Todos os motivos para você não se envolver de novo

Bruna Próspero Dani
uma-maleta-de-mão
Published in
3 min readFeb 3, 2019

Lembra da última vez?

Mais uma vez, tudo errado. Afinal, você faz tudo errado — sempre. Já dizia aquela música brega que você prefere pular.

Você já se convenceu de que essa coisa de envolvimento amoroso não é pra você. Quem bom.

De galho em galho, sem olho no olho. Só a diversão.

São tempos líquidos, mas quem se importa? Você carrega uma penca de amigos que estão sempre dispostos a dançar num dia de carência. (Não, não é carência. É só vontade de dançar, ué. Esquecer um pouco dessas coisas, sabe como é).

É melhor assim. Nós sabemos.

"Liberdade é essencial". "Não quero ter que dar satisfações". Você repete essas frases, mesmo sabendo que em nenhum dos seus últimos envolvimentos você se sentiu presa ou precisou dar alguma satisfação.

Elas não fazem o menor sentido.

Mas essas frases aliviam o peso que é não querer sair da sua zona de conforto, que pode até parecer desconfortável, mas nós sabemos que não é. No fundo, é bem mais confortável essa sua posição. E as frases aliviam o peso de você não querer se machucar, nem machucar ninguém.

É compreensivo.

Filhos da Bossa Nova não entendem nada de envolvimentos. Vinícius cantou que "amor só é bom se sofrer". E bem, quem quer sofrer?

Melhor continuar desviando seu olhar, passando números de telefone errado, saindo de fininho ao menor sinal de coração acelerado e ampliando sua lista de amigos.

Baixa Hppen, talvez o Tinder? Ou tem outro aplicativo surgindo por ai?

Do contrário, você sabe que é arriscado demais. E que noites em claro podem chegar.

Mesmo querendo — desesperadamente — um colo, um cafuné, uma mão para entrelaçar no caminho de casa.

Opa! Que mentira! Você sabe que não precisa fazer absolutamente nada disso com envolvimento.

Ou, pelo menos, você sabe que não compensa.

Não precisa de ninguém pra cuidar de você. Nem pra ver um filme ou ter dois filhos. Muito menos pra ir ao parque, ou discutir Caetano, planejar bobagens e morrer de rir.

Você nunca vai precisar, nem nunca vai pedir pra pessoa ficar bem aí.

Só se for cantando Tempo de Pipa do Cícero, assim como quem só está cantando mesmo…

A pessoa que apareça! Que volte. E que fique bem aí. E se não aparecer, tudo bem também.

Tudo ótimo.

Mas deixa eu te contar uma coisa, essa músicas não combinam nada com você. Troca o disco.

Melhor botar um só com melodia. Sem letras. Assim fica menos contraditório e você consegue se bancar melhor.

A vida anda incrivelmente mais tranquila, com bons amigos do lado, um projeto que você acredita rolando, uma passagem comprada e planos de mudança.

É legítimo esse seu querer. É uma medida preventiva.

Você sabe bem que se você não é o que sai machucada é você quem machuca o outro. Ou, pior ainda, sai todo mundo mal dessa história. Ainda que pareçam estar OK.

Melhor manter-se no controle. Porque, você sabe, quando falamos de envolvimento não existe controle. Só existe vulnerabilidade.

Talvez você não saiba, mas deveria saber.

Afinal, você já leu todos os livros budistas da livraria Cultura e foi a uma centena de palestras com sábios monges, mas tudo que você sabe — de verdade — é repetir esses discursos e aconselhar a vida amorosa dos seus amigos. "Relacionamentos são as provas finais do seu processo".

Na prática, você continua fugindo dessa coisa que vai ser sempre incompreendida, misteriosa, imperfeita, vulnerável, confusa e sem resposta.

Você sabe que nunca rompeu de verdade a barreira da vulnerabilidade e que seria apenas dessa forma que talvez você experienciaria um envolvimento real.

Talvez você ache que não compense. Claro, olha a lista de coisas em jogo nisso tudo.

Mas ainda assim, mesmo com todos os motivos para você não se envolver de novo, eu, você e Vinícius sabemos: vale a pena.

— Presságios de dezembro, 2018.

Texto inspirado no filme "Todas as razões para esquecer". [Melhor eu deixar claro e continuar bancando minha pose, vai que pensam que é um auto-diálogo, né? ;)]

Você vai pensar em todas as razões para esquecer, mas no final isso não faz diferença.(…) O que faz a diferença é saber que vai doer… E respeitar. Porque, no final, de alguma forma muito estranha e inexplicável, vai ser bom também.

Imagem retirada do filme: Todas as razões para esquecer.

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