O perigo da desinformação em uma pandemia

Luan Tavares
PETCOM UFAM
Published in
6 min readApr 20, 2020

A nossa realidade:

Ao decorrer da história, os seres humanos foram aterrorizados pelas mais diversas catástrofes físicas, humanas e materiais. Ouvir o termo pandemia já é algo que assusta a qualquer um, afinal não estamos acostumados a lidar com situações como essa regularmente. Uma pandemia ocorre quando uma doença, ou vírus, espalha-se por uma grande número de regiões no globo, ou seja, ela não permanece restrita apenas a uma localidade, estando presente em uma extensa área geográfica. Com o passar dos anos, a humanidade teve que lidar com pandemias extremamente letais e os dados dessas épocas de calamidade são assustadores.

Uma das maiores de todos os tempos, a Gripe Espanhola, foi uma variação do vírus Influenza que infectou mais de 500 milhões de pessoas, cerca de um quarto da população mundial entre 1918 e 1920. Estima-se que o número de mortos esteja entre 17 a 50 milhões de pessoas, porém, por ter acontecido no período da Primeira Guerra Mundial, muitos dados relevantes foram ocultados para não desanimar ainda mais a população com um novo problema. Outro exemplo muito conhecido, foi a Peste Bubônica, ou Peste Negra, que no período de 1343 a 1353, matou mais de 50 milhões por toda a Europa. Ela foi uma doença causada por uma bactéria presente nos ratos pretos e, devido à falta de higiene e de saneamento básico, assolou grande parte dos cidadãos europeus.

Traje utilizado pelos médicos durante a peste bubônica para se proteger da contaminação.

A pandemia mais recente é a do COVID-19, a qual foi declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 11 de março de 2020. Os principais sintomas dela são: tosse, febre, cansaço contínuo, dificuldade para respirar e, em alguns casos, diarreia. O vírus pode levar à morte, sendo extremamente preocupante ao atingir idosos e pessoas que já apresentam outros problemas de saúde, como cardíacos, diabéticos e hipertensos. Até o dia 20 de abril, por meio de um mapa online disponibilizado pela OMS e atualizado a cada 12 horas, foram constatados cerca de 2.407.037 casos, com 168.266 mortos em 196 países diferentes. No Brasil, os dados são de 39.548 casos confirmados e 2.507 mortes.

No momento, o que mais gera inquietação é o fato de que o vírus está apenas em processo de entrada em território brasileiro. Em 26 de março, um mês após o primeiro caso confirmado de coronavírus no país, os número de infectados seguem crescendo em uma verdadeira progressão aritmética. A situação é ainda mais alarmante quando comparamos os dados fornecidos pela Universidade Johns Hopkins, que apontam que o maior país da América do Sul está em um cenário bem mais complicado do que outras nações em seu primeiro mês de contato com o vírus. Confira na tabela:

Como a covid-19 é uma doença viral e nova, não há um remédio específico que possa conter seus sintomas. Mas a OMS afirmou que mais de 200 medicamentos já usados para doenças virais vêm sendo testados para esse quadro. Aqui no Brasil, a busca por uma cura chegou muito antes do primeiro caso oficial. Desde o fim de janeiro, pesquisadores do Cnpem (Centro Nacional de Pesquisas em Energias e Materiais), em Campinas (SP), investigam possíveis soluções para quem adoecer com a mais nova pandemia. O Cnpem, onde a maior parte das pesquisas está sendo realizada, é um centro independente de pesquisas e, por isso, é supervisionado pelo MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações).

Da realidade à ficção:

O filme Contágio (2011), do diretor Steven Soderbergh, retrata de maneira fictícia uma pandemia mundial que se assemelha bastante a situação em que estamos no momento. No longa, o vírus tem o nome de MEV-1, que logo é monitorado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) em conjunto com a OMS. A doença do filme é transmitida principalmente por meio da tosse, na qual as partículas liberadas podem “pousar” em superfícies como papeis, canetas ou botões de elevador. Depois de entrar em contato com um desses elementos, os atores adquirem o vírus ao repetir um movimento que fazemos centenas de vezes ao dia, que é levar as mãos ao rosto. Já ouviu essa história? É exatamente o que estamos vivendo em 2020.

