o Corpo de Cavalo
É o título do longa-metragem filmado como um documentário etnográfico e que ocupa o importante lugar de primeiro filme alagoano a ser realizado com fomento público — E que venham muitos outros! Dirigido por Rafhael Barbosa e Werner Salles e estrelado por Alexandrea Constantino, Evez Roc, Joelma Ferreira, Leide Serafim Olodum, Leonardo Doullennerr, Robert Maxwell e Sara de Oliveira, o longa apresenta a seguinte sinopse:
envolvidos num processo artístico, sete jovens dançarinos são provocados a um mergulho em suas ancestralidades.
Mergulho, é a palavra.
E vamos começar essa conversa chamando o primeiro a ser saudado.
Exu e o corpo
Esú ou Exu é o primeiro orixá a ser saudado nos cultos de matrizes africanas e tem um papel congregador. “Exu é o gosto pelo movimento” como apresenta, na voz de Zé Celso, a canção homônima presente no álbum “Ascensão” de Serena Assumpção em parceria com diversos artistas. Saudar Exu é saudar o corpo em sua potência máxima para que assim seja possível iniciar o ritual. O corpo não é apenas o meio, o corpo é o lugar onde o movimento acontece.
Exu é o corpo.
Laroyê!
Em relação
O filme me despertou para a escrita mas só porque antes despertou para a relação. Após assistir a obra, me aproximei de um livro que a algum tempo estava encostadinho na estante. Sabe aquela lembrança pontual? Pois bem, me ocorreu enquanto as imagens de Cavalo ecoavam e Baco ainda estava cantando um rap sobre a dinâmica de Exu, embalando os créditos.
O livro é “Performance e Ritual — a dança das Iabás no Xirê” da Denise Mancebo Zenicola, mas aqui eu quero falar especialmente da conclusão: “a dança fixa o orixá”. Numa busca bem guiada, foi folheando este livro (presente do querido Rastros de Diógenes ♥) que uni esta conclusão ao corpo de Cavalo. Para isso, preciso melhor apresenta-lo.
O filme é o corpo
Nele se revive imagens remetidas a tempos imemoriais, enquadradas em tempo e espaço a fim de serem transmitidas; os personagens revivem os mitos. Cenas cotidianas que mostram desde um caminhar pela rua a uma filmagem caseira de um treino de breaking, os personagens contam suas histórias. Seja na sala de ensaio, pra uma plateia reduzida ou em transe, os personagens recriam a criação. E nós não somos espectadores, somos no mínimo testemunhas nessa história.
“É a história de um corpo biológico que, ao praticar, formas espetaculares de performances, revela também a história de um corpo cultural e social. A performance assume dimensões que dialogam e explicam esse corpo, na construção de um corpo mágico.”
O trecho em destaque está presente na última página do livro e aborda, em síntese, o papel da performance na cena do ritual. A autora propõe um recorte em sua pesquisa, ao tratar especificamente das danças das Iabás (as deusas do panteão iorubá), mas também busca evidenciar o pulso comum que move os corpos sobre este território acordados para sua ancestralidade de axé. Cavalo nos mostra sete.
Tecnologias mágicas são acessadas ao longo e para congregar este corpo, este filme; a reza, o colo, o banho, a rima, a conversa e em especial a dança, a tecnologia de fazer fixar. A dança assume o corpo e o corpo é o filme. Assim mesmo, espiralar…
“O mundo é fruto da nossa imaginação, nós somos deuses ou sua criação?”
— Esù de Baco Exu do Blues
Pra chegar mais perto, o trailer:
Pra mergulhar, de 20 a 30 de Agosto Cavalo fica no ar pelo Festival Ecrã e dá pra ver o filme completo online no site do festival, basta clicar e procurar em filmes.