“Capitã Marvel” é filme de origem básico e se destaca mais por importante discurso feminista

Erick Rodrigues
Pipoca & Projetor
Published in
4 min readMar 12, 2019

Pode-se dizer que “Pantera Negra” deu um passo a mais nos filmes de super-herói e inaugurou, no Universo Cinematográfico da Marvel, a proposta de incluir ao entretenimento um discurso necessário e oportuno sobre o mundo em que vivemos. Fora desse círculo de personagens, ainda que do mesmo gênero e empresa criadora, os “X-Men” também traziam uma mensagem sobre inclusão e respeito, com a diferença de que, nos cinemas, isso nunca foi explorado como poderia. Depois do herói de Wakanda e tentando seguir a mesma linha, chegou às telonas “Capitã Marvel”, que consegue impor o mesmo tom para falar sobre o feminismo, mas, ao contrário do primeiro, impressiona pouco com a dramaturgia sobre a origem da heroína.

Dirigido pela dupla Anna Boden e Ryan Fleck, “Capitã Marvel” mostra como Carol Danvers (Brie Larson) se transformou em Vers e ganhou poderes para lutar ao lado do povo Kree. Levada da Terra, ela passa a viver em outro planeta e treina para ajudar na guerra contra os Skrull, seres com a capacidade de imitar outras aparências. Esse treinamento é conduzido por Yon-Rogg (Jude Law) e seguido de perto pela Inteligência Suprema, que comanda e orienta os Kree.

Em uma das missões contra os Skrull, em que o principal alvo é o líder Talos (Ben Mendelsohn), Vers é capturada e descobre, através do acesso a memórias do passado, que já teve uma vida na Terra e está ligada a uma pesquisadora conhecida como Dra. Lawson (Annette Bening), que teria encontrado uma grande fonte de energia. Depois de conseguir fugir dos homens de Talos, Vers acaba na Terra, onde passa a perseguir os Skrull, que, por sua vez, estão atrás do conhecimento deixado no planeta pela pesquisadora.

Nessa jornada, Vers acaba conhecendo o agente Nick Fury (Samuel L. Jackson), que trabalha para a S.H.I.E.L.D. e ajuda a protagonista a encontrar respostas sobre o paradeiro de Lawson e, também, sobre o passado da heroína como Carol Danvers.

Como filme de origem, “Capitã Marvel” é bem básico e isso até parece ser algo pretendido. Talvez, para os executivos e roteiristas, caminhar por uma zona confortável em um primeiro longa de determinado personagem pode significar resultados satisfatórios mais garantidos, o que justificaria a ausência de ousadia e, até mesmo, personalidade na apresentação de Carol Danvers. No roteiro, tudo caminha de uma forma que o espectador consegue adivinhar o que aparece em seguida na tela, entendendo claramente como os recursos narrativos e ações dos personagens vão resultar.

O roteiro do longa, criado para satisfazer o espectador no estilo “arroz com feijão”, não surpreende em nenhum momento e pode frustrar quem tinha muita expectativa pela chegada da heroína aos cinemas. A história desenvolve superficialmente a relação entre alguns personagens, como, por exemplo, a conexão entre Carol e Maria Rambeau (Lashana Lynch). O longa frisa uma sólida amizade entre as duas, capaz de superar a distância e o tempo, mas que acaba retratando isso de forma superficial, apenas para incluir a coadjuvante nas ações da protagonista.

A pouca originalidade do roteiro também se reflete na estética de “Capitã Marvel”, pobre em alguns momentos e sem qualquer personalidade. A produção aposta demais em elementos da década de 90, como símbolos e músicas, para criar o clima do filme, mas esses detalhes não têm força suficiente para construir uma identidade própria para a história.

O longa, no entanto, se beneficia do discurso feminista poderoso que carrega, começando na forma como a protagonista é construída. Na busca pela própria identidade, Carol Danvers também embarca em uma jornada para superar todos as atitudes e julgamentos que passou ao longo da vida, com homens dizendo que ela nunca poderia ser uma piloto ou que era emotiva demais para controlar seus poderes. Não pensem, no entanto, que a personagem faz isso para provar ao sexo masculino que é capaz, muito pelo contrário. A protagonista faz isso para provar a si mesma que possui força e capacidade, sem precisar se justificar para homem nenhum.

Na construção de Carol, também é louvável que ela fuja de características sempre atribuídas por homens a esse tipo de personagem, como sensualidade e a busca por um grande amor. A protagonista não precisa parecer sexy para atingir os objetivos dela e nem depende de um par romântico masculino para ter um desfecho positivo. Admito, no entanto, que, sobre esse aspecto, uma análise mais aprofundada e necessária deve ser feita por mulheres, que têm toda a propriedade para definir a questão.

Vi muitas críticas ao desempenho de Brie Larson como Capitã Marvel, dizendo, especialmente, que a atriz não encontrou o tom da personagem. Não acho que o trabalho comprometa o resultado final do filme, inclusive, ele se encaixa bem na proposta limitada do roteiro. Penso que a atuação de Brie Larson está no mesmo nível de outros protagonistas da Marvel em primeiros filmes, como Chris Evans e Robert Downey Jr. No campo externo, a presença da atriz, reconhecida pela defesa das causas feministas, ajuda a dar força a essa mensagem. Ainda sobre os personagens, funciona que o longa use Nick Fury e o gato Goose como alívio cômico, mesmo que nada de excepcional surja disso na história.

Bem básico como filme de origem, “Capitã Marvel” não é a grande história que muitos esperavam, mas se sustenta em uma zona de segurança que garante elementos para a produção de um bom entretenimento. Ao contrário de “Pantera Negra”, no entanto, a inserção de Carol Danvers ao universo Marvel dos cinemas chama mais atenção pelo discurso feminista oportuno do que pela diversão proporcionada pelo gênero.

CAPITÃ MARVEL

COTAÇÃO: ★★★ (bom)

--

--