1984: Distopia e Ficção científica em George Orwell

Everton dos Santos
PET História UFS
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4 min readMar 18, 2020
(Capa do livro 1984. Foto: Reprodução. Fonte: pinterest.pt)

O livro 1984, escrito pelo autor de pseudônimo George Orwell, teve sua primeira edição publicada em 1949. Esse romance distópico foi traduzido para mais de 65 idiomas, e é considerada uma das principais obras literárias do século XX, sendo adaptada para o cinema em três ocasiões, a última delas lançada em 1984.

Eric Arthur Blair (1903–1950), nome verdadeiro de Orwell, nasceu na Índia em 1903, momento em que o território se encontrava sob o domínio colonial do império britânico. Seu pai trabalhava como funcionário da Coroa e sua mãe, de origem francesa, era filha de comerciante. Em 1911, se muda com sua família para a cidade inglesa de Sussex. Adepto da ideologia socialista, lutou na Guerra Civil Espanhola junto a milícia do Partido Operário de Unificação Marxista, de orientação trotskista. Apesar de defender os ideais marxistas, Orwell era contra o regime stalinista, que se instalou no poder após a Revolução Russa, sendo que tais críticas nortearam algumas de suas principais obras, entre elas o próprio “1984” (1949) e “A Revolução dos Bichos” (1945).

O livro é uma das principais e mais populares obras de ficção científica do século XX. Esse gênero ficcional que surgiu no século XIX, apresenta histórias especulativas que buscam refletir quais os impactos que as inovações tecnológicas e científicas causarão na sociedade. Para tal, os autores utilizam-se principalmente da observação e da relação entre causa e efeito. Logo, as produções culturais da ficção científica são ótimas fontes para estudar as visões de futuro e a mentalidade da sociedade em questão. Pois, apesar de na maior parte das vezes falarem sobre um futuro distante, os autores debatem muito mais sobre o presente no qual a obra foi produzida.

Como forma de entender o enredo do livro, é necessário analisarmos o contexto histórico no qual foi escrito. Em 1949, a União Soviética estava sob o governo de Stalin, que como vimos acima, o socialista Orwell não era simpatizante. O fim da Segunda Guerra Mundial, que teve como último ato o lançamento das duas bombas atômicas no Japão, influenciou não só a obra de Orwell, mas toda a produção de ficção científica dos anos subsequentes, o medo de uma nova guerra e da nocividade de tais bombas, fizeram com que esses perigos estivessem presentes de alguma forma em boa parte das produções do gênero da época. Além disso, o mundo vivia o início da Guerra Fria, disputa hegemônica entre os EUA e URSS, representando respectivamente o capitalismo versus comunismo, buscando ambos ampliarem sua área de influência econômica e política no mundo.

(Divisão do mundo no livro 1984. Foto: Reprodução. Fonte: pinterest.de)

O enredo da obra se passa no ano de 1984, o mundo era dividido por três grandes nações (Oceania, Eurasia e Lestásia) que dividem boa parte dos territórios da terra e vivem em constante conflito. Na Oceania, onde a história se passa, o Estado, representado pelo Partido (Ingsoc) impõe um regime totalitário. As pessoas viviam sob constante repressão e vigiadas em todos os momentos do dia, e qualquer ato conspiratório, inclusive pensamentos contrários aos ideais do Partido, atitude chamada no livro de crimideia, fariam com que o indivíduo estivesse em apuros. Qualquer movimento em falso poderia ser motivo para uma acusação, e os acusados, em geral, simplesmente sumiam, e após passar anos sendo torturados e confessando crimes que nem cometeram, eram mortos e completamente esquecidos. A sociedade era dividida em três classes: o Grande Irmão e o Partido Interno, correspondendo a 2% da população; o Partido Externo, com 13 %; e a prole, a parcela mais pobre, contendo os 85% restantes.

É nesse contexto que o livro vai contar a história do protagonista Winston Smith, membro do Partido Externo, mais especificamente do Departamento de Documentação do Ministério da Verdade, responsável por alterar e excluir de todos os documentos oficiais, todas as menções a respeito de eventos ou pessoas que deveriam desaparecer ou serem modificados nos arquivos. O livro traz boas reflexões sobre produção da História e como o passado pode ser utilizado como forma de legitimação do poder. A trama se desenrola quando Winston passa a cometer atos de rebeldia, ao ter pensamentos subversivos e ter relações íntimas com Júlia, que também faz parte do Partido, algo expressamente proibido.

Há uma presença forte no livro de possíveis inovações tecnológicas, que em sua maioria são utilizadas em prol dos interesses do Partido. Como por exemplo, a teletela, uma espécie de TV, mas com a diferença que “[…] recebia e transmitia simultaneamente. Qualquer barulho que Winston fizesse, mais alto que um cochicho, seria captado pelo aparelho; além do mais, enquanto permanecesse no campo de visão da placa metálica, poderia ser visto também.” (ORWELL, 1984, p.8).

Por fim, o livro 1984 possui uma relevância histórica considerável por se tratar de uma produção cultural que busca refletir questões políticas e sociais relacionadas aos riscos dos governos totalitários e de economias centralizadas, escrito por um contemporâneo de um período em que tais assuntos estavam em voga na sociedade. Sendo assim uma importante fonte histórica para compreender a mentalidade da sociedade pós Segunda Guerra Mundial.

REFERÊNCIAS

ORWELL, George. 1984. 17 ed. São Paulo: Nacional, 1984.

OTERO, Léo Godoy. Introdução a uma história da ficção científica. São Paulo: Lua Nova, 1987.

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Everton dos Santos
PET História UFS

Aracajuano. 23 anos. Graduando em História pela Universidade Federal de Sergipe.