Marlon Anjos
Pirata Cultural
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3 min readJan 21, 2020

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O Caráter do Silêncio: Vivian Maier

Poucos detalhes sobre a vida de Vivian Maier (1926–2009) são conhecidos. Acredita-se que começou a fotografar nos dias de folga de seu trabalho como babá, atividade que exerceu durante décadas. Era de onde provinha o recurso que garantia a sua sobrevivência e seu ofício: a fotografia. Sabe-se, também, que a maioria de sua obra, mais de 150 mil fotografias, nunca foram reveladas, permaneceram anônimas e inéditas até 2007, quando não conseguindo mais custear o aluguel, se desfez de parte de seu material.

Vivian Maier. Autorretrato, 1954

O historiador John Mallof que pesquisava o bairro portage park, em Chicago, arrematou por 380 dólares 30.000 negativos fotográficos e 1.600 rolos de filmes não revelados, descobriu o nome de Maier inscrito nas caixas que guardavam o desconhecido material. Ele precisou de algum tempo para reconhecer a riqueza que havia encontrado, mas pouco a pouco foi acumulando objetos, jornais, bem como recibos de compras e pequenas anotações que um dia foram guardados pela misteriosa fotografa.

Vivian Maier foi metódica, possuía um lugar secreto para todas as suas coisas, como se quisesse guardar tudo que acumulou em vida. Sua ação, não pode ser simplesmente tipificada como transtorno de acumulação, ela como anônima e desconhecida para o mundo, em um quarto para empregadas criava um universo particular.

Mallof, sem auxílio de museus e galerias, em 2009, após a notícia da morte de Maier, começou a publicar as imagens dela em um blog. A partir daí, a sua obra foi agraciada com milhares de pessoas manifestando interesse.

Maier não gozou de reconhecimento em vida, a venda de parte de sua coleção foi usada para a prevenir da miséria que a identificava em sua velhice. Em janeira de 2009, a senhora anônima foi transferida, contra a sua vontade, para um asilo de idosos no subúrbio, onde morreu 4 meses depois.

Idem. Sem título, sem data.

Algo sem resposta ou explicação paira nas silenciosas fotografias que revelam, também, pessoas desconhecidas: Qual sentido para ela residia no ato de fotografar e filmar pessoas anônimas e não revelar o material? Ela fotografou cotidianamente, as pessoas que ela registrou nunca tiveram interesse em ver as fotos ou em saber por qual motivo ela fazia isso? Seja como for, o que sabemos e temos como resposta é que tal falta de interesse encobriu um tesouro e, também, há caráter de pessoas que não permite o exibicionismo.

No fundo, mesmo que solitária, sem companheiros, filhos ou amantes, ela fez o que quis, não fez concessões. Podemos sentir tristeza no contato com sua obra e a sua biografia. No entanto, de alguma forma, ela representa a vitória de todas as pessoas que escrevem ou desenham nas últimas páginas do caderno e não mostra a ninguém.

Idem, Autorretrato, sem data.

A sua fotografia é sem precedentes, mulheres, crianças e a vida suburbana habitam um mundo particular, um mundo ainda despercebido. Há humor, tragédia, há sentido da vida, do entorno, de tudo… Há o rastro da obsessão em realizar imagens. E como cristalizador, Maier refletida nos vidros foscos da cidade ou em sombras nas calçadas e paredes, revela a sua condição e a de tantos outros: estar lá e, simultaneamente, não.

Idem. Autorretrato, 1955

Por fim, se cabe aqui indicar material onde pode ser encontrada mais informações sobre Vivian Maier, sugiro suas fotos publicadas no site: http://www.vivianmaier.com/ e assistir ao documentário: The Finding Vivian Maier, 2013.

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Marlon Anjos
Pirata Cultural

Ainda que um pouco herético, foi premiado como o melhor escritor do bairro. Não guarda ressentimento de plagiadores, até porque Homero não se submetia à abnt.