te avisa que vai valer a pena?

Talvez se eu soubesse o nome da mostra não teria saído de casa. Já faz um tempo que "filmes água com açúcar" não me cativam mais.

Mas não se engane, os filmes que compunham a programação não tinham nada do 'positivismo clichês' e nem eram cheios de frases de ‘auto-ajuda’, do tipo "no final da tudo certo" ou "e viveram felizes para sempre".

Acho que é por isso que filmes sem finais têm me agradado cada vez mais.

"Visage Villages" é sobre a estrada e acasos. Não parece ter um roteiro muito costurado ou um final pré-definido. Ou seja, é a própria vida e nossas próprias viagens, só que retratadas de um modo artístico e tocante.

E deve ser por isso que todo mundo saía da sala com um ar mais leve do que entrou e que eu cheguei em casa procurando frames das cenas, a trilha sonora e frases que me marcaram.

O documentário traz o encontro da cineasta e fotografa Agnès Varda com o fotógrafo e artista urbano Jean Réné, conhecido no meio como JR. Eles viajam por vilarejos franceses atrás de rostos e histórias que são fotografados por eles, impressos e colados em diferentes superfícies como prédios, muros, casas abandonadas ou fábricas (como lambe-lambes).

(Frame retirado do filme disponível na internet)

Ela com 89 e ele com 33 anos.

(Frame retirado do trailer disponível na internet)

Só por esse encontro já valeria a dor nas costas causada pelas cadeiras, mas eles ainda retratam o encontro com o passado e com o presente, de lugares que já passaram, de pessoas que os marcaram e de rostos e histórias novas.

"Os rostos que encontro, ele fotografa para que não se percam logo nos buracos da minha memória". (Frame retirado do trailer disponível na internet)

O filme não estava nos dizendo o tempo todo sobre como a vida é linda, e que tudo daria certo, ou coisas do tipo. Ele estava simplesmente acontecendo.

(Frame retirado do trailer disponível na internet)

Leve. Cheio de diálogos e encontros inesperados. O filme é, acima de tudo, contemplativo.

(Frame retirado do trailer disponível na internet)

O enredo é feito através do outro. Da escuta ativa e das coincidências. Se eles conheceram um pouco mais deles mesmos, quem assiste também conhece além das histórias contadas, um pouco mais de si mesmo.

Sem grandes questionamentos ou conclusões impostas. Retratam como poucos o tempo, a finitude e o contentamento.

Arte é isso. É falar sem precisar dizer. E acho que é por este motivo, que admiro tanto os artistas. Eu mesmo dizendo não consigo falar nada.

(O que me consola é que, pelo menos, consigo entender…Aliás: sentir).

Então, o que posso dizer é apenas: Assistam! (Ou melhor, contemplem!)

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