A música em 1966

Kaluan Boarini Bernardo
Perdidos No Ar
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4 min readJul 3, 2016

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50 anos atrás.

A Copa do Mundo de 1966 aconteceu na Inglaterra (que venceu a Alemanha ocidental por 4x2). Lá estavam também União Soviética e Coreia do Norte (sim, a do Norte).

Enquanto o mundo se dividia em blocos comunistas e capitalistas, a ditadura no Brasil se aprofundava. Chico Buarque lançava seu primeiro disco, mas ainda não era tão contundente e relevante como seria mais tarde. Seu único hit de Vol. 1 era “A Banda”. De resto, tínhamos Astrud Gilberto fazendo sucesso lá fora, a Jovem Guarda com seu iê iê iê e Baden Powell e Vinícius de Moraes cantando a Ossanha, Xangô e Iemanjá.

Mas tínhamos O’Seis, o embrião do que viria a ser Os Mutantes:

A música de protesto acontecia lá fora, enquanto o mundo continuava pegando fogo. A Guerra do Vietnã estava a todo vapor e levantava protestos em diversos lugares da Europa e Estados Unidos. Muhammad Ali se negava a ir à guerra.

Os Monks, uma banda norte-americana de garage rock feita por soldados com base na Alemanha, tinha sonoridade que antecipava o punk dos Dead Kennedys. Já na abertura de seu único disco, Black Monk Time, eles gritavam:

You know we don’t like the army
What army?
Who cares what army?
Why do you kill all those kids over there in Vietnam?
Mad Viet Cong
My brother died in Vietnam!
James Bond, who was he?
Stop it, stop it, I don’t like it!
It’s too loud for my ears
Pussy galore’s comin’ down and we like it
We don’t like the atomic bomb
Stop it, stop it, I don’t like it . . . stop it!
What’s your meaning Larry?
Ahh, you think like I think!
You’re a monk, I’m a monk, we’re all monks!
Dave, Larry, Eddie, Roger, everybody, let’s go!
It’s beat time, it’s hop time, it’s monk time now!

Bob Dylan lançava Blonde on Blonde, que a Rolling Stone considera “seu mais misterioso, majestoso e sedutor — para não dizer o maior” álbum. Muito mais polido que os anteriores Highway 61 Revisited e Bringing It All Back Home. Se, de fato é o melhor de Dylan, deixemos para os fãs discutirem. Indiscutível é que o disco duplo fecha a trilogia mais criativa de Dylan.

Os Beatles entravam em Revolver, aprofundando os conceitos e experimentos que testaram com tanto sucesso. Com sua introdução à psicodelia, conquistaram tanto crítica quanto público. Robert Rodriguez, historiador do Fab Four, diz que em Rubber Soul a mente criativa foi Lennon, enquanto em Revolver McCartney se colocou no mesmo nível dele. Nesse caso, sou #teamLennon. Mas é claro que você não diminui um disco com “Eleanor Rigby” e “Tomorrow Never Knows”. Ah, tem o submarino amarelo também.

Em 1966, quem realmente rouba a cena é Brian Wilson e os Beach Boys com Pet Sounds. Você já ouviu esse disco com atenção? Se não, deveria. Feche os olhos e acompanhe cada nota. Sério, vai lá. Faça isso.

Outro dia assisti o ótimo Love & Mercy, cinebiografia de Wilson, e precisava escrever uma crítica. Headphones e ônibus. Decidi que precisa ouvir com mais atenção o disco.

Um ano depois, lembro bem do momento: com headphones em um ônibus que andava pelo centro de São Paulo, eu me surpreendia a cada segundo. Sempre que você acha que a música vai para um lado, ela vai para outro e fica melhor ainda. Há tantas camadas de instrumentos e melodias, que é complicado explicar em um pequeno parágrafo.

Naquele dia passei do ponto propositalmente e não quis fazer nada enquanto Pet Sounds não acabasse. Sentia algo que não sentia há tempos: o que é ouvir uma obra-prima. Essa homenagem da BBC dá uma pequena ideia da importância do álbum:

Em 1966 também temos uma das melhores sonoras já compostas: O Bom, o Mau e o Feio, de Enio Morricone. O jazz evoluía a passos gigantescos com Meditations de Coltrane, Speak No Evil, de Wayne Shorter, e Unit Structures, de Cecil Taylor.

Podemos falar ainda das grandes composições de Simon & Garfunkel, que lançaram Sounds of Silence e Parsley, Sage, Rosemary and Thyme, mostrando como a música pop tinha ótimas canções. Nesse mesmo ano tivemos The Mamas & The Papas lançando músicas como“California Dreamin’” e a versão definitiva de “Do You Wanna Dance”

As guitarras de 1966 eram incríveis. Kinks com Face to Face, os Rolling Stones com Aftermath (o disco que tem “Paint it Black”), Byrds com Fifth Dimension (meu favorito deles), Cream com o Fresh Cream (Clapton já era Deus), e Buffalo Springfield com seu excelente homônimo.

Mas o que voava mesmo nessa loucura de mundo que era 1966 era a psicodelia. E, com tanta pressão, nem poderia ser diferente. É daí que vinham loucos como Frank Zappa lançando Freak Out!, os Animals com Animalism e uma das pedras fundamentais da psicodelia: o The Psychedelic Sounds of the 13th Floor Elevators.

Pire!

Versão curta (uma música de cada disco):

Versão completa (as 100 melhores)

E para quem quiser ouvir no Soundsgood (não precisa ser assinante e não tem propaganda):

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Kaluan Boarini Bernardo
Perdidos No Ar

Jornalista, professor de jornalismo, mestre em comunicação, profissional de marketing.