“La La Land” homenageia antigos musicais com roteiro inspirado e visual arrebatador

Erick Rodrigues
Pipoca & Projetor
Published in
4 min readFeb 17, 2017

Uma das críticas mais comuns aos musicais está relacionada ao fato de, no meio de uma ação, os personagens começarem a cantar e dançar sem motivo algum e serem acompanhados de cenários e bailarinos que surgem do nada. De fato, o gênero possui essa característica, que o distancia da realidade e acaba gerando comentários de que essas obras são “bobas e artificiais”. Mas, do meu ponto de vista, esse incômodo só cabe quando não há uma história bem contada e sólida, que utilize os números musicais a favor da narrativa e não como artifício para “incrementar” o roteiro. Enfraquecido nos últimos anos, o gênero retorna, agora, ao centro das atenções com um filme que, com certeza, não será apenas mais um “com gente cantando e dançando do nada”. “La La Land”, vencedor de sete Globos de Ouro e, até aqui, favorito ao Oscar, é capaz de cativar até os mais críticos em relação ao gênero.

Escrito e dirigido por Damien Chazelle, “La La Land” é uma homenagem a Hollywood e, especialmente, aos antigos musicais produzidos pela indústria cinematográfica. Para isso, o filme escolhe retratar a vida daqueles que sonham com a vida de estrelado que Los Angeles pode proporcionar. A narrativa é centrada em Mia (Emma Stone) e Sebastian (Ryan Gosling), cada um com sua trajetória em busca da tão sonhada carreira artística.

Ela é a atendente de um café, localizado dentro de um estúdio de cinema, que divide a atividade com as várias audições em busca de realizar o sonho de ser uma atriz conhecida. Ele, por sua vez, insiste em uma carreira como músico de jazz, mesmo constatando que este é um gênero “morto” e que não encontra mais admiradores. Além disso, Sebastian sonha em ter um clube de jazz e, assim, contribuir para que o ritmo continue vivo. Os caminhos dos dois se cruzam e, até certo ponto, se estimulam, mesmo sofrendo com os efeitos da rigidez da realidade.

Esse é um aspecto fundamental da história de “La La Land”: distante da idealização das carreiras artísticas, o filme exalta a dificuldade do caminhar em busca de um sonho. Confrontados pelo lado prático da vida, Mia e Sebastian têm suas pretensões colocadas à prova o tempo todo. Ele se vê inclinado a seguir fazendo parte de um grupo musical, tocando músicas mais modernas e populares, para conseguir estabilidade, enquanto ela vive as inseguranças de largar tudo para apostar na produção de uma peça, que pode ajudá-la a atingir seus objetivos.

Utilizando a atmosfera de Los Angeles e da busca pelo sonho artístico, “La La Land” constrói, ainda, uma história de amor autêntica e madura, que passa sim por todos os clichês do sentimento, mas, ao mesmo tempo, apresenta um viés pouco óbvio: aquele do amor arrebatador, mas que, por algum motivo, não se encaixa ou não cabe no mesmo espaço. Nesse caso, esse amor intenso e incontestável, em determinado momento, pode não estar alinhado com os demais objetivos de vida.

Romântico e muito bem escrito, o roteiro do filme utiliza os números musicais com muita inteligência, pontuando e amarrando a história nos momentos certos. “La La Land” é o melhor exemplo de musical que não usa as canções de forma artificial ou como mero recurso para tentar conquistar o espectador. Aqui, letras e melodias são aplicadas como recurso narrativo, que faz a história caminhar em um ritmo próprio.

Um dos recursos utilizados por Chazelle, que torna tudo ainda mais especial, é a estética, que abusa de cores fortes e traz efeitos especiais bem colocados para criar ambientes inspirados na ideia dos antigos musicais. Essa característica do diretor serve à história quase que como um personagem, de tão marcante e fundamental para a narrativa construída. Assim como fez no filme anterior, o sensacional “Whiplash”, o diretor volta a filmar detalhes e enquadramentos mais fechados como ninguém, mas surpreende com sequências mais abertas e longas igualmente inspiradas.

Ainda é preciso destacar o trabalho dos atores, especialmente daqueles que levam o filme. Emma Stone, acredito eu, tem aqui o seu melhor desempenho nas telas e “engole” muitas cenas com um olhar e um carisma sem iguais. Gosling empresta certo sarcasmo ao personagem e contribui com o humor do filme de uma forma especial, além de se dar bem nos momentos dramáticos.

Depois de tudo isso, a pergunta que fica é: “La La Land” será o vencedor do Oscar neste ano? A única resposta para isso, agora, é: pouco importa! O filme, independente disso, é excepcional, um dos produtos mais ricos do gênero musical, sem sombra de dúvida, de todos os tempos. Inspirador, bem escrito e esteticamente arrebatador, é capaz de fazer aqueles que acham os musicais artificiais, no mínimo, reavaliarem essa teoria. Cinema e boa música obrigatórios!

LA LA LAND

COTAÇÃO: excelente

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