A proposta de Contágio é abertamente ser um retrato mais fiel possível ao que aconteceria na realidade, ainda que tome certas liberdades necessárias, afim de teatralizar e gerar conflitos dramáticos, a ideia era focar no surgimento de uma pandemia e como as autoridades responsáveis por contê-la se comportariam. O mais interessante de Contágio, não é o vírus MEV-1, ou a sua origem, mas a reação da população mundial devido à falta de conhecimento a respeito da doença, acarretando um número alto de mortes em sua propagação.

Dra. Erin Mears (Kate Winslet)

Outro perigo importante que o filme retrata é o da desinformação. O personagem Allan Krumwiede é um blogueiro antiético que divulga para seu vasto público, cerca de 12 milhões de fãs, diversas teorias infundadas sobre o MEV-1, como a ideia de que o vírus foi geneticamente modificado ou que seria uma arma biológica. No mundo real, Eduardo Bolsonaro, deputado federal e filho do presidente da república, compartilha do pensamento de Abrahan Weintraub, ministro da Educação, que condena o governo chinês pela pandemia do corona vírus, dizendo que os mesmos preferiram esconder algo grave a expor toda situação. Tais comentários foram duramente rebatido pela embaixada internacional, tanto do Brasil quanto da China.

Até encontrar a cura no filme, o caos reina e o número de mortes pela doença atinge no mínimo 26 milhões, no entanto, depois de mostrar uma sociedade temporariamente desordenada, com invasões domiciliares e saques em supermercados serem práticas comuns, uma guerra não se inicia. Nos momentos finais de Contágio, descobrimos que, por meio de esforços de cientistas e médicos financiados pelo governo, uma vacina é desenvolvida, testada e produzida em massa, cuja ordem das pessoas que receberiam a cura primeiramente, é definida por loteria.

Enquanto no filme o MEV-1 era frequentemente transmitido de um paciente para outros três, a disseminação de rumores e fake news não-verificados e nocivos atingiam potencialmente milhões. Boatos em situações de crise são tão poderosos que podem induzir ao erro até mesmo aqueles que são mais sensatos. Por isso, mais do que nunca, é importante checar ao máximo as fontes de notícias e informações que compartilhamos, afinal a internet é a maior arma de disseminação de fake news na realidade contemporânea.

Os rumores sobre a eficácia da cocaína contra a Covid-19 começaram a circular junto a uma imagem de uma suposta rede de televisão que afirmava que a droga supostamente matava o vírus. A falsa informação foi tão compartilhada na França que o governo se viu obrigado a alertar os cidadãos. No Twitter, o Ministério da Saúde da França publicou uma mensagem em que explica: “Não, a cocaína não é uma proteção contra a Covid-19”. A publicação ainda explica que essa droga é viciante, “tem graves efeitos e é nociva à saúde das pessoas”.

Tweet repercutido na França e no mundo.

É importante obedecer todas as recomendações de prevenção dadas pelos órgãos de saúde mesmo que a pessoa com maior cargo vigente do país não diga isso. Na noite de 24 de março, o presidente Jair Bolsonaro declarou que a rotina no País deveria retornar à realidade e que a imprensa brasileira espalhou o pânico em torno do corona vírus. Em pronunciamento em rádio e televisão, Bolsonaro também criticou governadores por determinarem quarentena, fechando diversos comércios e fronteiras, e questionou o motivo pelo qual escolas suspenderam aulas. Em pouco mais de 5 minutos de fala, manifestações por meio de “panelaços” foram ouvidas em todo território brasileiro.

O afastamento social, decretado pelas organizações mundiais, é extremamente necessário para não chegarmos a números de países como China, Itália e Espanha e poder não reviver pandemias tão dolosas que já assolaram o planeta, como a Gripe Espanhola e a Peste Negra. Além disso, colocar a higiene pessoal como prioridade e evitar contatos diretos com terceiros, tanto os de fora da sua casa quanto os de dentro, é essencial para podermos dar a volta por cima em mais uma pandemia da melhor maneira possível.

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